Le Monde diplomatique
As discussões que devem ocorrer na Rio+20 estão em um impasse. Um encontro no qual já confirmaram presença mais de cem chefes de Estado e que deveria anunciar ao mundo um novo pacto em defesa da sustentabilidade não vai mais fazê-lo.
Os governos dos países centrais do capitalismo não parecem dispostos a assumir metas de sustentabilidade e expressam, com isso, a oposição das grandes corporações a qualquer tipo de regulação internacional que prejudique seus interesses.
A Europa, com sua crise do sistema financeiro, que se espraiou para a economia e a política, não está disposta a discutir alternativas ao atual modelo de desenvolvimento e, por isso, não quer saber das questões ambientais. Angela Merkel já avisou que não vem. Os parlamentares europeus desistiram de vir alegando o alto preço dos hotéis...
Os Estados Unidos, às voltas com sua eleição presidencial, se opõem a qualquer medida, ou metas, que venham a inibir seu esforço de crescimento pautado pelo atual modelo de desenvolvimento. Obama também já avisou que não vem.
Se Europa e Estados Unidos juntos consomem cerca de 80% dos bens produzidos no planeta, discutir novos padrões de produção e consumo globais sem seu engajamento torna-se mais difícil. Mas eles não são os únicos que estão tentando contornar a questão central. Países como os Brics também não estão interessados em ir a fundo na análise das causas que nos levam a esta crise, que não é só ambiental. Então, a expectativa é baixa quanto ao que esperar da reunião entre governos.
As respostas dos governos não estão à altura dos desafios; eles falam da possibilidade de um “capitalismo verde”, capaz de combinar a lógica do lucro com a preservação ambiental. Ou melhor, buscam transformar a preservação ambiental numa fonte de lucro.
O quadro da situação pintado pelos cientistas, no entanto, parece não aceitar essa tentativa de reduzir a crise a uma dimensão preservacionista, mantendo tudo o mais como está. Eles alertam para catástrofes ambientais próximas. Alguns dizem que o estrago está feito, que eventos climáticos extremos já ocorrem, que devemos esperar por dias piores. Nesse cenário, o que nos resta como espaço de ação é apenas minimizar os prejuízos e nos prepararmos melhor para um futuro cada vez mais problemático.
Os diagnósticos variam, mas muitos estão concordes de que estamos trilhando um caminho sem volta, que no limite ameaça a existência da vida no planeta e a própria espécie humana. A curto prazo.
Mas se a questão é tão grave, por que então esses governos não a enfrentam? A resposta é simples: a crise é sistêmica – ela é simultaneamente financeira, ambiental, de segurança alimentar, de aprofundamento da exclusão e da pobreza etc. É uma crise do modelo capitalista de produção e consumo. Enfrentar a crise é enfrentar os interesses dos principais beneficiários do atual modelo, os atuais donos do poder.
Desde a crise financeira de 2007-2008 os governos vêm transferindo recursos públicos para o sistema financeiro privado e, para tanto, privando a cidadania de direitos. Há hoje uma percepção na sociedade de que os governos obedecem aos bancos, não aos eleitores. A democracia é desafiada pelo poder econômico.
E quando os parlamentos e governos da Grécia, da Espanha, da Itália, de Portugal e da França orientam suas políticas para a promoção de ajustes que jogam seus países em uma espiral descendente onde o horizonte é uma radical destituição de direitos, cresce a indignação na sociedade contra seus governos, as políticas de ajuste e o desmonte do Estado de bem-estar social.
A sociedade se mobiliza, ocupa as ruas e as praças, promove acampamentos, traz a política para o espaço público, questiona os governos, as políticas e as instituições. A sociedade indignada realiza grandes manifestações, sobretudo na Grécia, Irlanda, Espanha, Portugal, Itália. O mesmo acontece nos Estados Unidos, com o movimento Ocupar se espalhando por mais de cem cidades. Eles denunciam a apropriação da riqueza por 1% da sociedade, deixando pobres os 99% restantes.
Há por aí uma onda de indignação, é verdade. Mas falta muito para que esta se converta em força política. Sabemos que esses movimentos precisam passar a contar com o apoio das entidades e associações que representam interesses da sociedade civil, sensibilizar partidos e se expressar também eleitoralmente. A França parece ter conseguido isso com a eleição de um socialista que se posiciona contra as políticas de ajuste: François Hollande.
Daí a importância de iniciativas como o Fórum Social Mundial e a Cúpula dos Povos, que permitem o encontro e a troca entre os indignados de todo o planeta. Aí são criados espaços para a apresentação e debate daquilo que de melhor as sociedades vêm produzindo para a construção de uma sociedade sustentável.
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