Carta Maior
O Partido Popular (PP) impôs neste domingo ao Parido Socialista Operário Espanhol (PSOE) a pior derrota de sua história. Com um resultado ainda mais pobre que o obtido nas eleições à Assembleia Constituinte de 1977 e com apenas 28,79% dos votos, os socialistas pagam um alto preço por terem cedido às pressões dos mercados financeiros durante a atual crise econômica. Com 44,3% dos votos, um resultado similar ao obtido por Rodriguez Zapatero em 2008, o PP fica com uma clara maioria absoluta graças às vantagens de uma lei eleitoral que fraciona em províncias pequenas o território, favorecendo deste modo os partidos majoritários.
As eleições deste domingo deixaram mensagens muito claras para os partidos majoritários, despertaram expectativas na esquerda que se beneficiou da retumbante debacle socialista e confirmaram a saúde dos nacionalismos regionais, que obtiveram importantes vitórias na Catalunha e no País Basco. O PP obteve a maior vitória de sua história – Mariano Rajoy conseguiu melhorar a maioria absoluta obtida por José María Aznar em 2000 – no pior momento do país. Seja qual for o desenlace da crise econômica nos próximos anos, fica claro pela composição que emerge do novo parlamento que será sob responsabilidade única dos “populares”.
Grande parte dos que votaram na direita estão convencidos de que o PP voltará a repetir o “milagre de ‘1996”, quando assumiu o poder após 14 anos de governos socialistas, com um grande número de desempregados e alguns problemas econômicos crônicos que voltaram a aparecer. Mas é difícil que esse milagre volte a acontecer. A direita espanhola terá agora a dura responsabilidade de gerir a crise. E fará isso, previsivelmente, aplicando ajustes radicais no gasto público, com cortes estimados em mais de 18 bilhões de euros para o exercício de 2012.
Mariano Rajoy e seu futuro ministro da Economia já não tem em mãos o instrumento da desvalorização para dar um choque competitivo em uma economia à beira da recessão. E para sair do atoleiro só podem inventar outra bolha, como foi a imobiliária – gestada durante o governo de Aznar graças a uma Lei do Solo que permitiu a explosão da especulação imobiliária – ou realizar uma desvalorização indireta, reduzindo salários e cortando benefícios sociais, um caminho que levará diretamente ao enfrentamento social.
Mariano Rajoy parece ter muito claro esse cenário. Mas até agora não disse em que direção vai mover suas fichas. No PP há um certo temor de um “inverno quente”, com os sindicatos nas ruas e os “indignados” nas praças, dando as boas vindas a um governo que não tardará a lamentar a debilidade de seu principal opositor. Com o PSOE mergulhado em uma verdadeira travessia no deserto – há quem tema que estourem disputas internas incontroláveis que aumentem o dano na já avariada nave socialista -, os populares não terão interlocutores para administrar a crise.
Conhecido por ser um homem de decisões lentas, Rajoy deverá enfrentar uma realidade que muito provavelmente superará amplamente sua capacidade de reflexos e que poderá engolir o respaldo popular em poucos meses se o esperado “milagre” não se concretizar. O mito, fortemente arraigado, de que “a direita sabe como fazer negócios, hoje não tem sustentação”. Previdente, Rajoy já avisou que a situação é muito difícil e que não haverá nada para festejar até...2013. Uma data demasiadamente distante para os milhões de desempregados, para os quais estão acabando os benefícios e que veem mais sombrio seu futuro econômico.
Enquanto isso, Bruxelas, as agências de classificação de risco e o punhado de tecnocratas que governam a Europa já definiram as cifras dos próximos cortes e, previsivelmente, os mercados festejarão nesta segunda com alta nas bolsas os resultados eleitorais na Espanha. “Ganhe quem ganhe, Merkel é que governará”, asseguravam grande parte dos correspondentes estrangeiros, há uma semana, ao jornal El País. Mas as rédeas internas ficarão com Rajoy, que a partir de agora controla o PP com o maior poder territorial de toda sua história, com amplas maiorias em todas as regiões e com uma forte coesão interna, uma fortaleza que tornar-se frágil se a crise fizer irromper velhas rebeliões internas sufocadas com êxito pelo próprio Rajoy nos últimos anos.
Todos esses ingredientes podem resultar numa armadilha se a direita cair na tentação de impor medidas impopulares capazes de dissolver seus apoios ou convocar à mobilização de grande parte dessa esquerda social que decidiu ficar em casa neste domingo ou votar em partidos mais radicais que o PSOE e que tem sua expressão mais poderosa no chamado 15-M. É uma tentação que o PP já enfrentou antes, com sua primeira maioria absoluta durante o segundo governo de José María Aznar, e que culminou no desastre de 2004, que fez o PP pagar pelo pecado de lesa soberba e ficar sete anos fora do governo central. Só que agora não há o PSOE para recolher os restos de uma queda, e seus passos em falso podem levar o país a uma situação complexa, similar à que Grécia e Itália enfrentam hoje. Tudo isso, a partir de hoje, está nas mãos de Rajoy.
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