domingo, 4 de setembro de 2011

A militarização da política no México



Luis Hernández Navarro
Carta Maior


O presidente mexicano Felipe Calderón fez da guerra contra o narcotráfico o eixo de seu governo. O combate ao crime organizado proporcionou a seu mandato uma via de legitimação que as urnas tinham negado. A militarização da política forneceu a ele as ferramentas para administrar o país com medidas de exceção. A politização da segurança pública facilitou a recomposição da cadeira de mando-obediência.

Da mesma maneira que o 11 de setembro de 2011 permitiu a George W. Bush tentar fazer da guerra o poder constituinte da nova ordem neoconservadora, a batalha contra os cartéis da droga possibilitou ao chefe do Executivo mexicano tratar de afiançar e perpetuar seu governo. Mas, ao invés de enviar tropas ao Iraque e ao Afeganistão, o mandatário mexicano retirou-as de seus quartéis para tomar posições dentro do território nacional.

O exército está nas ruas de muitas localidades do país, desempenhando funções que não correspondem às suas atribuições. Estabeleceu detenções, toques de recolher de fato e inspeções. Os comandos militares ocuparam os postos policiais. No que parece o ensaio geral do que se pensa fazer em vários estados do norte, em lugares como Ciudad Juárez e Chihuahua, vive-se uma situação muito próxima a de um estado de exceção não decretado pelo Congresso.

Seu antecessor, Vicente Fox, começou seu sexto ano de governo, em 2000, com uma festa popular. Felipe Calderón iniciou o seu, em 2006, com uma parada militar. Transcorreram quase cinco anos desde que o novo inquilino da casa presidencial assumiu o cargo e o que sobressai de seu mandato é sua predileção por uniformes militares, as fanfarras e os atos públicos com as Forças Armadas como tela de fundo.

No dia 3 de janeiro de 2007, em Apatzingán, no estado de Michoacán, onde nasceu, durante sua primeira atividade pública naquele ano, o chefe do Executivo se apresentou com um uniforme de campanha, com uma boina de cinco estrelas e o escudo nacional. Quatro meses mais tarde, no dia 8 de maio, também em Apatzingán, a foto era uma continuação da do dia 3 de janeiro: elementos do exército, utilizando veículos blindados e lança-granadas, se enfrentavam com supostos narcotraficantes.

No curto prazo, a politização da segurança pública proporcionou ao chefe do Executivo saldos positivos. As pesquisas apontam níveis de aceitação razoáveis, ainda que tenham caído sistematicamente nos últimos meses. As violentas manifestações de descontentamento social vistas em 2006 pararam de acontecer.

Entre as primeiras baixas da guerra que vivemos encontram-se os direitos humanos. O marco jurídico foi transformado a despeito deles. Na macabra conta de crimes, o assassinato de líderes sociais é mera contabilidade. A criminalização do protesto social avança a cada dia.

Não parece importar ao chefe do Executivo que, ao militarizar a política, a tenha desgastado e degradado. Não parece se preocupar, tampouco, que, em plena crise econômica, com a produção nacional estagnada, o desemprego crescendo e a válvula de escape da migração para os Estados Unidos, obstruída, suas margens de manobra se reduziram. A única saída que vislumbra é intensificar ainda mais essa guerra.

Em 2012, serão realizadas novamente eleições para a presidência da República. As pesquisas anunciam o regresso do Partido Revolucionário Institucional (PRI), que governou o México ao longo do século XX. Para evitá-lo, Felipe Calderón parece disposto a utilizar a guerra contra o narcotráfico como um fator eleitoral, procurando envolver importantes membros do PRI com o crime organizado.

Em 2006, ano em que se orquestrou a fraude eleitoral para impedir a chegada de Andrés Manuel López Obrador à presidência da República, o direitista PAN e os poderes econômicos não hesitaram em polarizar o país e leva-lo à beira do enfrentamento violento. Apesar do PRI não ser igual a López Obrador, a situação não tem por que ser distinta em 2012. Mais ainda se a rota traçada pela atual presidência é a de incrementar a presença dos militares nas ruas, mantê-los longe dos quarteis e colocá-los a fazer o trabalho de agentes civis. Nesta lógica, parece inevitável que a militarização da política no México prossiga e a violência cresça.

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