terça-feira, 15 de junho de 2010

El Pentágono de los demócratas: la guerra sigue, pero no se ve



Manlio Dinucci
Il Manifesto

La sonrisa de Barack Obama es más agradable que la de George W. Bush, pero su belicismo es todavía más agresivo. En la era de las restricciones presupuestarias y de las relaciones públicas, la Casa Blanca ha renunciado a los bombardeos transmitidos por televisión en vivo y en directo y prefiere las intervenciones secretas en los cuatro puntos cardinales. A través de las operaciones encubiertas de sus fuerzas especiales, Estados Unidos está hoy en guerra en 75 países diferentes.

La guerra es más de lo que nosotros podemos ver a diario. Además de las operaciones militares que se están desarrollando en Irak y Afganistán, el Pentágono está librando una guerra secreta en la que Irán es uno de los principales blancos. Esa guerra se está librando bajo la coordinación del Comando de Operaciones Especiales (UsSoCom), que dispone de unos 57 mil especialistas de las cuatro ramas de las fuerzas armadas estadounidenses (Tierra, Mar, Aire y Marines).

Sus misiones son, oficialmente, obtención de información sobre el enemigo; realización de acciones directas de destrucción de objetivos; eliminación y captura de enemigos; guerra convencional realizada por fuerzas externas entrenadas y organizadas por el UsSoCom; contrainsurgencia tendiente a ayudar a los gobiernos aliados a reprimir toda rebelión; operaciones de guerra sicológica tendientes a influenciar a la opinión pública extranjera para que apoye las acciones militares estadounidenses.

Un trabajo investigativo del Washington Post señala que actualmente las fuerzas estadounidenses encargadas de las operaciones especiales ya no están desplegadas en 60 países, como el año pasado, sino en 75. La creciente importancia de dichas fuerzas queda demostrada además por el hecho que «los comandantes de las fuerzas especiales están hoy más presentes en la Casa Blanca que en la época de Bush».

El área donde se concentran esas operaciones, cuyo financiamiento se eleva oficialmente a 10 mil millones de dólares, abarca Oriente Medio, Asia Central y África oriental. Pero también existen «planes de ataques preventivos o de represalias en numerosos lugares del mundo, para su aplicación cuando se descubre un complot o después de un ataque». La utilización de las fuerzas encargadas de las operaciones especiales ofrece la «ventaja» de que no se necesita la aprobación del Congreso y se mantiene en secreto. Dichas operaciones, según funcionarios de la administración Obama citados por la agencia UPI, «pudieran abrir el camino a ataques militares contra Irán si se agudiza el enfrentamiento sobre el programa nuclear de Teherán».

En el marco de la «guerra no convencional», el UsSoCom recurre a empresas militares privadas, como Xe Services (la antes llamada Blackwater, ya conocida por sus acciones en Irak), que está siendo utilizada en diversas operaciones especiales, incluyendo la búsqueda de información de inteligencia en Irán. En ese caso, el UsSoCom apoya directa o indirectamente a los grupos rebeldes, particularmente a los del sudeste del país, mayoritariamente sunnitas.

Y lo hace sin andarse con muchos remilgos dado que uno de esos grupos, los llamados «Guerreros Sagrados del Pueblo», aparece en la lista de organizaciones terroristas, redactada precisamente por Washington. Estados Unidos está aplicando esa misma política en Afganistán, donde las fuerzas encargadas de la realización de las operaciones especiales utilizan a los señores de la guerra locales.

Entre estos se encuentra Matiullah Khan quien, según reporta el New York Times, combate a los insurgentes con su ejército privado junto a las fuerzas especiales estadounidenses. Estas últimas tienen su cuartel general a un centenar de metros del de Matiullah Khan. Este garantiza el paso de los convoyes de la OTAN, que a su vez le paga 1 200 dólares por camión. Matiullah Khan se ha convertido así en el más rico y poderoso señor de la guerra de su provincia. Todo gracias a lo que el Pentágono llama una «guerra no convencional».

A degeneração do Congresso Nacional Africano


Richard Pithouse
Esquerda.Net

A degeneração do Congresso Nacional Africano/CNA (1) chegou a um ponto tal que, hoje, ele representa um perigo para a integridade da sociedade. Julius Malema (2) é um dos exemplos mais ilustrativos da maneira como um movimento empenhado na libertação nacional se tornou, nas palavras de Franz Fanon, «um instrumento de progresso pessoal». Mas Malema não é o único. O Communication Workers Union (sindicato das comunicações) tem toda a razão quando diagnostica um “Keebleismo profundamente enraizado” dentro do CNA (em referência a Brett Keeble, um homem de negócios sul-africano de reputação demoníaca).

Há pouco tempo soube-se que Nonkululeko Mhlongo, mãe de dois filhos de Jacob Zuma (3), dispõe de contratos de vários milhões de rands (a moeda nacional sul-africana), para o abastecimento do KwaZulu Natal. A mulher e a filha de Zweli Mkhise ganharam uma licitação de 3 milhões de rands do Departamento dos Serviços Correccionais. Este tipo de coisas acontece há anos e não se pode atribuir a alguns indivíduos problemáticos. Ao contrário, em casos como o do negócio de armas e o jogo duplo de Valli Moussa entre o Eskom (a companhia eléctrica nacional da África do Sul) e o Comitê de Angariação de Fundos do CNA, era a organização no seu todo que estava profundamente comprometida. Esta também se compreteu coletivamente por se recusar sempre a tomar uma posição clara contra os indivíduos envolvidos em práticas duvidosas.

Pode ser verdade que o peixe começa a apodrecer pela cabeça, mas é essencial compreender que a degeneração do CNA não resulta apenas do aumento do poder de uma elite predadora dentro do partido. Houve um tempo em que se acreditou que o poder era um projeto político coletivo que iria transformar a sociedade de baixo para cima. Agora percebe-se, em todos os níveis do partido, que ele é um meio para a incorporação pessoal numa determinada minoria que se aproveita das crescentes desigualdades da sociedade. De certo modo, este processo, mesmo que conduzindo a uma desracialização da hegemonia, não deixa muito espaço para a esperança numa sociedade melhor, se a isso limitarmos as nossas aspirações.

O CNA abandonou a linguagem da justiça social em favor da ilusão de uma linguagem pós-política de “distribuição”. Essa linguagem considera que o Estado só está obrigado a satisfazer as necessidades mais básicas da sobrevivência e que se trata de uma simples questão de eficiência técnica. O problema com a linguagem da distribuição é que a distribuição é as mais das vezes, em si mesma, uma estratégia de contenção das aspirações populares, mais do que uma estratégia para se atingir a prosperidade humana universal. Atirar com as pessoas para ”oportunidades de habitação” em guetos periféricos onde pouco mais há a esperar do que alguma assistência para as crianças ou a possibilidade de um emprego precário, contribuindo para evitar que as pessoas se manifestem na rua, promove o desenvolvimento no sentido mais preverso do termo.

O segundo problema é que a ilusão de que o desenvolvimento, sendo uma questão pós-política de o governo trabalhar mais depressa, mais afincadamente e mais inteligentemente, não leva em linha de conta as realidades políticas profundas que informam qualquer projeto de desenvolvimento. Há que tomar decisões políticas sobre questões como a de saber se, sim ou não, o valor social dos terrenos e dos serviços deve prevalecer sobre o seu valor comercial. Quando essas questões não são politicamente consideradas, o “fornecimento de serviços” só pode ser canalizado para as margens da sociedade, com o resultado de se tornar um processo de efetiva marginalização.

Mas a natureza política inevitável do desenvolvimento não diz respeito apenas à competição entre os interesses dos pobres de um lado e, do outro, o poder dos ricos e das empresas. Há também um jogo político entre as pessoas que estão no terreno e as elites locais do partido. É frequente ver os funcionários locais tentando, de boa fé, seguir as diretivas dos dirigentes políticos, mas verem os seus esforços para implementar um desenvolvimento tecnocrático desviados pelas elites locais do partido para seu próprio proveito. Nem sempre se trata de simples pilhagem. Muitas vezes, a atribuição de uma casa e de serviços, como todos os contratos envolvidos nesse processo, é submetida aos sistemas de clientelismo e de apadrinhamento com os quais, frequentemente, o CNA consolida o apoio político ao partido ao nível local. Em muitos casos, os projetos de desenvolvimento, justificados em nome da satisfação das necessidades do povo, tornam-se projetos basicamente orientados para a consolidação de alianças nas micro-estruturas locais do partido. Os diferentes comitês, incluindo o comitê executivo do ramo local, estão povoados por uma multidão de mini-Malemas.

Segundo a análise de Franz Fanon, é inevitável haver um autoritarismo subjacente que acompanha a degeneração de um partido num “instrumento de progresso pessoal”. Escreve ele que o partido «ajuda o governo a subjugar o povo. Torna-se cada vez mais claramente antidemocrático, uma ferramenta de coerção». Um partido que diz, e que tem de continuar a dizer, que aquilo que faz é para o povo mas que, de fato, se tornou um instrumento de progresso pessoal graças às cumplicidades de dominação, terá inevitavelmente de sossobrar na paranóia e no autoritarismo, ao tentar resolver a quadratura do círculo, pretendendo, para si próprio e para toda a gente, que o enriquecimento privado é de certo modo o verdadeiro fruto da libertação nacional.

Na África do Sul contemporânea, não é nada inabitual encontrar pessoas que vivem no temor dos conselheiros locais e dos seus comitês executivos. De fato, não é exagero afirmar que nós desenvolvemos um sistema político a dois terços, com direitos políticos liberais para as classes médias e restrições cada vez mais severas aos direitos políticos básicos dos pobres.

Os movimentos políticos dos pobres têm sido, desde há muito tempo, objecto de uma repressão ilegal e violenta por parte das elites políticas locais. Mas, ao normalizarem-se, tornaram-se cada vez mais descaradas. O apoio entusiástico de figuras-chave do CNA local e provincial aos ataques contra o Abahlali Mjondolo em Durban, em Setembro do ano passado, constitui um dos pontos mais baixos a que desceu o CNA na África do Sul pós-apartheid. Mas o que aconteceu a Chumani Maxwele (4), o jogger da Cidade do Cabo sobre quem se abateu a paranóia por vezes lunática do CNA, conseguiu, mais do que qualquer outro acontecimento, expor publicamente o autoritarismo paranóico que se entranhou profundamente no CNA.

Claro que há pessoas e tendências no partido que se opõem ao modo como se tornou uma excrescência predadora da sociedade. Mas o CNA deixou de ter uma efetiva visão política e desconfia, profunda e por vezes violentamente, de qualquer ação política que surja de baixo – seja ela originada dentro ou fora do partido. Pode fazer declarações contra a corrupção, mas a verdade é que a máquina política que lhe permite ganhar eleições assenta por sistema no nepotismo, no clientelismo e na corrupção. Por isso não pode opor-se a isso sem fudamentalmente de opor àquilo em que se tornou. E não parece, de todo, que haja qualquer perspectiva real de que a organização possa desenvolver uma verdadeira visão política que lhe permita mobilizar-se contra si própria – contra aquilo que o Sindicato Nacional dos Metalúrgicos designou como “o gangue dos saqueadores” que comprometeu o CNA a todos os níveis. Se há alguma possibilidade de propor uma visão política alternativa, é bem possível que tal venha a incumbir aos sindicatos, aos movimentos do povo pobre e às igrejas que já se tornaram a consciência da nossa sociedade.

NOTAS
(1) O African National Congress foi fundado em 1912 com o nome South African Native National Congress (SANNC) para lutar pelos direitos das populações nativas. Foi ele que conduziu todo o movimento de libertação que viria a conseguir, em Abril de 1994, o estabelecimento de uma democracia parlamentar não-racial, de que o primeiro presidente foi a sua figura mais emblemática, Nelson Mandela. Desde então governa o país, numa aliança tripartida com o COSATU (Congresso dos Sindicatos Sul-Africanos) e o SACP (Partido Comunista da África do Sul).
(2) Julius Malema, de 29 anos, atual presidente da organização de juventude do ANC, é conhecido pelo seu estilo de vida opulento, que contrasta com as suas retumbantes e polêmicas declarações acerca das diferenças entre ricos e pobres.
(3) Jacob Zuma é presidente do ANC desde 2007 e presidente da África do Sul desde 2009. Figura muito controversa, tem estado envolvido em diversos escândalos e processos judiciais de fraudes e corrupção. Zuma é polígamo, o que é permitido na África do Sul.
(4) Em Fevereiro último, Chumani Maxwele, um estudante de 25 anos, estava fazendo jogging quando na estrada passou a caravana do presidente Zuma. O jovem teria protestado contra o barulho e feito algum gesto obsceno na direção das viaturas. De imediato foi preso e levado num BMW dos seguranças. Ficou detido 24 horas, sofreu interrogatórios e maus tratos, a sua casa foi toda revistada por polícias à paisana, e só foi libertado, sem julgamento, depois de assinar um pedido de desculpas ao presidente.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Zapatero: a la mesa con los caníbales


Rafael Chirbes
Sin Permiso

El miércoles 12 de mayo, José Luis Rodríguez Zapatero anunciaba en el Parlamento español una serie de medidas anticrisis que incluían: congelación de las pensiones de los jubilados, bajada de salarios a los funcionarios, restricciones en los pagos de las ayudas a ancianos y enfermos, y en el uso de los medicamentos; y el fin de su oferta estrella de las elecciones: el cheque-bebé (una medida por la cual quien engendrara un hijo o lo adoptara, fuese cual fuese su salario o posición económica, recibiría automáticamente un aguinaldo de dos mil quinientos euros). Como colofón, auguró también el presidente un notable recorte de las inversiones en obra pública, y –esto ya fuera de discurso- filtró a la prensa la caducidad de los cuatrocientos euros mensuales que el Estado concede a los parados de largo alcance. En cinco minutos, dinamitaba su retórica de presidente de los derechos sociales. Apartaba de un manotazo a los caníbales del liberalismo, y se sentaba él a la mesa para comerse a los débiles con un apetito más que notable.

Una semana antes, había declarado que jamás tomaría ninguna medida que implicara recortes sociales. "Por razones ideológicas", dijo. Pero, la ideología es una materia moldeable, y, entre tanto, había viajado a Bruselas y se había encontrado con las larguísimas caras de los jefes de Estado y de Gobierno del Eurogrupo que le habían dicho que se buscara otra nueva retórica (el lenguaje que entiende el mercado) y que, a partir de ese instante, la economía de su país ya no iba a dirigirla él, porque había mostrado una incapacidad manifiesta. El propio Obama le telefoneó unas horas antes de su intervención parlamentaria, al parecer preocupado por la situación española. Desde ambas orillas del océano, se nos enviaba a los españoles el mensaje de que no somos un país soberano, sino intervenido; que somos algo parecido a lo que fue Marruecos para España a principios del pasado siglo: un protectorado (nos lo temíamos desde el mismo día que entramos en el euro; o aún antes, cuando empezó a llegarnos una lluvia de millones para que desmantelásemos nuestra modesta economía productiva). El presidente que, hace tres años, se preció de haber adelantado en PIB a Italia y amenazaba a Sarkozy con que pronto dejaría a sus espaldas a Francia, se tragaba amargamente sus palabras. No le quedaba más remedio que acudir al parlamento español a dar cuenta de la nueva situación en esa lengua comprensible para los mercados: como han dicho algunos periódicos, se hacía su propia enmienda a la totalidad, o lo que, en la mecánica parlamentaria española, se llama su propia moción de censura. Mientras hablaba, tenía la triste cara de los suicidas.

En pocos minutos se venía abajo todo el armazón ideológico sobre el que se ha sostenido durante seis años esta variante contemporánea de la socialdemocracia, que se ha creído a salvo de los avatares económicos, gracias a una estrategia por la cual los problemas de la vida cotidiana se retiran de la escena pública y son sustituidos –en una cuidada estrategia- por la juguetería de lo que algunos han definido como Cultural War: es decir, por la puesta en primer plano de conflictos más o menos intrascendentes, amortizados, silenciados u olvidados, y cuya dramática escenificación le ha servido para mantener la ficción de una política progresista; de que hay una diferencia esencial entre democristianos y socialdemócratas, obviando que el meollo del progresismo tiene que ver, sobre todo, con la forma en que uno se gana el pan de cada día (y si puede ganárselo o no), y con la estrategia con que se reparte la gran tarta nacional entre los ciudadanos. El prestidigitador Zapatero ha conseguido ocultar durante años esa primacía de lo económico, gracias a que, en España, la lista de conflictos que pueden extraerse de la guardarropía y sacarse a escena es numerosa: clericales contra laicos; abortistas contra antiabortistas; españolistas contra nacionalistas; defensores de la negociación con ETA y partidarios de la mano dura; ecologistas contra negacionistas; partidarios de los trasvases de agua contra partidarios del caudal natural de los ríos; machistas contra feministas y homófobos; e incluso, y sobre todo -sí, setenta años después-, herederos de las víctimas de la guerra civil contra herederos del franquismo. Si a ello añadimos el manejo político de los tiempos judiciales en los escándalos de corrupción que afectan al partido de la oposición, el despacho en el Palacio de la Moncloa parecía asegurado durante unos cuantos años. Como le dijo Zapatero en vísperas electorales a un locutor amigo, y recogió un micrófono indiscreto: "A nosotros nos conviene tensionar". Según los cálculos del líder socialdemócrata, en medio de este agitado guirigay nacional, podía seguir caminando sobre las turbias aguas de la economía sin mojarse ni las zapatillas: sólo faltaba que Europa se recuperase en un par de años, es decir, en vísperas de las próximas elecciones españolas: el tapón español flotaría de nuevo sobre el mar de riqueza continental y él podría seguir presentándose como adalid del progresismo.

De hecho, desde que se inició la crisis, el enredo ideológico ha permitido que los sindicalistas hayan seguido haciéndose enternecedoras fotos con el presidente del gobierno mientras las cifras oficiales hablan de cuatro millones seiscientos mil parados, y las reales superan con creces los cinco millones. Los líderes sindicales han apoyado sin fisuras a un gobierno cuyas únicas medidas anticrisis se han sustanciado en la concesión de ayudas a las empresas automovilísticas y en una entrega de decenas de miles de millones a la banca, ejecutada sin ningún control, con la excusa ideológica de que esos millones iban a servir para que las entidades dieran créditos a las familias y a los pequeños empresarios en apuros. Pero la banca, entre tanto, se ha dedicado a comprar firmas extranjeras, a conceder jubilaciones fastuosas a sus directivos y a mostrar unas brillantes cuentas de resultados fin de ejercicio. Los sindicatos (engrasados con donaciones multimillonarias) no han movido un dedo por los que veían desaparecer sus puestos de trabajo, los que perdían sus pisos y los que tenían que cerrar sus empresas. Durante los últimos meses, la única batalla sindical visible –siguiendo la estrategia del gobierno- ha sido la defensa de un juez que lleva veinticinco años intrigando en política. Zapatero y su ministra de economía han podido presumir ante la oposición de paz social en esa línea postmarxista de que la socialdemocracia es la mejor gestora del capitalismo, y que, por lo demás, cuenta con tan buena tradición en España: en los ochenta fue el gobierno del socialdemócrata Felipe González el encargado de llevar adelante la durísima reconversión industrial que solicitaba el implacable capitalismo europeo; de multiplicar los despidos empresariales hasta elevar el paro a tasas antes nunca imaginadas, de domesticar a varazos a los sindicatos, y de meter al país en la OTAN.

Zapatero ha estado trabajando en sordina a favor de la gran banca y de los especuladores a los que de cara a la galería ataca con demagogia populista: Las vicepresidentas del gobierno (hay dos) llegaron a amenazar con llevar a la cárcel a quien difundiera bulos acerca de la crisis para beneficiarse. Al parecer, acababan de descubrir que la esencia del capitalismo es la especulación: comprar barato y vender caro. Palabrería. En sus actuaciones, ni una sola referencia a tocar el estatus de unos bancos que, según leo en la prensa, son las entidades europeas que más cobran a sus clientes por servicios y las que menos pagan por rendimientos; bajo su mandato, se ha suprimido el impuesto de patrimonio y no se han gravado los bienes suntuarios, tampoco se ha mirado hacia las sociedades de inversión, esos refugios de grandes fortunas que se conocen con el nombre de SICAV, Sociedades de Inversión de Capital Variable, escondites financieros, para entrar en los cuales hay que contar con un mínimo de 2.300.000 euros, y que cotizan al uno por ciento. El discurso del 12 de mayo, levanta el telón de la retórica y, en escena, aparece la amarga realidad. El excitante ajetreo del dinero. Bambi (así se le conoce a Zapatero, por su discurso buenista) tiene agudos colmillos con los que da dentelladas, incluso a sus ingenuos votantes. Empiezan a oírse las voces de altos cargos del partido socialista que ven su sillón en peligro: no se quejan de que el presidente sea injusto al tomar estas medidas, sino de que los deja sin discurso político ante la derecha. Quieren otro guión que sirva para echar de nuevo la manta por encima de la realidad. Y él mismo ha creído necesario anunciar precipitadamente que pronto llegarán impuestos que gravarán a los que más tienen: a la banca, a la Iglesia, a los ricos (se les llena la boca, salivan al decir la banca, los ricos, la iglesia: cultural war en estado puro). La batidora populista vuelve a girar. A lo mejor queda alguien que se crea algo. No lo sé.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Violência de Israel faz parte do dia-a-dia do povo palestino

Dafne Melo
Brasil de Fato


Para os muçulmanos, a sexta-feira é um dia sagrado, assim como o domingo para os cristãos e o sábado para os judeus. Ao meio-dia, pelos alto-falantes colocados na torre de cada mesquita, começa a ecoar uma oração. É o chamado para que a comunidade vá até a mesquita, não só para rezar, mas também para onde será feito o khutbah, uma espécie de sermão onde são discutidas inclusive questões sociais e políticas ligadas à comunidade.

Desde o início da construção do muro pelo Estado de Israel, o ritual religioso é seguido por uma manifestação política em diversas cidades da Cisjordânia por onde passa o muro. Esse é o caso de Ni’lin, próxima à cidade de Ramallah, bem como de diversas outras na Cisjordânia. Hoje há manifestações, tradicionalmente, em todas as cidades por onde passa o muro e também em cidades onde há ocupação sionista, como Hebron.

No dia 4 de junho, além das bandeiras palestinas, bandeiras turcas decoraram a marcha, em apoio ao governo da Turquia e aos ocupantes da flotilha atacada por Israel no dia 31 de maio, quando nove ativistas foram assassinados e dezenas de pessoas ficaram feridas, em mais uma ação militar do Estado de Israel.

Pouco tempo depois do chamado, dezenas de pessoas começam a se concentrar, não na mesquita, mas em um terreno a mais ou menos 1,5 quilômetro do muro. Ainda na cidade, no caminho até o terreno, Fuad Khauadja, da União de Comitês Agrícolas, que acompanha a reportagem do Brasil de Fato, para em uma venda onde um jovem com cerca de 16 anos se levanta da cadeira para cumprimentá-lo com dificuldade. Com a muleta nas mãos, trocam algumas palavras. “Ele levou um tiro em uma das manifestações de sexta-feira, na região do abdômen e na perna, e por isso tem dificuldade para andar”, conta.

Já no terreno, grupos de pessoas vão se sentando abaixo das oliveiras, para se proteger do sol, aguardando o chamado para rezar. Depois, se dispõem em três fileiras grandes em frente ao líder religioso e por pouco mais de dez minutos oram e, em seguida, caminham em marcha até um terreno inclinado, cheio de pedras, oliveiras e restos de bombas de gás lacrimogêneo usadas em outras sextas-feiras.

Adultos com crianças seguem até certa parte da caminhada. Na medida em que o grupo se aproxima do muro, soldados israelenses começam a atirar as bombas de gás lacrimogêneo com morteiros por detrás do muro. Uma parte do grupo se retira e alguns, na maioria os mais jovens, com fundas nas mãos, começam a atirar pedras para o outro lado do muro. Hoje, o vento forte está a favor dos palestinos. O gás se dispersa rápido e leva o gás em direção aos soldados.

Força desigual

Um dos símbolos do judaísmo é a estrela de David, personagem bíblico que derrotou Golias com uma funda e uma pedra. Agora, quem empunha a pedra contra o gigante são os palestinos. “A passeata é pacífica, mas para eles não existe 'pacífico'. É sempre assim, quando chegamos perto do muro já começam a atirar gás. A maioria recua, alguns jovens ficam para atirar pedras”, explica Taicir Karaja, brasileiro filho de palestinos que vive há dez anos na cidade vizinha de Saffa.

Algumas vezes, os soldados saem detrás do muro, fortemente armados, e disparam contra os manifestantes. Fuad Khauadja conta que, desde o início da construção do muro, 80 pessoas de Ni’lin foram presas e cinco pessoas foram assassinadas. Um deles, um menino de 10 anos, Ahmed, que brincava com outras crianças após a manifestação. Segundo testemunhas, um soldado israelense foi até o lugar e disparou contra o menino com uma metralhadora à queima-roupa, na cabeça. Nada foi feito, nenhuma punição foi realizada. “Israel é um Estado que não obedece a nenhuma lei, faz o que quer, nunca é punido, não importa o que faça”, diz, com revolta, Taicir.

Khauadja afirma que as manifestações já deixaram um saldo de 150 feridos, sendo que 25 deles têm seqüelas, tal como o jovem que encontramos no caminho da manifestação. “Eles procuram atirar em regiões do corpo onde há ossos, para deixar seqüelas”, denuncia Khauadja. O Crescente Vermelho Palestino, ligado à Cruz Vermelha, mantém ambulância e profissionais equipados com macas e máscaras para proteger do gás ao lado da manifestação. Hoje, felizmente, nenhum ferido.

Las aguas del Señor


quarta-feira, 9 de junho de 2010

Geopolítica de la desaparición del euro


Pierre Charasse
La Jornada

En la masa de informaciones que circula sobre la crisis del euro, no es fácil detectar los fenómenos de fondo que se están produciendo. Por eso, es importante tomar un poco de distancia, situar esta crisis en el curso de los acontecimientos de los últimos 20 años después del derrumbe de la Unión Soviética y proyectar una mirada geopolítica a mediano y largo plazo. La crisis griega confirmó, si fuera necesario, que Europa como unión política ya no existe. En las ultimas semanas, la Unión Europea (UE) reveló al resto del mundo su extrema debilidad. El euro no resistió a las ofensivas de todo tipo que sufrió en los últimos meses, a pesar de ser la moneda de una de las regiones más ricas e industrializadas del mundo.

A la primera gran crisis financiera mundial de la era de la globalización, saltó a la vista que la moneda europea no podía aguantar las turbulencias del mercado y los ataques especulativos, sencillamente porque no tenía el respaldo de una sistema político sólido y coherente. Los ideólogos ultraliberales que inventaron la moneda europea decidieron aplicar con rigor el principio de laisser-faire, prohibiendo a los gobiernos intervenir en las políticas del Banco Central Europeo (BCE). Los gobiernos de la zona euro se automutilaron cuando aceptaron el dogma de la independencia del BCE, renunciando a cualquier posibilidad de someter las políticas financieras a condiciones políticas. Después de mucha discusiones presentaron como un gran avance la decisión de constituir un fondo de rescate de 440 mil millones de euros. Y ningún gobierno, viendo el desastre social que producen los planes de ajuste impuestos por el BCE y el Fondo Monetario Internacional (FMI), quiso oponer políticas a contracorriente de la Doxa ultraliberal.

Lo que no ve el público europeo en general es que con la intervención del FMI, Estados Unidos tienen ahora derecho de intervenir en la economía europea. Todas las decisiones del FMI necesariamente requieren la aprobación del gobierno estadunidense si es que no vienen inspiradas directamente por él. En la reforma del los derechos de voto en el FMI anunciada en la última cumbre del Grupo de los 20, Estados Unidos conserva intacta la minoría de control con 16 por ciento de los votos. A la UE se le pidió reducir su parte para poder aumentar la cuota de los países emergentes. El presidente Obama ejerce plenamente el poder que le da la nueva arquitectura financiera internacional, llamada gobernanza mundial, y exige de Grecia y de otros países europeos que bajen los sueldos de sus funcionarios, que reformen el régimen de las jubilaciones y que disminuyan el gasto publico en general. Y los europeos obedecen.

Con la crisis financiera europea, se está realizando un paso más en el avasallamiento de Europa. Con el Tratado de Lisboa, Europa entregó su defensa a la Organización del Tratado del Atántico Norte (OTAN): se acabó el viejo sueño de una defensa europea independiente. Y ahora con una política financiera controlada por el FMI, la UE renunció a un pilar esencial de su independencia. Sin la defensa y la moneda, no le queda nada para afirmar su independencia dentro del bloque occidental y frente al resto del mundo.

En este contexto, parece lógico que el euro tienda a acercarse a la paridad con el dólar. Se habla en los círculos financieros de una posible dolarización de la zona euro. Técnicamente le conviene a los grandes países industrializados de Europa para recuperar su competitividad económica, castigada en la última década por un euro fuerte. Políticamente le conviene a Estados Unidos eliminar una moneda rival del dólar frente a China y otros grandes países emergentes. Los nuevos miembros de la UE ven con muy buenos ojos la dolarización de Europa, que sería para ellos una garantía suplementaria de contar con el paraguas estadunidense, como para su defensa frente a Rusia, su enemigo de siempre.

El director del FMI, Dominique Strauss Khan, se refiere con frecuencia a la necesidad de una moneda mundial, consecuencia lógica de la globalización económica y financiera. En Zurich, el 12 de mayo, él hizo un llamado a favor de la creación de un banco central mundial con una moneda mundial. En Francia el secretario de Estado para Europa, Pierre Lellouche, incansable militante atlantista, anunció triunfalmente que en el plano monetario se llegó a un mecanismo de solidaridad automática idéntico a lo que prevé el artículo 5 del tratado de la OTAN. Con esto se da el último toque a la construcción de un espacio europeo subsidiario del territorio estadunidense para formar un bloque perfectamente homogéneo bajo el liderazgo de Washington. Desde su elección, el presidente Barack Obama pide a sus aliados cerrar filas para enfrentar las nuevas amenazas mundiales.

Otro efecto de la crisis, los planes de ajuste estructural impuestos como remedio tendrán como consecuencia a corto plazo la tacherización de la Europa continental, o sea el fin del modelo social europeo. Gran Bretaña, aliado incondicional de Estados Unidos, no miembro de la eurozona con la libra esterlina, será el gran vencedor de esta crisis, con la imposición de su modelo económico y financiero a toda Europa, y el fortalecimiento de la City como plaza financiera impermeable a todos los intentos de regulación que se sugieren para prevenir nuevas catástrofes financieras mundiales.

Con la dolarización de Europa se cerrará un capítulo de la historia moderna abierto con el derrumbe del campo socialista. Para la corriente atlantista europea, actualmente mayoritaria, la desaparición de Europa como actor político y financiero autónomo es el precio a pagar para que Occidente continúe controlando el mundo frente a los países emergentes.

terça-feira, 8 de junho de 2010

El problema es el sistema, no un país


Editorial de Gara

El recorte del gasto anunciado ayer por Angela Merkel aborta una línea de argumentación sobre la crisis europea que estaba adquiriendo mucho peso, esto es, aquella que acusaba a Alemania de establecer las medidas que deberían tomar el resto de países europeos sin explicar cuáles iban a ser los ajustes a aplicar en casa. Esa perspectiva se construía hasta ahora desde un punto de vista populista y simplista, culpando a los alemanes para, al menos en el caso del resto de mandatarios europeos, esconder su propia responsabilidad. También se ha especulado mucho sobre hasta qué punto Merkel no se estaba escondiendo detrás del FMI para amortiguar el coste político que promover tales medidas podría tener en Europa. Lo cierto es que Merkel ha demostrado que está de acuerdo con la ideología que subyace a esos ajustes y que apuesta por ellos, también desde su gobierno.

A falta de conocer los detalles, las medidas presentadas por la canciller alemana son incluso más severas que las del resto de países. El reparto por sectores de los recortes también es diferente. Por ejemplo, Merkel propone reducir el gasto del Ejército y amortizar cerca de 40.000 plazas de militares. Algo que la izquierda ha planteado en otros estados sin recibir respuesta. No deja de ser cierto que el punto de partida del Gobierno alemán en este nivel es diferente al griego o al español, cuyas reconversiones y privatizaciones previas dilapidaron el proyecto de sociedad del bienestar antes de que se empezase a construir. Tampoco cabe olvidar aquí que algunas de las grandes beneficiarias de aquellas operaciones en el sur europeo fueron las empresas alemanas.

El argumentario contra esta crisis no se puede construir con elementos conspirativos en torno a ciertos países o personajes; se debe basar en una crítica estructural del sistema. De ahí saldrá un alternativa capaz de desarrollar modelos concretos sobre el terreno –desde el local hasta el continental, pasando por el nacional– en los ámbitos político y económico.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

James Galbraith: "O perigo que o déficit público representa é zero"

Ezra Klein
Washington Post

Um dos principais economistas de nosso tempo destrói sem contemplações o mito do déficit público e zomba da incompetência de seus colegas. Ezra Klein entrevistou James Galbraith para o jornal Washington Post. Reproduzimos a entrevista abaixo.

Você acredita que o perigo representado pelo déficit no longo prazo está sendo superestimado pela maioria dos economistas e jornalistas econômicos?

Não. O que eu acredito é que o perigo é zero e não que esteja sendo superestimado. Essa questão está muito mal posta.

Por que?

Qual é a natureza do perigo? A única resposta possível é que este déficit maior possa causar um aumento das taxas de juro. Bem, se os mercados achassem que isso representa um risco sério, as taxas de juro sobre os bônus do Tesouro a 20 anos não seriam de 4% e começariam a mudar agora mesmo. Se os mercados pensassem que as taxas de juro sofrem pressões por problemas de financiamento daqui a dez anos, isso se refletiria já em um aumento dos juros para os bônus de 20 anos. O que tem ocorrido, ao invés disso, é que os juros têm baixado em conseqüência da crise européia.

Assim, há duas possibilidades. Uma é que a teoria está equivocada. A outra é que o mercado é irracional. E se o mercado é irracional, não faz sentido desenhar uma política para adequar-se aos mercados, porque não cabe adequar-se a uma entidade irracional.

Mas por que a maioria de seus colegas está tão preocupada com isso então?

Aprofundemos um pouco os prognósticos do Escritório Orçamentário do Congresso. Trata-se de um conjunto de projeções. Uma delas é que a economia voltará a níveis normais de elevado emprego com baixa inflação nos próximos dez anos. Se é verdade, seriam notícias muito boas. Algumas linhas abaixo, vemos que também prevêem taxas de juro de curto prazo em alta até 5%.

O que gera esses prognósticos de enormes déficits futuros é esta combinação entre taxas de juro altas no curto prazo e inflação baixa. E esses prognósticos se baseiam na suposição de que os custos da assistência de saúde crescerão para sempre a uma taxa maior do que qualquer outra coisa, e também na suposição de que os juros de devolução da dívida representarão algo entre 21 e 25% do PIB.

Neste ponto, a coisa se torna completamente incoerente. Não se pode passar cheques para todo o mundo sem que o dinheiro entre na economia e aumente o emprego e a inflação. E se isso ocorre, então a proporção da dívida em relação ao PIB tem de decrescer, porque a inflação afeta o volume de nossa dívida. Todas essas cifras hão de se agrupar numa história coerente, e os prognósticos do Gabinete Orçamentário do Congresso não a oferece, de maneira que qualquer coisa que se diga, baseada neles é, falando estritamente, sem sentido.

Não poderia haver um meio termo entre o levantamento do Gabinete Orçamentário do Congresso e a idéia de que a dívida não representa problema algum? Parece claro, por exemplo, que os custos da assistência em saúde seguirão crescendo mais rapidamente que os outros setores da economia.

Não. Não é razoável. A proporção dos custos da assistência em saúde em relação ao PIB e a inflação cresceriam até que a taxa de inflação se aproximasse da assistência em saúde. E se a assistência em saúde se tornar tão cara terminemos pagando 20% do PIB, enquanto outros pagam 12%, poderíamos comprar Paris e todos os seus médicos e trasladar nossos idosos para lá.

Mas deixando de lado a inflação, por acaso o hiato entre receitas e despesas não teria outros efeitos perversos?

O fato de que não tenhamos financiado previamente nosso orçamento militar trouxe consigo alguma consequência terrível? Não. Há uma só autoridade orçamentária e creditícia, e a única coisa que importa é o que esta autoridade paga. Suponha que eu seja o governo federal e queira pagar a você, Ezra Klein, um bilhão de dólares para construir um porta-aviões. O que faço é transferir dinheiro para sua conta bancária. O Banco Central preocupar-se-á com isso? Terá que se preocupar com o IRS [Internal Revenue Service, a Receita Federal dos EUA]? Para gastar, o governo não precisa de dinheiro: isso é tão óbvio como que uma pista de boliche não descarrilha.

O que preocupa as pessoas é que o governo federal não seja capaz de vender títulos da dívida. Mas o governo federal não pode nunca ter problemas para vender sua dívida. Ao contrário. O gasto público é o que cria demanda bancária de títulos da dívida, porque os bancos querem rendimentos maiores para o dinheiro que o governo põe na economia. Meu pai dizia que o processo é tão sutil que a mente se bloqueia perante sua simplicidade.

Que implicações políticas isso tem?

Que deveríamos nos focar nos problemas reais e não nos fictícios. Temos problemas graves. O desemprego está em 10%. Muito melhor seria se nos dispuséssemos à tarefa de desenvolver políticas de emprego. E podemos fazê-lo, imediatamente. Temos uma crise energética e uma crise climática urgentes. Deveríamos nos dedicar durante toda uma geração a enfrentar esses problemas de um modo que nos permita reconstruir paulatinamente o nosso país. Do ponto de vista fiscal, o que há que se fazer é inverter a carga tributária, que atualmente é sustentada pelos trabalhadores. Desde o começo da crise eu venho defendendo uma isenção fiscal temporária, de modo que todos experimentem um incremento em suas rendas líquidas e possam encurtar suas hipotecas seria uma coisa boa. Também há que se incentivar aos ricos para que reciclem seu dinheiro, e por isso estou a favor de um imposto sobre os bens imóveis, um imposto que tradicionalmente tem beneficiado enormemente as nossas maiores universidades e a organizações filantrópicas sem fins lucrativos. Essa é uma diferença entre a Europa e nós.

Bem, creio que isso responde a minhas perguntas.

Mas eu ainda tenho mais uma resposta! Desde 1970 com que frequência o governo deixou de incorrer em déficit? Em seis curtos períodos, todos seguidos de recessão. Por que? Porque o governo necessita do déficit; é a única maneira de injetar recursos financeiros na economia. Se não se incorre em déficit, o que se faz é esvaziar os bolsos do setor privado. No mês passado estive num congresso em Cambridge em que o diretor executivo do FMI disse ser contrário aos déficits e partidário do arrocho fiscal: mas ambas são a mesma coisa! O déficit público significa mais dinheiro nos bolsos privados.

A forma como agora se sugere o corte de gastos sem retrair a atividade econômica é completamente falaciosa. Agora mesmo isso é desolador na Europa. Exige-se dos gregos que cortem 10% do gasto em poucos anos. E se supõe que isso não afetará o PIB. Evidentemente que o fará! De tal maneira que não disporão de receitas fiscais necessárias para financiar sequer o nível mais baixo de gasto. Ontem obrigou-se a Espanha a fazer o mesmo. A zona do euro está num despenhadeiro.

Por outro lado, olhe para o Japão. O país teve déficits enormes ininterruptos desde o crash de 1988. Qual foi a taxa de juros da dívida pública japonesa desde então? Zero! Não tiveram o menor problema em financiar-se. O melhor ativo que se pode possuir no Japão é o dinheiro a vista, porque o nível dos preços cai. Te dá um rendimento de 4%. A idéia de que as dificuldades de financiamento se originam nos déficits é um argumento sustentado numa metáfora muito potente, mas não nos fatos, não na teoria e não na experiência cotidiana.

domingo, 6 de junho de 2010

Israel: A marcha da insensatez

Reginaldo Nasser
Carta Maior

Quanto mais o governo de Israel e seus apoiadores tentam explicar o ato de pirataria cometido nas embarcações de ajuda humanitária, mais se explicita uma tentativa desesperadora de afirmar uma realidade que escapa a todo o momento e que se torna cada vez mais insustentável. A porta-voz das forças armadas israelenses justificou o ataque fora do mar territorial como uma ação preventiva e imputou a responsabilidade pelo confronto e pelas mortes aos ativistas. Para arrematar forneceu uma informação extremamente relevante para justificar o direito à defesa, os ativistas tinham a intenção de linchar os soldados e estavam portando “barras de ferro, bolas de gude, e estilingues” e alguns integrantes dos comandos israelenses estavam com armas do paintball!

Se isso não bastasse, duas semanas antes a BBC (15 de Maio de 2010) teve acesso a documentos apresentados num tribunal israelense, por solicitação de uma organização israelense de direitos humanos (Gisha), que contém detalhes sobre o bloqueio da Gaza. Israel descreve as severas restrições como "um conjunto meios de que dispõe o Estado de Israel no conflito armado com o Hamás" e lá constam estimações sobre a quantidade mínima de calorias que necessitam consumir os habitantes de Gaza. Os produtos que Israel permite introduzir em Gaza têm mudado com o tempo, obrigado as organizações humanitárias adivinhar o que é permitido ou não. Entre a ampla gama de produtos que atualmente estão proibidos se incluem marmelada, chocolate, madeira para moveis, sucos de frutas e produtos têxteis.

Entretanto esses relatos bizarros revelam algo trágico. De acordo com o relatório da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), 61% da população de Gaza tem acesso precário aos alimentos. Desde a imposição do bloqueio econômico triplicou o número de refugiados palestinos que não tem meios para comprar itens básicos (alimentos, água potável e material escolar). Entre 2008 e 2009, a pesca, em Gaza, diminuiu 47%, como conseqüência da restrição imposta por Israel aos barcos a apenas três milhas da costa. As sanções econômicas impostas por Israel e o Quarteto (grupo formado pela ONU, União Européia, Rússia e EUA) tiveram início após as eleições legislativas de janeiro de 2006 que levaram o Hamas democraticamente ao poder e foram suspensas em junho de 2007 após a invasão militar de Gaza, mas o bloqueio de Israel se intensificou desde então.

A operação militar de Israel (2008-2009) danificou 15 dos 27 hospitais de Gaza e danificou ou destruiu 43 das 110 instalações de cuidados primários de saúde, nenhuma das quais foram reparadas ou reconstruídas por causa da proibição de materiais de construção. Cerca de 20% por cento dos medicamentos essenciais são comumente fora de estoque e há falta de muitos itens de equipamentos médicos de acordo com o relatório da OMS.

A precária situação de Gaza se deteriorou significativamente desde 2005. Naquele momento uma série de fatores no Oriente Médio proporcionou uma onda de otimismo nos EUA fazendo com que muitos avaliassem que se tratava da “primavera árabe”: o falecimento de Arafat em 2004, seguido da eleição de Abbas à presidência da Autoridade Palestina e a participação do eleitorado iraquiano nas eleições após a queda de Sadam Hussein. O impacto foi tão forte que até mesmo vários críticos do governo Bush reconheciam que a política dos EUA finalmente começava a produzir bons resultados, a prova cabal de que os EUA estavam realmente determinados a apoiarem a democracia no Oriente Médio. No entanto, o que houve foi a manifestação de um grande descontentamento e um profundo desejo de mudança na “rua árabe”. Podendo competir livremente nas eleições Hezbollah e Hamas emergiram triunfantes nas eleições no Líbano e Palestina (2005-2006). A reação pode ser avaliada nas palavras do articulista do Times: a democracia está sendo “seqüestrada”, os terroristas estão usando as eleições para perseguir islamizar o mundo árabe (Friedman, 2006).

Na verdade tratou-se de uma clara demonstração que esses chamados “terroristas” não rejeitam reformas democráticas, pelo contrário, lutam contra o despotismo e corrupção e os abusos praticados por aqueles que estão no poder, e buscam realizar reformas políticas que correspondam aos seus valores e que possam ser implementadas em um ritmo consistente com a composição social e as condições políticas de suas respectivas comunidades. “Podemos realmente nos dar ao luxo de acreditar que de alguma forma extremistas cruéis podem ser apaziguados?", questionou o então secretário de Defesa Rumsfeld.

Em dezembro de 2005, um mês antes da eleição palestina, o Congresso dos EUA aprovou uma resolução por uma maioria esmagadora 397-17 (com votos de Hillary Clinton e Obama) anunciando sanções por ter, a Autoridade Palestina, permitido a participação do Hamas nas eleições que foram acompanhadas por observadores internacionais e reconhecidas como livres e justas. O Hamas obteve a maioria do Parlamento e do direito de escolher o primeiro-ministro, mas devido à pressão dos EUA Abbas recusou o convite do Hamas para formar um governo de unidade nacional.

Ainda que de forma reticente e dividido Hamas agiu pragmaticamente aceitando três grandes condições que a ONU, a UE e os EUA lhe haviam exigido para por fim ao boicote econômico e diplomático: aceitava trégua unilateral, ‘honraria’ os acordos prévios feitos pela OLP e, consequentemente, um reconhecimento de fato de Israel. Em maio de 2006 o The Guardian divulgou relatório de autoria de Álvaro de Soto ( alto representante da ONU no Oriente Médio) com duras críticas à postura dos EUA, de Israel, e da própria ONU na condução das negociações que deveriam encerrar o conflito na região. Afirmava que Israel impôs "precondições inalcançáveis" para o diálogo após a eleição do grupo Hamas com o intuito de levar à queda precoce do governo e acusou os EUA de ter estimulado o confronto entre o Hamas e o Fatah.

Será que a simples destruição dos movimentos populares como o Hamas ou o Hezbollah traria suas respectivas comunidades mais próximas do ocidente? As sucessivas invasões militares e o bloqueio econômico criminoso serviram para fortalecer ainda mais o Hamas, e as guerras no Afeganistão e Iraque geraram insurgências e ações terroristas ampliando seu alcance e seu apelo em todo o Oriente Médio. Será que o que está em jogo não é a democracia ocidental, mas o direito de ser tratado no mesmo nível de igualdade em todos os aspectos, incluindo o de escolher viver em seu território?

O relatório do jurista Goldstone sobre o conflito na faixa de Gaza culpa o governo de Israel de crimes de guerra. Israel forjou passaportes britânicos e australianos usado pelos assassinos para matar um comandante do Hamas em Dubai. Israel anuncia planos para construir 1.600 casas para judeus em uma área da Cisjordânia anexada. Os signatários do Tratado de Não-Proliferação Nuclear (NPT) aprovaram por unanimidade declaração instando Israel a assinar o TNP, e colocar as suas instalações nucleares sob salvaguardas da ONU. Por que o direito de Israel em "se defender" o exime de ter responsabilidades morais?

Como disse o historiador judeu Avi Shlaim vivemos uma situação surreal onde uma parte significativa da comunidade internacional não impôs sanções econômicas contra o ocupante, mas contra a ocupação, não contra o opressor, mas contra o oprimido. Chegou a hora da chamada comunidade internacional ser um pouco mais sensata.

sábado, 5 de junho de 2010

Perú: Un año de la masacre de Bagua


Raúl Zibechi
La Jornada

El movimiento indígena peruano se apresta a recordar el primer aniversario de la masacre de Bagua con movilizaciones y jornadas de lucha en todo el país. El reciente retorno de Alberto Pizango, principal dirigente de la Asociacióón Interétnica para el Desarrollo de la Selva Peruana (Aidesep), que agrupa a mil 300 comunidades, fortalece el protagonismo de los pueblos amazónicos en la vida política peruana. Pizango retornó de su exilio de un año en Nicaragua, fue detenido y llevado a la justicia, que lo dejó en libertad restringida.

El 5 de junio de 2009, luego de casi dos meses de intensa movilización en la Amazonia para conseguir la derogación de los decretos legislativos que permitían una abusiva explotación de los bienes comunes sin consulta ni consentimiento de los pueblos originarios, una feroz represión por aire y tierra se saldó con 34 muertos oficiales, 10 indígenas y 24 policías, cuando las tropas pretendieron desalojar a los miles que bloqueaban carreteras. La brutal represión en la Curva del Diablo habría provocado muchos más muertos en filas indias que los reconocidos oficialmente, según denuncia de las organizaciones amazónicas.

Luego de la represión y la persecución de sus dirigentes, los pueblos de la Amazonia consiguieron una resonante victoria al derogar el gobierno de Alan García los decretos más polémicos. Más aún, el 19 de mayo el Parlamento aprobó la Ley Marco de Consulta Previa que estipula que los emprendimientos mineros deberán pasar por una fase de consulta con los pueblos. Aunque no recoge todas sus demandas, se considera un nuevo triunfo de los pueblos amazónicos.

Los conflictos sociales en defensa del ambiente vienen escalando en Perú. La Defensoría del Pueblo estableció que en los seis primeros meses de 2009 hubo 273 conflictos sociales, siendo 47 por ciento relacionados con temas socioambientales, de los cuales 71 por ciento son conflictos relacionados con la actividad minera. Respecto del año anterior, los conflictos se duplicaron, lo que revela que las comunidades están cada vez menos dispuestas a tolerar la actividad de la minería transnacional que contamina fuentes de agua y provoca daños a la salud de la población. Desde que se instaló el régimen de Alberto Fujimori en 1990, los sucesivos gobiernos apostaron a la expansión de la explotacióón minera como eje del crecimiento económico. Alan García pretende parcelar 63 millones de hectáreas de la selva en propiedades de cinco a 20 mil hectáreas, para fomentar la inversión.

El levantamiento amazónico puso en cuestión el Estado-nación peruano. Muchos analistas hablan de una crisis irreversible del modelo estatal heredado de la Colonia. “Es una crisis que no es coyuntural sino estructural, con lo cual estaríamos llegando a una etapa de cambio de era”, escribió el historiador Manuel Burga poco después de la masacre de Bagua (La República, 28 de junio de 2009). En su opinión, se está llegando a una situación inédita por la cual “un nuevo modelo de nación va a exigir un nuevo modelo económico”.

Nuevos movimientos que provienen de la periferia, que exigen autonomía y reclaman “ya no sólo respeto a los individuos, sino respeto a las colectividades”. En suma, se está ante un viraje de larga duración en la historia de las luchas sociales del país, ya que hasta ahora el protagonismo siempre lo tuvieron las organizaciones campesinas quechuas de la sierra, y antes los sindicatos obreros.

Rodrigo Montoya, antropólogo muy cercano a los movimientos indios, sostiene que se trata de la segunda gran rebelión amazónica. La primera la protagonizó Juan Santos Atahualpa en 1742, en la selva central. Resistió a los ejércitos coloniales y nunca fue derrotado. La segunda es ahora. “Han cuajado un liderazgo suficientemente capaz como para presentar una alternativa que no es sólo para los pueblos indígenas, sino para la sociedad peruana en su conjunto”. Añade que se trata de un movimiento plural y diverso que, al igual que el chiapaneco, “está ofreciéndole al mundo un horizonte, una ilusión, una perspectiva, otros valores, ideas y sueños”, dijo en el debate Territorio, movimiento indígena y buen vivir.

Alberto Pizango es un emergente de esa nueva generación de dirigentes. Tiene poco más de 40 años, es profesor y trabaja como maestro bilingüe en las comunidades nativas. Forma parte del enorme contingente de maestros bilingües, buenos conocedores de las dos culturas ya que se han graduado en las ciudades. Un caso similar es el de Mario Palacios, presidente de Conacami (Confederacióón Nacional de Comunidades del Perú Afectadas por la Minería), la organizacióón que agrupa a cientos de comunidades que vienen resistiendo a las multinacionales en todo el país. En su opinión, las nuevas organizaciones postulan “una nueva forma de democracia, que es comunitaria y se expresa en el concepto del ‘mandar obedeciendo’”.

El veterano luchador por la reforma agraria y ex guerrillero Hugo Blanco sostiene que la rebeldía de los pueblos amazónicos representa la irrupción de un nuevo sujeto, “los menos domesticados por la modernidad”, que están llamados a cambiarle la cara al país y, muy en particular, a los sectores que resisten y se organizan en movimientos antisistémicos.

El gobierno de Alan García está acosado por varias denuncias de corrupción y se muestra cada vez más alineado con las grandes empresas. Pese a su escasa popularidad, tejió una alianza con Keiko Fujimori, la hija del dictador sentenciado y en prisión, que le garantiza las mayorías parlamentarias necesarias para gobernar a cambio de un muy favorable régimen carcelario para su padre. El frente social está agitado. Para mediados de junio se anuncian paros de 24 horas en el combativo Sur (Arequipa, Cuzco, Puno, Moquegua, Taca, Apurímac y Madre de Dios) para impedir la exportación del gas de Camisea y la construcción de la hidroeléctrica de Inambari, que inundará decenas de comunidades. La región andino-amazónica está siendo sacudida por levantamientos indígenas en defensa de los bienes comunes.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Crónica de uma tragédia anunciada


Boaventura de Sousa Santos
Sul21

A tragédia grega da Antiguidade clássica distinguiu-se por ser portadora de questões universais. As questões tinham já sido levantadas noutros lugares e por outras culturas mas tornaram-se universais ao servirem de base à cultura europeia. A actual tragédia grega não foge à regra. Identifiquemos as questões principais e as lições que delas retiramos.

Os castelos neo-feudais: da Disneylandia à eurolandia

Tudo o que se tem passado nos últimos meses na Europa do Sul ocorreu antes em muitos países do Sul global mas enquanto ocorreu no “resto do mundo” foi visto como um mal necessário imposto globalmente para corrigir erros locais e promover o enriquecimento geral do mundo. A existência de critérios duplos para os mesmos erros – a dívida externa dos EUA ultrapassa o valor total da dívida dos países europeus, africanos e asiáticos; comparada com as fraudes cometidas por Wall Street a fraude grega é um truque mal feito por falta de prática – passaram despercebidos e o mesmo aconteceu com as estratégias e decisões por parte de actores muito poderosos com vista a obter um resultado bem identificado: o empobrecimento geral dos habitantes do planeta e o enriquecimento sem sentido de uns poucos senhores neo-feudais apostados em livrarem-se dos dois obstáculos que o século passado pôs no seu caminho desvairado: os movimentos sociais e o Estado democrático (a eliminação do terceiro obstáculo, o comunismo, fora-lhes oferecida pelos arautos do “fim da história”). A tragédia grega veio revelar tudo isso.

Está hoje relatada em detalhe (com nomes e apelidos, hora e endereço em Manhattan) uma reunião de directores de fundos especulativos de alto risco (hedge funds) em que foi tomada a decisão de atacar o euro através do seu elo fraco, a Grécia. Alguns dias depois, em 26 de Fevereiro de 2010, o Wall Street Journal dava conta do ataque em preparação. Nessa reunião participaram, entre outros, o representante do banco Goldman Sachs, que tinha sido o facilitador do sobreendividamento da Grécia e do seu disfarce, e o representante do especulador de mais êxito e menos punido da história da humanidade, George Soros, que, em 1988, conduzira o ataque à Société Générale e, em 1992, planeara o afundamento da libra esterlina (tendo ganho num dia 1000 milhões de dólares). A ideia do mercado como um ser vivente que reage e actua racionalmente deixou de ser uma contradição para passar a ser um mito: o mercado financeiro é o castelo dos senhores neo-feudais.

O que os relatos raramente mencionam é que esses investidores institucionais, reunidos em Manhattan numa noite de Fevereiro, sentiram que estavam a cumprir uma missão patriótica: liquidar a pretensão de o euro vir a rivalizar com o dólar enquanto moeda internacional. Os EUA são hoje um país insustentável sem essa prerrogativa do dólar. Se os países emergentes, os países com recursos naturais e produtores de commodities – que o capital financeiro há muito identificou como o novo El Dorado – caíssem na tentação de colocar as suas reservas em euros (como antes tentara Saddam Hussein e pelo qual pagou um preço alto), o dólar correria o risco de deixar de ser a pilhagem institucionalizada das reservas do mundo e o privilégio extraordinário de imprimir notas de dólares de pouco valeria aos EUA. O golpe foi dado com peso e medida: aos EUA interessa um euro estável na condição de tal estabilidade ser tutelada pelo dólar. É isso o que está em curso e é essa a missão do FMI. Tal como aconteceu no passado, o poder financeiro é o último a ser perdido pela potência hegemónica no sistema mundial. Na longa transição, “os interesses convergentes” são sobretudo com os países emergentes (no caso, China, Índia, Brasil) e não com o rival mais directo (o capitalismo europeu). Tudo isto foi patente na Conferência da ONU sobre a Mudança Climática realizada em Dezembro passado em Copenhague.

A falta que o comunismo faz

Os economistas latino-americanos Óscar Ugarteche e Alberto Acosta descrevem como, em 27 de Fevereiro de 1953, foi acordada pelos credores a regularização da imensa dívida externa da então República Federal Alemã. Este país obteve uma redução de 50% a 75% da dívida derivada, directa ou indirectamente, das duas guerras mundiais; as taxas de juro foram drasticamente reduzidas para entre 0 e 5%; foi ampliado o prazo para os pagamentos; o cálculo do serviço da dívida foi definido em função da capacidade de pagamento da economia alemã e, portanto, vinculado ao processo de reconstrução do país. A definição de tal capacidade foi entregue ao banqueiro alemão Herman Abs que presidia à delegação alemã nas negociações. Foi criado um sistema de arbitragem ao qual nunca se recorreu dadas as vantajosas condições oferecidas ao devedor.

Este acordo teve muitas justificações mas a menos comentada foi a necessidade de, em pleno período da Guerra Fria, levar o êxito do capitalismo até bem perto da Cortina de Ferro. O mercado financeiro tinha então, tal como hoje, motivações políticas; só que as de então eram muito diferentes das de hoje e em boa parte a diferença explica-se pelo facto de a democracia liberal se ter tornado no energy drink do capitalismo, que aparentemente o torna invencível (só não o defende de si próprio, como já profetizou Schumpeter). Ângela Merkel nasceria um ano depois e só depois de 1989 viria a conhecer em primeira-mão o mundo do lado de cá da Cortina. Nasceu politicamente a beber essa energy drink, o que, combinado com a militante ignorância da história que o capitalismo impõe aos políticos, transforma a sua falta de solidariedade para com o projecto europeu num acto de coragem política. Sessenta anos depois da “Declaração de Interdependência” de Robert Schuman e Jean Monet, a guerra continua a “ser impensável e materialmente impossível”, mas, parafraseando Clausewitz, interrogamo-nos sobre se a guerra não está a voltar por outros meios.

O Estado como imaginação do Estado

Tenho vindo a escrever que a regulação moderna ocidental assenta em três pilares: o princípio do mercado, o princípio do Estado e o princípio da comunidade. Estes três princípios (sobretudo os dois primeiros) têm historicamente alternado no protagonismo em definir a lógica da regulação. Tem sido convencionalmente entendido que a regulação social do período do pós-guerra até 1980 foi dominada pelo princípio do Estado e que de então para cá passou a dominar o princípio do mercado, o que se convencionou chamar neoliberalismo. Muitos viram na crise do subprime e da debacle financeira da 2008 o regresso do princípio do Estado e o consequente fim do neoliberalismo. Esta conclusão foi precipitada. Deveria ter funcionado como alerta a rapidez com que os mesmos actores que, durante a noite neoliberal, consideraram o Estado como o “ Grande Problema”, passaram a considerar o Estado como a “Grande Solução”. A verdade é que, nos últimos trinta anos, o princípio do mercado colonizou de tal maneira o princípio do Estado que este passou a funcionar como um ersatz do mercado. Por isso, o Estado que era problema era muito diferente do Estado que veio a ser a solução. A diferença passou despercebida porque só o Estado sabe imaginar-se como Estado independentemente do que faz enquanto Estado. O sintoma mais evidente desta colonização foi a adopção da doutrina neoliberal por parte da esquerda europeia e mundial, o que a deixou desarmada e desprovida de alternativas quando a crise eclodiu. Daí, o triunfo da direita sobre as ruínas da devastação social que criara. Daí, que os governos socialistas da Grécia, Portugal e Espanha achem mais natural reduzir os salários e as pensões do que tributar as mais valias financeiras ou eliminar os paraísos fiscais. Daí, finalmente, que a União Europeia ofereça o maior resgate do capital financeiro da história moderna sem impor a estrita regulação do sistema financeiro.

O fascismo dentro da democracia

Nos anos 20 do século passado, depois de uma longa estadia em Itália, José Mariátegui, grande intelectual e líder marxista peruano, considerava que a Europa daquele tempo se caracterizava pela aparição de duas violentas negações da democracia liberal: el comunismo y el fascismo. Cada uma à sua maneira tentaria destruir a democracia liberal. Passado um século, podemos dizer que, no nosso tempo, as duas negações da democracia liberal – que hoje chamaríamos socialismo e fascismo – não enfrentam a democracia a partir de fora; enfrentam-na a partir de dentro. As forças socialistas são hoje particularmente visíveis no continente latino-americano e afirmam-se como revoluções de novo tipo: a revolução bolivariana (Venezuela), a revolução cidadã (Equador), a revolução comunitária (Bolívia). Comum a todas elas é o facto de terem emergido de processos eleitorais próprios da democracia liberal. Em vez de negar a democracia liberal, enriquecem-na com outras formas de democracia: a democracia participativa e a democracia comunitária. Se considerarmos a democracia liberal um dispositivo político hegemónico, as lutas socialistas de hoje configuram um uso contra-hegemónico de um instrumento hegemónico.

Por sua vez, as forças fascistas actuam globalmente para mostrar que só é viável uma democracia de muito baixa intensidade (sem capacidade de redistribuição social), confinada à alternativa: ser irrelevante (não afectar os interesses dominantes) ou ser ingovernável. Em vez de promover o fascismo político promovem o fascismo social. Não se trata do regresso ao fascismo do século passado. Não se trata de um regime político mas antes de um regime social. Em vez de sacrificar a democracia às exigências do capitalismo, promove uma versão empobrecida de democracia que torna desnecessário e mesmo inconveniente o sacrifício. Trata-se, pois, de um fascismo pluralista e, por isso, de uma forma de fascismo que nunca existiu. O fascismo social é uma forma de sociabilidade em que as relações de poder são tão desiguais que a parte mais poderosa adquire um direito de veto sobre as condições de sustentabilidade da vida da parte mais fraca. Quem está sujeito ao fascismo social não vive verdadeiramente em sociedade civil; vive antes num novo estado de natureza, a sociedade civil in-civil.

Uma das formas de sociabilidade fascista é o fascismo financeiro, hoje em dia talvez o mais virulento. Comanda os mercados financeiros de valores e de moedas, a especulação financeira global, um conjunto hoje designado por economia de casino. Esta forma de fascismo social apresenta-se como a mais pluralista na medida em que os movimentos financeiros são aparentemente o produto de decisões de investidores individuais ou institucionais espalhados por todo o mundo e, aliás, sem nada em comum senão o desejo de rentabilizar os seus valores. Por ser o fascismo mais pluralista é também o mais agressivo porque o seu espaço-tempo é o mais refractário a qualquer intervenção democrática. Significativa, a este respeito, é a resposta do corrector da bolsa de valores quando lhe perguntavam o que era para ele o longo prazo: “longo prazo para mim são os próximos dez minutos”. Este espaço-tempo virtualmente instantâneo e global, combinado com a lógica de lucro especulativa que o sustenta, confere um imenso poder discricionário ao capital financeiro, praticamente incontrolável apesar de suficientemente poderoso para abalar, em segundos, a economia real ou a estabilidade política de qualquer país. A virulência do fascismo financeiro reside em que ele, sendo de todos o mais internacional, está a servir de modelo a instituições de regulação global há muito importantes, mas que só agora começam a ser conhecidas do público. Entre elas, as empresas de rating, as empresas internacionalmente acreditadas (mesmo depois do descrédito que sofreram durante a crise de 2008) para avaliar a situação financeira dos Estados e os consequentes riscos e oportunidades que eles oferecem aos investidores internacionais. As notas atribuídas são determinantes para as condições em que um país ou uma empresa de um país pode aceder ao crédito internacional. Quanto mais alta a nota, melhores as condições. Estas empresas têm um poder extraordinário.

Segundo o colunista do New York Times, Thomas Friedman, «o mundo do pós-guerra fria tem duas superpotências, os EUA e a agência Moody’s». Friedman justifica a sua afirmação acrescentando que «se é verdade que os EUA podem aniquilar um inimigo utilizando o seu arsenal militar, a agência de qualificação financeira Moody’s tem poder para estrangular financeiramente um país, atribuindo-lhe uma má nota». Num momento em que os devedores públicos e privados entram numa batalha mundial para atrair capitais, uma má nota pode significar o colapso financeiro do país. Os critérios adoptados pelas empresas de rating são em grande medida arbitrários, reforçam as desigualdades no sistema mundial e dão origem a efeitos perversos: o simples rumor de uma próxima desqualificação pode provocar enorme convulsão no mercado de valores de um país. O poder discricionário destas empresas é tanto maior quanto lhes assiste a prerrogativa de atribuírem qualificações não solicitadas pelos países ou devedores visados. O facto de ser também um poder corrupto – as agências são pagas pelos bancos que avaliam e actuam na especulação financeira, tendo, por isso, interesses próprios nas avaliações que fazem – não mereceu até agora qualquer atenção. A virulência do fascismo financeiro reside no seu potencial de destruição, na sua capacidade para lançar no abismo da exclusão países inteiros. Quando o orçamento do Estado fica exposto à especulação financeira – como sucede agora nos países do sul da Europa – as regras de jogo democrático que ele reflecte tornam-se irrelevantes, a estabilidade das expectativas que elas promovem desfaz-se no ar.

Tudo o que é sólido se desfaz no ar

É bem conhecido o modo como o Manifesto Comunista de 1848 descreve a incessante revolução dos instrumentos de produção por parte da burguesia: “Tout ce qui avait solidité et permanence s'en va en fumée, tout ce qui était sacré est profané, et les hommes sont forcés enfin d'envisager leurs conditions d'existence et leurs rapports réciproques avec des yeux désabusés”. Quando a usurpação da política por parte de uma econopolícia selvagem atinge os lugares sagrados da democracia, dos direitos humanos, do contrato social e do primado do direito, que até há pouco serviam de santuário de peregrinação para os povos de todo o mundo, a perturbação e o desassossego são o que resta da solidez. A grande incógnita é de saber até que ponto o empobrecimento do mundo e da democracia produzido pelo casino financeiro vai continuar a ocorrer dentro do marco democrático, mesmo de baixa intensidade. Podemos esquecer Mariátegui?

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Crise ecológica, capitalismo, altermundialismo: um ponto de vista ecosocialista



Michael Löwi
Margem Esquerda

Grandezas e limites da ecologia

A grande contribuição da ecologia foi e continua sendo nos fazer tomar consciência dos perigos que ameaçam o planeta como consequência do atual modelo de produção e consumo. O crescimento exponencial das agressões ao meio ambiente e a ameaça crescente de uma ruptura do equilíbrio ecológico configuram um quadro catastrófico que coloca em questão a própria sobrevivência da vida humana. Estamos diante de uma crise de civilização que exige mudanças radicais.

Os ecologistas se enganam se crêem poder abrir mão da crítica marxiana do capitalismo: uma ecologia que não leve em conta a relação entre “produtivismo” e lógica do lucro está destinada ao fracasso – ou pior, à sua recuperação pelo sistema. Os exemplos não faltam... A ausência de uma postura anticapitalista coerente levou a maior parte dos partidos verde europeus – França, Alemanha, Itália, Bélgica – a tornar-se simples parceiro “ecoreformista” da gestão social-liberal do capitalismo pelos governos de centro-esquerda.

Considerando os trabalhadores irremediavelmente destinados ao produtivismo, alguns ecologistas ignoram/descartam o movimento operário e inscrevem em suas bandeiras: “nem esquerda, nem direita”. Ex-marxistas convertidos à ecologia declaram apressadamente “adeus à classe operária” (André Gorz), enquanto outros autores (Alain Lipietz) insistem na necessidade de abandonar o “vermelho” – isto é, o marxismo ou o socialismo – para aderir ao “verde”, novo paradigma que trará uma resposta a todos os problemas econômicos e sociais.

O eco-socialismo

O que é então o eco-socialismo? Trata-se de uma corrente de pensamento e ação ecológicos que toma como suas as aquisições fundamentais do marxismo – ao mesmo tempo que se livra de seus entulhos produtivistas. Para os ecossocialistas a lógica do mercado e do lucro – bem como aquela do defunto do autoritarismo burocrático, o “socialismo real” – são incompatíveis com as exigências de preservação do meio ambiente. Ao mesmo tempo que criticam a ideologia das correntes dominantes do movimento operário, eles sabem que os trabalhadores e suas organizações são uma força essencial para uma transformação radical do sistema e para a construção de uma nova sociedade socialista e ecológica.

Essa corrente está longe de ser politicamente homogênea, mas a maior parte de seus representantes compartilha alguns temas. Rompendo com a ideologia produtivista do progresso – em sua forma capitalista e/ou burocrática – e oposta à expansão ao infinito de um modo de produção e consumo destruidor da natureza, o eco-socialismo representa uma tentativa original de articular as ideias fundamentais do socialismo marxista com as contribuições da crítica ecológica.

O raciocínio eco-socialista se apoia em dois argumentos essenciais: 1) o modo de produção e consumo atual dos países capitalistas avançados, fundado sobre uma lógica de acumulação ilimitada (do capital, dos lucros, das mercadorias), desperdício de recursos, consumo ostentatório e destruição acelerada do meio ambiente, não pode de forma alguma ser estendido para o conjunto do planeta, sob pena de uma crise ecológica maior. Segundo cálculos recentes, se o consumo médio de energia dos EUA fosse generalizado para o conjunto da população mundial, as reservas conhecidas de petróleo seriam esgotadas em 19 dias. Esse sistema está, portanto, necessariamente fundado na manutenção e agravamento da desigualdade entre o Norte e o Sul;

2) de qualquer maneira, a continuidade do “progresso” capitalista e a expansão da civilização fundada na economia de mercado – até mesmo sob esta forma brutalmente desigual – ameaça diretamente, a médio prazo (toda previsão seria arriscada), a própria sobrevivência da espécie humana, em especial por causa das consequências catastróficas da mudança climática.

A racionalidade limitada do mercado capitalista, com seu cálculo imediatista das perdas e lucros, é intrinsecamente contraditória com uma racionalidade ecológica, que leve em conta a temporalidade longa dos ciclos naturais. Não se trata de opor os “maus” capitalistas ecocidas aos “bons” capitalistas verdes: é o próprio sistema, fundado na competição impiedosa, nas exigências de rentabilidade, na corrida pelo lucro rápido, que é destruidor dos equilíbrios naturais. O pretenso capitalismo verde não passa de uma manobra publicitária, uma etiqueta buscando vender uma mercadoria, ou, no melhor dos casos, uma iniciativa local equivalente a uma gota-d’água sobre o solo árido do deserto capitalista.

Contra o fetichismo da mercadoria e a autonomização reificada da economia pelo neoliberalismo, o que está em jogo no futuro para os eco-socialistas é pôr em prática uma “economia moral” no sentido dado por Edward P. Thompson a este termo, isto é, uma política econômica fundada em critérios não monetários e extraeconômicos: em outras palavras, a reconciliação do econômico no ecológico, no social e no político.

As reformas parciais são totalmente insuficientes: é preciso substituir a microrracionalidade do lucro pela macrorracionalidade social e ecológica, algo que exige uma verdadeira mudança de civilização . Isso é impossível sem uma profunda reorientação tecnológica, visando a substituição das fontes atuais de energia por outras não poluentes e renováveis, como a eólica ou solar . A primeira questão colocada é, portanto, a do controle sobre os meios de produção e, principalmente, sobre as decisões de investimento e transformação tecnológica, que devem ser arrancados dos bancos e empresas capitalistas para tornarem-se um bem comum da sociedade.

Certamente, a mudança radical se relaciona não só com a produção, mas também com o consumo. Entretanto, o problema da civilização burguês-industrial não é – como muitas vezes os ecologistas argumentam – “o consumo excessivo” pela população e a solução não é uma “limitação” geral do consumo, sobretudo nos países capitalistas avançados. É o tipo de consumo atual, fundado na ostentação, no desperdício, na alienação mercantil, na obsessão acumuladora, que deve ser colocado em questão.

Ecologia e altermundialismo

Sim, nos responderão, é simpática essa utopia, mas por enquanto é preciso ficar de braços cruzados? Certamente não! É preciso lutar por cada avanço, cada medida de regulamentação, cada ação de defesa do meio ambiente. Cada quilômetro de estrada bloqueado, cada medida favorável aos transportes coletivos é importante; não somente porque retarda a corrida em direção ao abismo, mas porque permite às pessoas, aos trabalhadores, aos indivíduos se organizar, lutar e tomar consciência do que está em jogo nesse combate, de compreender, por sua experiência coletiva, a falência do sistema capitalista e a necessidade de uma mudança de civilização.

É nesse espírito que as forças mais ativas da ecologia estão engajadas, desde o início, no movimento altermundialista. Tal engajamento corresponde à tomada de consciência de que os grandes embates da crise ecológica são planetários e, portanto, só podem ser enfrentados por uma démarche resolutamente cosmopolítica, supranacional, mundial. O movimento altermundialista é sem dúvida o mais importante fenômeno de resistência antisistêmica do início do século XXI.

Essa vasta nebulosa, espécie de “movimento dos movimentos” que se manifesta de forma visível nos Fóruns Sociais – regionais e mundiais – e nas grandes manifestações de protesto – contra a Organização Mundial do Comércio (OMC), o G8 ou a guerra imperial no Iraque – não corresponde às formas habituais de ação social ou política. Ampla rede descentralizada, ele é múltiplo, diverso e heterogêneo, associando sindicatos operários e movimentos camponeses, ONGs e organizações indígenas, movimentos de mulheres e associações ecológicas, intelectuais e jovens ativistas. Longe de ser uma fraqueza, essa pluralidade é uma das fontes da força, crescente e expansiva, do movimento.

Pode-se afirmar que o ato de nascimento do altermundialismo foi a grande manifestação popular que fez fracassar a reunião da OMC em Seattle, em 1999. A cabeça visível desse combate era a convergência surpreendente de duas forças: turtles and teamsters, ecologistas vestidos de tartarugas (espécie ameaçada de extinção) e sindicalistas do setor de transportes. Portanto, a questão ecológica estava presente, desde o início, no coração das mobilizações contra a globalização capitalista neoliberal. A palavra de ordem central desse movimento, “o mundo não é uma mercadoria”, visa também, evidentemente, o ar, a água, a terra, isto é, o ambiente natural, cada vez mais submetido aos ditames do capital.

Podemos afirmar que o altermundialismo comporta três momentos: 1) o protesto radical contra a ordem existente e suas sinistras instituições: o FMI, o Banco Mundial, a OMC, o G8; 2) um conjunto de medidas concretas, propostas passíveis de serem imediatamente realizadas: a taxação dos capitais financeiros, a supressão da dívida do Terceiro Mundo, o fim das guerras imperialistas; 3) a utopia de um “outro mundo possível”, fundado sobre valores comuns como liberdade, democracia participativa, justiça social e defesa do meio ambiente.

A dimensão ecológica está presente nesses três momentos: ela inspira tanto a revolta contra um sistema que conduz a humanidade a um trágico impasse, quanto um conjunto de propostas precisas – moratória sobre os OGMs (Organismos Geneticamente Modificados), desenvolvimento de transportes coletivos gratuitos –, bem como a utopia de uma sociedade vivendo em harmonia com os eco-sistemas, esboçada pelos documentos do movimento. Isso não quer dizer que não existam contradições, fruto tanto da resistência de setores do sindicalismo às reivindicações ecológicas, percebidas como uma “ameaça ao emprego”, quanto da natureza míope e pouco social de algumas organizações ecológicas. Mas uma das características mais positivas dos Fóruns Sociais, e do altermundialismo em seu conjunto, é a possibilidade do encontro, debate, diálogo e da aprendizagem recíproca de diferentes tipos de movimentos.

É preciso acrescentar que o próprio movimento ecológico está longe de ser homogêneo: é muito diverso e contem um espectro que vai desde ONGs moderadas habituadas ao lobby como forma de pressão, até os movimentos combativos inseridos num trabalho de base militante; da gestão “realista” do Estado (no nível local ou nacional) às lutas que colocam em questão a lógica do sistema; da correção dos “excessos” da economia de mercado às iniciativas de orientação eco-socialista.

Essa heterogeneidade caracteriza, diga-se de passagem, todo o movimento altermundialista, mesmo com a predominância de uma sensibilidade anticapitalista, sobretudo na América Latina. É a razão pela qual o Fórum Social Mundial, precioso lugar de encontro – como explica tão bem nosso amigo Chico Whitaker – onde diferentes iniciativas podem fincar raízes, não pode se tornar um movimento sociopolítico estruturado, com uma “linha” comum, resoluções adotadas por maioria etc.

É importante sublinhar que a presença da ecologia no “movimento dos movimentos” não se limita às organizações ecológicas – Greenpeace, WWF, entre outras. Ela se torna cada vez mais uma dimensão levada em conta, na ação e reflexão, por diferentes movimentos sociais, camponeses, indígenas, feministas, religiosos (Teologia da Libertação).

Um exemplo impressionante dessa integração “orgânica” das questões ecológicas por outros movimentos é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que, com seus camaradas da rede internacional Via Campesina, é um dos pilares do Fórum Social Mundial e do movimento altermundialista. Hostil desde sua origem ao capitalismo e sua expressão rural, o agronegócio, o MST integrou cada vez mais a dimensão ecológica no seu combate por uma reforma agrária radical e um outro modelo de agricultura. Durante a celebração do vigésimo aniversário do movimento, no Rio de Janeiro em 2005, o documento dos organizadores declarava: nosso sonho de “um mundo igualitário, que socialize as riquezas materiais e culturais”, um novo caminho para a sociedade, “fundado na igualdade entre os seres humanos e nos princípios ecológicos”.

Isto se traduziu nas ações – por diversas vezes à margem da “legalidade” – do MST contra os OGMs, o que é tanto um combate contra a tentativa das multinacionais – Monsanto, Syngenta – de controlar totalmente as sementes, submetendo os camponeses à sua dominação, como uma luta contra um fator de poluição e contaminação incontrolável do campo. Assim, graças a uma ocupação “selvagem”, o MST obteve em 2006 a expropriação do campo de milho e soja transgênicos da Syngenta Seeds no Estado do Paraná, que se tornou o assentamento camponês Terra Livre. É preciso mencionar também seu enfrentamento às multinacionais de celulose que multiplicam, sobre centenas de milhares de hectares, verdadeiros “desertos verdes”, florestas de eucaliptos (monocultura) que secam todas as fontes d’água e destroem toda a biodiversidade. Esses combates são inseparáveis, para os quadros e ativistas do MST, de uma perspectiva anticapitalista radical.

As cooperativas agrícolas do MST desenvolvem, cada vez mais, uma agricultura biologicamente preocupada com a biodiversidade e com o meio ambiente em geral, constituindo assim exemplos concretos de uma forma de produção alternativa. Em julho de 2007, o MST e seus parceiros do movimento Via Campesina organizaram em Curitiba uma Jornada de Agroecologia, com a presença de centenas de delegados, engenheiros agrônomos, universitários e teólogos da libertação (Leonardo Boff, Frei Betto).

Naturalmente, essas experiências de luta não se limitam ao Brasil, sendo encontradas sob formas diferentes em muitos outros países, não apenas no Terceiro Mundo, constituindo-se numa parte significativa do arsenal combativo do altermundialismo e da nova cultura cosmopolítica da qual ele é um dos portadores.

O fracasso retumbante da Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, de dezembro de 2009, confirma mais uma vez, para quem ainda tinha dúvidas, a incapacidade de governos à serviço dos interesses do capital em enfrentar o problema. Em vez de um acordo internacional obrigatório, com reduções substanciais de emissões de gazes com efeito estufa nos países industrializados – um mínimo de 40% seria necessário – seguida de medidas mais modestas nos países emergentes (China, Índia, Brasil), os Estados Unidos impuseram, com o apoio da Europa e a cumplicidade da China, uma “declaração” completamente vazia, que faz senão reiterar o óbvio : precisamos impedir que a temperatura do planeta suba mais de 2°C.

A única esperança é o movimento social, altermundialista e ecológico, que se expressou em Copenhagen numa grande manifestação de rua – 100 mil pessoas – com o apoio de Evo Morales, cujas declarações anticapitalistas sem ambiguidades foram uma das poucas expressões criticas na conferencia “oficial”. Os manifestantes, assim como o Fórum alternativo KlimaForum, levantaram a palavra de ordem “Mudemos o sistema, não o clima!” Evo Morales convocou um encontro de governos progressistas e movimentos sociais em Cochabamba (abril de 2010) com o objetivo de organizar a luta para salvar a Mãe-Terra, a Pacha-Mama, da destruição capitalista.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Asalto a la flota humanitaria: Un ataque contra todos nosotros

Jonathan Cook
CounterPunch

Es bastante sorprendente que Israel haya logrado crear en las últimas 12 horas un bloqueo informativo, tal como hizo en su ataque contra Gaza hace 18 meses, en el cual nuestras principales organizaciones mediáticas han permitido de buen grado que los portavoces israelíes se manifiesten sin ser cuestionados.

¿Cuántos civiles resultaron muertos en el ataque al romper el alba contra la flotilla de ayuda en ruta hacia Gaza? Todavía no lo sabemos. ¿Cuántos heridos? Vete tú a saber. ¿Estaban armados los activistas de la ayuda? Sí, dice Israel. ¿Estaban confabulados con al-Qaida y Hamás? Ciertamente, dice Israel. ¿Actuaron razonablemente los soldados? Por cierto, corrían el riesgo de que los lincharan, dice Israel.

Si necesitáramos alguna evidencia del grado en el cual los periodistas televisivos occidentales no son otra cosa que estenógrafos del poder, la BBC, CNN y otros lo prueban ampliamente. Mark Regev, el propagandista en jefe de Israel, dispone de gran parte de las ondas para su propio uso.

Los pasajeros de los barcos, mientras tanto, han sido secuestrados por Israel y no pueden suministrar una versión alternativa de los acontecimientos. Podemos suponer que continuarán en un silencio forzado hasta que Israel esté seguro de que ha fijado la agenda noticiosa. De modo que, antes de que nos inunde la hasbara (propaganda) israelí, reiteremos unos pocos simples hechos:

Soldados israelíes invadieron esos barcos en aguas internacionales, violando el derecho internacional y, al matar civiles, cometieron un crimen de guerra. La afirmación contraria de que sus soldados respondieron a un inminente “linchamiento” por civiles, debe ser descartarse con el sonoro desprecio que se merece.

El Gobierno israelí aprobó el abordaje de los barcos de ayuda por una unidad de elite de comandos. Estaban armados con armas automáticas para controlar a los civiles a bordo, pero no con equipo de control de multitudes en caso de resistencia. Sean cuales sean las circunstancias de la confrontación, hay que responsabilizar a Israel por enviar soldados y poner en peligro temerariamente las vidas de todos los civiles a bordo, incluidos un bebé y un superviviente del Holocausto.

Israel no tiene derecho a controlar el mar de Gaza como sus propias aguas territoriales y a detener a convoyes de ayuda que lleguen por ese camino. Al hacerlo, demuestra que todavía mantiene una ocupación beligerante del enclave y de sus 1,5 millones de habitantes. Y si está ocupando Gaza, tiene la responsabilidad según el derecho internacional de velar por el bienestar de los habitantes de la Franja. Ya que el bloqueo ha impuesto a los palestinos de Gaza una dieta de hambre durante los últimos cuatro años, Israel debería haber estado hace tiempo en el banquillo de los acusados por cometer un crimen contra la humanidad.

Hoy Israel decidió dirigir su asalto mortal no sólo contra los palestinos bajo la ocupación, sino contra la propia comunidad internacional. ¿Terminará por hacer que nuestros dirigentes actúen?