quarta-feira, 8 de março de 2023

A origem do Dia Internacional da Mulher

Daniela Lima
Boitempo

Era perto do fim do expediente da tarde de sábado, 25 de março de 1911, quando uma nuvem de fumaça se espalhou pelos três andares superiores do Asch Building, em Nova York. Ouviu-se o som de estilhaço de vidro seguido de um forte estampido. As trabalhadoras da Triangle Shirtwaist Company, que ocupava o espaço, acreditavam que fossem fardos de tecido ou pedaços da fachada que se desprendiam do prédio consumido pelo fogo. Logo perceberam o horror absoluto: aquele estranho estampido vinha dos corpos de mulheres e meninas que se jogavam das janelas tentando escapar das chamas. Bombeiros tentavam inutilmente amparar a queda com redes de proteção que se rompiam pelo peso dos corpos. A fumaça e os gritos se alastravam por quarteirões, bombeiros desorientados direcionavam as mangueiras para os últimos andares do prédio tomado pelas chamas, mas a água só tinha pressão para atingir o sétimo andar do Asch Building. Em apenas 18 minutos, o incêndio transformou o oitavo, o nono e o décimo andar em escombros. Dentro do prédio, trabalhadoras se espremiam contra duas saídas de emergência – uma delas estava trancada.

Eu, junto com outras moças estava no vestiário do oitavo andar [da fábrica] […], às 4h40 em ponto, da tarde de sábado, 25 de março, quando ouvi alguém gritar: fogo! Larguei tudo e corri para a porta [de emergência] que estava trancada e, imediatamente, as meninas se amontoavam atrás dela. Os patrões mantinham todas as portas fechadas a chave o tempo todo por medo que as meninas pudessem roubar alguma coisa. Algumas meninas estavam gritando, outras esmurrando a porta com os punhos. (Depoimento de Rosey Safran)

 Os três pisos da Triangle Shirtwaist Company eram ocupados por 260 trabalhadores e 240 máquinas de costura amontoadas. As máquinas ordenadas em 16 fileiras, muito próximas, bloquearam os caminhos em direção às portas de emergência. A fábrica não respeitava princípios básicos de segurança e havia sido notificada diversas vezes pelo Departamento de Construção sobre as perigosas condições do prédio.

O Asch Building terminou de ser construído em 1901, tinha 41 metros de altura e a sua estrutura, o assoalho, a moldura das janelas e portas eram de madeira. [….] Dadas as suas dimensões, o imóvel deveria ter sido equipado com três escadas de acesso, mas tinha apenas duas […] que foram construídas tortuosas e estreitas. […] O artigo 80 da Legislação Trabalhista Estadual (State Labor Law) estabelecia que as portas das fábricas deveriam abrir para fora […] e que não podiam estar fechadas com chaves durante as horas de trabalho. No Asch Building, todas as portas abriam para dentro, devido à estreiteza dos corredores e escadas. […] O Departamento de Construção enviou uma carta aos proprietários da fábrica […] na qual denunciava as perigosas condições em que trabalhavam os operários, de quem nunca recebeu resposta.

No incêndio, morreram 146 trabalhadores, dos quais 17 eram homens e 129 eram mulheres e meninas – 90 delas se jogaram pelas janelas do prédio. A maioria das jovens era imigrante, tinha entre 16 a 24 anos e trabalhava em condições desumanas. Seus salários equivaliam a um terço do recebido pelos homens, enfrentavam jornadas de trabalho extenuantes e não tinham condições mínimas de segurança.

Isaac Harris e Max Blanck, proprietários da empresa e conhecidos por tratar trabalhadores como “dentes de uma engrenagem”, foram acusados de homicídio culposo. O júri composto unicamente por homens – na época mulheres não podiam ser juradas em Nova York – os inocentou de todas as acusações: “a defesa argumentou que não se poderia provar que eles tivessem mandados fechar as portas”. A palavra das sobreviventes, que afirmaram que os patrões trancavam as portas, de nada valeu.

Do lado de fora do tribunal, familiares, trabalhadores e ativistas gritavam: – assassinos! O som se espalhou pelas esquinas de Nova York e 300 mil pessoas foram às ruas debaixo de chuva para um funeral simbólico. A pergunta era: de quem é a responsabilidade? Dos inspetores de construção que permitiram escadas de incêndio inadequadas? Dos políticos que não exigiram normas de segurança? Ou dos proprietários que ignoraram as recomendações da fiscalização em nome do lucro? Ou de todos eles que tratavam operárias, sobretudo as imigrantes, como cidadãs de terceira classe?


A relação entre a Greve Geral e o incêndio

A história do incêndio foi contada e recontada várias vezes e ao longo do tempo alguns fatos acabaram se embaralhando: na versão comumente repetida, as trabalhadoras estariam ocupando a Triangle Shirtwaist Company durante uma greve e os patrões teriam trancado as saídas e ateado fogo na fábrica. No entanto, os relatos das sobreviventes dão conta de que não havia greve naquele momento. Uma das maiores greves da indústria têxtil de Nova York aconteceu de setembro de 1909 até fevereiro de 1910 – cerca de um ano antes do incêndio. As trabalhadoras da Triangle foram as primeiras a parar, produzindo um efeito dominó até a deflagração da greve geral, conhecida como “o levante das 30 mil”. Foi a primeira grande greve de mulheres no país, numa época em que nem mesmo o direito ao voto havia sido conquistado.

No documentário Triangle – Remembering The Fire, Katharine Weber conta que sua avó, Pauline Gottesfeld Kaufman, trabalhadora da Triangle, foi brutalmente atacada pela polícia e por pessoas pagas para ‘desfazer’ a greve: “minha avó me falou de um guarda que tentou prendê-la ou agarrá-la. Ela se envolveu numa luta corporal com ele e conseguiu fugir. Quando parou e olhou para a própria mão, viu que arrancou um tufo de cabelo dele e ainda o segurava. Muitas mulheres foram presas acusadas de perturbar a ordem pública”.

Em novembro de 1909, na assembleia do sindicato das empresas Cooper, Clara Lemlich, trabalhadora presa pela polícia sete vezes por agitação, fez um discurso que marcou a história do movimento sindical nova-iorquino: “sou operária, uma dessas que estão em greve contra condições intoleráveis de trabalho. Estou cansada de ouvir oradores. […] Estamos aqui é para decidir se entraremos ou não em greve. Apresento uma resolução a favor da greve geral já”.

No setor têxtil, as mulheres constituíam a maior parte da mão de obra. As condições em que trabalhavam eram deploráveis. […] A paralisação começou no dia 27 de setembro de 1909, precisamente na Triangle Shirtwaist Company. […] Os trabalhadores demandavam salários mais altos, melhorias nas condições de trabalho, abolição do sistema de subcontratação, jornada de trabalho de 52 horas semanais e, sobretudo, o reconhecimento de seus direitos sindicais.

As jovens da Triangle eram consideradas um problema pelos poderosos empresários do Lower East Side. Portanto, não é possível afirmar que não existam conexões entre o incêndio e a greve, ainda que a versão oficial diga que o fogo foi provocado por um trabalhador que teria jogado um cigarro aceso próximo de rolos de tecido que se acumulavam no oitavo andar do prédio. Fica evidente que o aparato jurídico, cujas leis beneficiavam os empresários, responsabilizaram os próprios operários por sua morte.

Quando a greve foi encerrada, mais de trezentos patrões tinham feito acordo com os trabalhadores – no entanto, treze empresas, incluindo a Triangle, não chegaram a nenhum acordo: “se tivessem aceitado as reivindicações dos grevistas, o incêndio que ocorreu no ano seguinte provavelmente não teria acontecido”.

Em consequência do incêndio, foi criada a Comissão de Investigação das Fábricas, que passou a avaliar o risco em inúmeros estabelecimentos. Frances Perkins, que se tornaria a primeira Secretária do Trabalho, fez parte da comissão – ela estava na Washigton Square no dia do incêndio e viu as jovens pulando das janelas do prédio de mãos dadas e abraçadas. Os dados apurados pela Comissão levaram à promulgação de leis em Nova York que regulavam normas de segurança, salário mínimo, assistência aos operários desempregados e assistência aos velhos demais para trabalhar.


Dia Internacional das Mulheres: mito fundador e sequestro de significado

O incêndio da Triangle Shirtwaist Company marcou de forma indelével o mês de março como um momento de se interrogar o passado para retomar o presente de forma crítica. Interrogar não apenas a história das mulheres operárias do início do século XX, mas de todas as mulheres que vieram antes de nós. A história do Dia internacional das Mulheres atravessa o movimento das mulheres operárias norte-americanas, que comemoravam em diversos Estados o Woman’s Day, desde 1908, pelo esforço do movimento de mulheres socialistas para internacionalizar a data, em 1910, e por diversos acontecimentos que marcaram a história da luta das mulheres em diferentes partes do mundo. Nenhuma dessas histórias pode ser apagada.

Quando Clara Zetkin propôs, na Segunda Conferência Internacional da Mulher Socialista, realizada em 1910, um dia internacional dedicado à reivindicação dos direitos das mulheres, ainda não havia uma dia definido, mas a intenção de unificar uma data para celebrar a solidariedade internacional na luta pelos objetivos comuns: "As mulheres socialistas de todas as nacionalidades organizarão em seus respectivos países um dia especial das mulheres […]. Será necessário debater essa proposição com relação à questão da mulher a partir da perspectiva socialista".

Entre 1911 e 1914, o Dia Internacional das Mulheres foi comemorado em datas diferentes do mês março. Apenas em 8 de março de 1917, com a deflagração da greve das tecelãs de São Petersburgo que impulsionou a Revolução Russa, esta data foi consagrada como o Dia Internacional das Mulheres. No entanto, organizações internacionais – como a ONU e a UNESCO – demoraram mais de 50 anos para reconhecer a data, e só o fizeram por pressão e insistência dos movimentos feministas.

Relembrar os caminhos que levaram a instituição dessa data é um modo resistir. Hoje, é importante impedir que o conteúdo emancipatório desta data seja substituído por um significado edulcorante e conveniente ao sistema capitalista. O capitalismo não age sobre os movimentos emancipatórios unicamente com a intenção de eliminá-los: pretende sempre incorporá-los, esvaziá-los de significado e potência revolucionária para transformá-los em produto.

De uma perspectiva histórica, fica evidente o sequestro de significado e o apagamento ostensivo da história do Dia Internacional das Mulheres. Um dia que, nas palavras de Alexandra Kollontai, deveria ser de “consciência política e de solidariedade internacional” vem se tornando uma data comercial em que o mercado ‘celebra’ estereótipos de gênero que determinaram e limitaram a vida das mulheres.

É preciso escavar os escombros que parecem se fechar sobre a história das mulheres que lutaram pelo dia 8 de março, impedir tentativas de apagamento de seus rastros e de seus nomes. Retomar o significado político da história do Dia Internacional das Mulheres é uma importante ferramenta contra as fogueiras materiais e simbólicas que continuam acesas.

terça-feira, 7 de março de 2023

El asesinato de Marielle Franco continúa en la impunidad


Fernando de la Cuadra
Socialismo y Democracia

El próximo 14 de marzo se cumplen 5 años de uno de los crímenes políticos más brutales desde la redemocratización del país. Ese día fueron cobardemente asesinados la concejala socialista Marielle Franco y su chofer Anderson Gomes en una emboscada perpetrada por dos miembros de la Policía Militar del Estado de Rio de Janeiro, que operaban como sicarios de una organización criminal de milicianos con sede en Rio das Pedras conocida como “Escritorio del crimen”. Los dos matadores, Ronnie Lessa y Élcio Vieira de Queiroz, siguen presos a la espera del juicio que será realizado con la participación de un jurado popular.

Desde esa fecha, ni los investigadores policiales ni la justicia brasileña han conseguido aclarar la siguiente pregunta: ¿Quién mandó matar a Marielle Franco y por qué? A pesar de que está demostrado el fuerte vínculo que existe entre estos dos ejecutores con la familia Bolsonaro, hasta ahora la Policía Federal y la justicia no han podido recoger las pruebas necesarias y suficientes que permitan conocer quiénes son los mandantes del crimen ni establecer fehacientemente la participación del Clan Bolsonaro en la planificación y financiamiento del asesinato.

En parte, ello se debe a un conjunto de obstáculos que se han interpuesto durante toda la gestión del ex capitán (2019-2022) para que los investigadores puedan efectuar su tarea de la manera más acuciosa y detallada posible, con el objetivo de conocer los motivos de los mandantes y la cadena de responsables que existen hasta que se consumó la ejecución del crimen. En estos cinco años, las pesquisas avanzaron a un ritmo extraordinariamente lento y aparte de los dos acusados por haber realizado el asesinato, no existen más personas siendo procesadas. Sin embargo, hoy se sabe positivamente que quienes realizaron este “servicio” estaban obedeciendo órdenes de miembros de una estructura superior que decidió eliminar a la concejala.

El actual Ministro de Justicia, Flavio Dino, declaró recientemente que “existen muchos indicios de que los ejecutores no actuaron solos. Por eso, es muy importante retomar y concluir las investigaciones para que haya Justicia plena y también para que todos entiendan que las discrepancias políticas se resuelven en el voto y no a balas, como algunos infelizmente creían y todavía creen”.

El crimen de Marielle Franco representa un caso emblemático de asesinato político. Su muerte impactó no sólo a sus electores de Rio Janeiro, como a todo el país y hasta una buena parte del planeta que tuvo conocimiento de esta barbaridad cometida contra una mujer negra, feminista, luchadora incansable por los derechos humanos de las poblaciones más pobres y vulnerables que habitan en las áreas periféricas de esa ciudad. Desde que fue electa en 2016, Marielle Franco tuvo una actuación destacada en la defensa de la población pobre, negra y LGBTQIA+ que vive en las comunidades y barrios de la Baixada Fluminense.

Ella era una figura en ascensión en el mundo de la política, muy carismática y querida en los territorios donde actuaba. Por lo mismo, se proyectaba con mucha fuerza como una gran líder estadual, que la podría haber llevado a disputar con propiedad un cargo como senadora o inclusive como gobernadora de Rio. No solamente realizaba una labor extraordinaria entre sus electores, sino que también se fue transformando en una referencia nacional entre todos aquellos que eran y siguen siendo objeto de discriminación y violencia desmedida por parte de las fuerzas policiales y las milicias.

Los casos de asesinatos sumarios o de masacres perpetradas por parte de las diversas policías (Federal, Civil, Militar, Rodoviaria) se acumulan por decenas a través de los años. El 6 de mayo de 2021, una tropa de la policía civil de Río de Janeiro entró en la comunidad de Jacarezinho y mató, sin derecho a juicio ni amparo, a 27 personas, todos hombres jóvenes, negros y pobres. La mayoría de estas personas fue ejecutada sumariamente, con disparos en la nuca después de haberse rendido.

Algunos casos tienen mayor cobertura periodística, como fue el desaparecimiento en julio del 2013 de Amarildo de Souza desde el interior de una Unidad de la Policía Pacificadora (UPP) en la favela de la Rocinha o el más reciente asesinato de un conductor de motocicleta en Sergipe, Genivaldo Jesús dos Santos, quien fue asfixiado por gas lacrimógeno liberado dentro del portaequipaje del furgón de la Policía Rodoviaria Federal (PRF), cuando ya se encontraba esposado dentro del vehículo. El asesinato de Genivaldo impactó a todos por la crueldad infringida contra un prisionero totalmente reducido, sin medios de protección y por el cinismo de los policiales que negaron hasta último momento el uso de gas para asfixiarlo, lo cual fue desmentido posteriormente por las cámaras que filmaron toda la acción criminal de esos miembros de la PRF.


Si Marielle estuviera viva, ciertamente estaría en la línea de frente denunciando estos crímenes bárbaros y los intentos del poder público de ocultar muchos de esos asesinatos. En su disertación del Magister en Administración Pública (UPP: la reducción de la favela a tres letras: un análisis de la política de seguridad pública del Estado de Rio de Janeiro), Marielle ya mostraba con mucho rigor teórico y abundante información, la política de exterminio practicada por el Estado brasileño en contra de comunidades vulnerables, antes y después de la instalación de las UPPs en 38 favelas del estado de Rio. En una parte de sus conclusiones Marielle advertía que “en el campo de la seguridad pública, se presenta la necesidad de alterar el modelo sustentado en la policía por uno sustentado en otra práctica, con relación al espacio público, con una nueva visión de la ciudad basada en los derechos y en las personas”.

Ciertamente, esta visión y las acciones desplegadas por Marielle en el mundo popular, incomodaron a muchos policiales, milicianos, traficantes y agentes del Estado cómplices de la criminalidad en dichos espacios, incluida la familia Bolsonaro que hasta ahora mantiene estrechos vínculos con facciones de milicianos que controlan gran parte del territorio de Rio de Janeiro.

Es emblemático en este sentido, que uno de los seguidores más incondicionales de Jair Bolsonaro, el ex diputado Daniel Silveira , utilizó una foto bestial en su campaña. En dicha imagen -que se hizo viral posteriormente- se puede ver a Daniel Silveira junto a otro candidato a diputado (Rodrigo Amorim) destruyendo una placa en homenaje a Marielle Franco ante cientos de personas que lo vitoreaban.

Lo anterior no hace más que confirmar el odio que genera entre la ultra derecha, las policías, los narcotraficantes y las milicias, el papel desempeñado por Marielle y otros activistas como ella en el resguardo de las comunidades pobres de Rio de Janeiro. Estos delincuentes consiguieron capitalizar el miedo de muchos electores de zonas ocupadas por el narco o las milicias para elegirse diputados o senadores en las elecciones de octubre de 2018, empujados también por la onda creciente del bolsonarismo. En ese sentido, el crimen de Marielle Franco fue uno de los elementos que hacía presagiar la emergencia de una extrema derecha radical asociada con las actividades ilegales en el país.

Existe un proverbio que nos recuerda que “la justicia tarda, pero llega” y, en este caso, ello no ha sucedido hasta ahora. Después de cinco años en la impunidad, los mandantes de este crimen cobarde se mantienen en el anonimato. Quizás estemos cada vez más cerca de conocer la verdad sobre dicho atentado, a la luz de todos los elementos probatorios que se han ido acumulando a lo largo de este periodo de investigaciones y porque actualmente existe una mayor voluntad por parte del Ejecutivo para aclarar las diversas aristas del asesinato, descubrir a sus mandantes y a sus financiadores. De ello va a depender la credibilidad que pueda recuperar (aunque sea un poco) el cuestionado sistema policial y judicial brasileño.

quarta-feira, 1 de março de 2023

Los supermillonarios, una plaga climática

Renán Vega Cantor
El Colectivo

La tierra no está muriendo. La están matando y quienes la están matando tienen nombres y direcciones”.
(Utah Philips [1935-2008] cantante y activista político y sindical de Estados Unidos)


El calentamiento global genera sequias prolongadas, inviernos más fríos, huracanes más frecuentes y destructivos, incendios incontrolables y causa la enfermedad y muerte de millones de pobres en el mundo entero. En los medios de desinformación cuando se tratan de explicar las razones que generan las brutales modificaciones climáticas se suele decir que todos los seres humanos somos responsables de lo que está sucediendo y, para justificarlo, ciertos científicos acuñaron la noción de antropoceno.

En esta concepción se muestra un mundo en el que predominaría la igualdad social y económica y, por lo mismo, a cada uno de los habitantes de la tierra se le asigna la misma cuota de responsabilidad en la generación de gases de efecto invernadero [GEI] y en el calentamiento del mundo.

Esta falacia acaba de ser desmentida por una investigación de la ONG Oxfam Internacional sobre el impacto climático de los supermillonarios y cuya conclusión principal indica que 125 de estos personajes (capitalistas de carne y hueso, con nombre propio, algo así como la personificación del capital), genera en total al año 393 millones de toneladas de CO2. El estudio analiza la variable consumo, sobre la que señala que los ricos utilizan jets y yates privados para desplazarse de un lugar a otro, con lo que gastan una gran cantidad de combustibles fósiles y generan enormes cantidades de CO2 y otros gases contaminantes a la atmosfera.

Por ejemplo, Bill Gates, quien presume de combatir el cambio climático, en el 2017 realizó 59 vuelos, cubriendo una distancia de 343 mil kilómetros, lo que equivale a dar ocho veces la vuelta al mundo. En estos vuelos de “placer y de trabajo” Bill Gates generó 1.600 toneladas de GEI, lo cual es igual al gasto promedio anual de 105 ciudadanos de los Estados Unidos y al de 1.140 pobres del mundo. Por su parte, Jeff Bezos, dueño de Amazon, emitió en su vuelo al espacio de 11 minutos 75 toneladas de CO2, una cifra similar a la que gasta en toda su vida un habitante humilde de este planeta.

En general, en 2018 las emisiones de GEI de 20 multimillonarios, como resultado de utilizar yates, aviones, helicópteros y habitar en hoteles y mansiones de lujo, fueron de 8.124 toneladas por persona, cuando un pobre emite 1.4 de toneladas al año. La variable consumo es un aspecto de la desigualdad social, pero no es la causa, es el resultado del capitalismo. Aunque la investigación de Oxfam no lo nombra, en su análisis sobre el impacto de carbono de los ricos se remite a la producción, asunto en que presenta los más reveladores resultados.

Considerando las empresas de esos superricos, cada uno de los primeros 125 emite 3.1 millones de toneladas de CO2, es decir, un millón de veces más de lo que emite el 90 por ciento más pobre de la humanidad. Para establecer esta cifra se ha medido la huella de carbono de las empresas que son propiedad de los supermillonarios, o de las que son accionistas.

En forma precisa se establece el ranking de la contaminación por parte de los dueños del planeta. En el listado se encuentran los siguientes datos en generación de toneladas de CO2: Carlos Slim, 7 millones; Warren Buffett, 3,5 millones; Bill Gates, 4,8 millones; Jim Walton, de Walmart, 2,1 millones de toneladas; y Alice Walton, de la misma cadena, 2,2 millones.

La conclusión del estudio es clara: El 1 % más rico de los habitantes de la tierra es responsable de un poco más del doble de la contaminación generada por carbono que la producida por 3.100 millones de personas, las que hacen parte de la mitad más pobre de la humanidad. Esto ha sucedido en los últimos 25 años, el mismo período en que las emisiones de GEI se incrementaron de manera exponencial, en la medida en que el capitalismo se expandió por el planeta entero. Esto indica que, a nivel climático, se proyecta la desigualdad social y la estructura de clases de la sociedad capitalista, en donde una exigua minoría que disfruta de extraordinaria riqueza es la directamente responsable de achicharrar el planeta.

En estas circunstancias, para la estabilidad climática del mundo, una condición indispensable para la supervivencia de gran parte de la humanidad, los ricos son una auténtica plaga. Están devorando literalmente el planeta y alteran de tal forma el clima que esos ricos pueden considerarse como el quinto jinete del Apocalipsis el cual, junto con los otros cuatro, cabalga en unos briosos caballos con los que viene en forma garantizada el hambre, la muerte, la violencia, las epidemias y la destrucción. Son una élite contaminante, que necesita del carbono para mantener su infernal estilo de vida y muerte y con ello arrastran al resto de la humanidad a la hecatombe climática.

Deberían extraerse las conclusiones políticas de estos hallazgos para romper con la mirada cándida y liberal que dice a los cuatro vientos que todos somos responsables del vuelco climático, porque está claro que el responsable es el capitalismo, personificado en sus grandes supermillonarios.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

Las múltiples tragedias de Brasil


Fernando de la Cuadra
Socialismo y Democracia

 “La nuestra es esencialmente una época trágica,
así que nos negamos a tomarla por lo trágico”.

D. H. Lawrence, El amante de Lady Chatterley


Mientras una gran parte del país se encontraba festejando el Carnaval, en el litoral norte del Estado de Sao Paulo (Sao Sebastiao, Ubatuba y Bertioga), se produjo el mayor temporal de lluvia conocido en la historia de esa región, con fatales consecuencias sobre las comunidades que allí habitan. Hasta ahora se han contabilizado más de sesenta fallecidos y decenas de desaparecidos.

Dicho territorio es conocido por su vulnerabilidad a situaciones de intensa pluviosidad, porque la evaporación que se genera en el océano es bloqueada por la sierra que se encuentra pegada al litoral, lo cual implica que las precipitaciones se produzcan en esa misma zona costera. Según datos de Centro Nacional de Previsión y Monitoreo de Desastres Naturales (Cemaden), en la región llovió en 24 horas lo que regularmente llueve durante 2 meses, por eso se produjeron enormes deslizamientos y derrumbes de tierra y árboles que sepultaron barrios completos de esa parte del litoral brasileño, conocido como “Costa Verde”.

El propio Cemaden junto con el Instituto Brasileño de Geografía y Estadísticas (IBGE) ya realizaron un levantamiento de áreas de riesgo e identificaron que en el país existen 27.660 locales que están expuestos a posibles derrumbes e inundaciones, en los cuales habitan actualmente más de diez millones de personas. Por lo mismo, la emergencia de catástrofes de este tipo es un fenómeno esperable en cualquier época del año, en un país que posee 8,5 millones de kilómetros cuadrados y que desde hace muchos años no tiene una política activa de prevención y contención de desastres naturales.

A esta altura, podemos tener la certeza de que Brasil es un país expuesto permanentemente a la ocurrencia de tragedias. Esta última catástrofe producida es una más que se viene a sumar a las innumerables desgracias humanitarias, sanitarias, sociales, políticas, económicas y ambientales que se ciernen sobre esta nación.

No se puede pensar sino como tragedia la situación en la que se encuentran muchos pueblos originarios que habitan en la selva Amazónica o en otros territorios. Especialmente dramática son las informaciones que se han recabado sobre las muertes por desnutrición de cientos de miembros de la etnia Yanomami, los que venían siendo reprimidos y violentados por grupos de buscadores de oro en el Estado de Roraima, así como de otros explotadores de bosques y ríos asentados en esa región.

La postura genocida del gobierno de Bolsonaro, les otorgó carta blanca a millares de garimpeiros, grileiros, madereros y pescadores ilegales que nunca creyeron en las leyes y que, por lo tanto, actuaban totalmente fuera de las reglas constitucionales. Para estos contraventores la figura de Bolsonaro representaba el liderazgo y el sustento ideal para cometer todo tipo de infracciones.

Actualmente, se sabe que niños, jóvenes y adultos Yanomami fallecieron a consecuencia de la desnutrición y de los malos tratos causados por estas hordas de delincuentes que se amparaban en la omisión o la complicidad directa de los funcionarios del gobierno para cometer sus crímenes. Un informe de la Asociación Yanomami Hutukara, que coordina acciones a favor de dicho pueblo, elaboró un informe en el cual se señala que en los últimos 4 años murieron más de 570 niños debido a problemas de desnutrición, malaria, disentería, verminosis y otras enfermedades transmitidas principalmente por los garimpeiros.

 Ellos han invadido las tierras indígenas demarcadas en los gobiernos anteriores, impactando con la explotación del garimpo ilegal más de cuatro mil hectáreas de tierras de la reserva y construyendo 50 pistas clandestinas que estaban al servicio de garimpeiros y narcotraficantes. El actual gobierno ha comenzado a deshacer estas pistas clandestinas, así como viene desmontando los numerosos campamentos instalados en territorio Yanomami, destruyendo simultáneamente la infraestructura y quemando la maquinaria utilizada para la extracción de oro y casiterita (estaño).

La visita del presidente Lula permitió que la prensa mostrara para el conjunto de la opinión pública las condiciones de abandono y miseria en las cuales se encontraba el pueblo Yanomami durante el gobierno Bolsonaro. Aunque ya se sabía que dicha situación de calamidad no es nueva y que hace muchos años atrás Davi Kopenawa, el líder Yanomami, denunciaba lo que ocurría en tales comunidades: “Es posible que ustedes hayan escuchado hablar de nosotros. Pero no saben quiénes somos realmente. Ustedes no conocen nuestra floresta y nuestras casas. No comprenden nuestras palabras. Así, era posible que acabásemos muriendo sin que ustedes lo supiesen”. No es una profecía, es lo que se esperaba sucediera por el propio curso de los acontecimientos.

En un país marcado por la estructura socioeconómica y cultural esclavista, las formas contemporáneas de esta práctica aparecen constantemente a través de todo el país. En el año 2022 fueron rescatadas 1937 personas que se encontraban en situación similar a la esclavitud, según informaciones divulgadas por el Ministerio del Trabajo. En total fueron 443 acciones desplegadas a partir de denuncias recibidas en los 26 Estados de la Federación y el Distrito Federal. Desde 1995, cuando Brasil tuvo que reconocer ante la Organización Internacional del Trabajo (OIT) la persistencia de formas esclavistas en su territorio, y hasta fines del año pasado, más de 57 mil personas fueron liberadas del trabajo esclavo.

La semana pasada fueron rescatados 192 trabajadores que vivían en situación análoga a la esclavitud en la región vitivinícola de Bento Goncalves. Los trabajadores eran contratados por empresas tercerizadas de tres vitivinícolas y fueron encontrados por los fiscales del Ministerio del Trabajo viviendo en pésimas condiciones higiénicas, en barracas que no tenían saneamiento básico, con alimentos podridos y cumpliendo jornadas extremamente exhaustivas, con horarios que llegaban hasta 15 horas laborales diarias. Además, eran despertados por lo capataces con pistolas que daban choques eléctricos.

Junto al trabajo esclavo, el trabajo infantil es otra de las tragedias que aquejan a Brasil. En el año 2021, una investigación realizada en base a datos proporcionados por el IBGE mostró que cerca de 1.3 millones de adolescentes se encontraban en situación de trabajo infantil. De esos adolescentes entre 14 y 17 años incorporados al mercado de trabajo, un 86 por ciento se podían definir como trabajo infantil. Y entre ellos, un número importante de jóvenes realizaba actividades consideradas dañinas para la salud y el adecuado desarrollo de sus vidas.

Las tragedias socioambientales también forman parte de esta extensa lista de catástrofes provocadas por la indolencia o negligencia de las empresas para asumir las consecuencias ambientales de sus “emprendimientos”. El accidente de una represa ubicada en la región de Mariana (Minas Gerais) es uno de los desastres ambientales más grandes que se han conocido en la historia del planeta. La ruptura de la estructura de la represa provocó el derrame de 62 millones de metros cúbicos de barro y residuos minerales sobre la cuenca del Rio Doce, devastando todo a su paso por más de ochenta kilómetros rio abajo, alcanzando a decenas de municipios ubicados en los Estados de Minas Gerais y Espíritu Santo.

Además de costar la vida de 19 personas, el desastre de Mariana provocó alteraciones significativas en la calidad del agua, causando la mortandad de miles de animales terrestres y acuáticos. Junto con ello, diversas especies de vegetación fueron impactadas debido a la contaminación de la tierra y el agua por altas concentraciones de hierro y de mercurio, como fue constatado posteriormente a través de muestras recogidas en los lugares afectados.

Hasta ahora resulta imprevisible la capacidad de recuperación de los ecosistemas alcanzados y los valores de las multas que ha debido pagar la empresa propietaria de la represa ciertamente no alcanzarán para reponer el daño causado a las personas fallecidas, a los habitantes del entorno y a la naturaleza. Este es uno más de los desastres socioambientales que pudo haberse evitado si la gestión de las empresas fuese más responsable y orientada a preservar el hábitat donde efectúan sus operaciones.

Por último, aunque no menos importante, se pueden relatar las tragedias humanitarias con relación a la actuación de la Policía en las comunidades más pobres o favelas, con una larga lista de masacres cometidas por los agentes de la ley. Estas matanzas cada cierto tiempo aparecen en los noticiarios, pero luego quedan relegadas al olvido por la emergencia de un nuevo exterminio tanto o más impactante que el anterior. Como escribí en otra oportunidad, “existe escasa regulación sobre el comportamiento abusivo de los organismos encargados de velar por la Seguridad Ciudadana, transformándose en una especie de cuerpo autonomizado del brazo represivo del Estado, con poco o ningún control por parte de las instituciones que conformarían el llamado Estado Democrático de Derecho”. (La banalización de la muerte y la masacre de los pobres).

Podríamos seguir enumerando las tragedias de diverso tipo, el asesinato sumario de cientos de personas que residen en las zonas más pobres, las catástrofes ambientales que han azotado al país en los últimos años, las quemadas de los bosques y la devastación de la región amazónica con su rastro de muerte y desolación, las incontables tragedias cotidianas de los habitantes de Brasil, de esos 33 millones de personas que se encuentran pasando hambre o de quienes no tienen trabajo y ni siquiera poseen la perspectiva de tener algún empleo digno en un futuro cercano. Esas tragedias -muchas de ellas previsibles- deberán ser encaradas con urgencia por el actual gobierno de reconstrucción nacional.

En dos meses de mandato se ha expresado la enorme voluntad de transformar la herencia deshumana y genocida de la gestión anterior, aunque el pacto democrático que encabeza el Presidente Lula deberá seguir desmontando los entrabes que fueron instalados por la extrema derecha bolsonarista y sus cuadros incrustados en la organización burocrática gubernamental. Y también deberá luchar cotidianamente para que sus aliados de última hora en el pacto de gobernabilidad no traicionen el programa de cambios indispensables que le fue prometido a los ciudadanos. De ello depende el futuro de la democracia brasileña y el bienestar del pueblo que habita en este territorio que, parafraseando a Stefan Zweig, continúa siendo el eterno “país del futuro”.

domingo, 19 de fevereiro de 2023

El espíritu revolucionario de Frantz Fanon sigue vivo

Raj Patel
New Frame

Una nueva colección de ensayos utiliza los trabajos del psiquiatra y filósofo político radical para explorar cómo el lenguaje y la capacidad de pensamiento e ingenio de una comunidad amenazan al Estado.

¿Qué puede ofrecer un psiquiatra que murió hace 60 años a la lucha de la clase trabajadora en el siglo XXI? Fanon Today : Reason and Revolt of the Wretched of the Earth de Nigel Gibson, un volumen editado con colaboradores de Siria y Pakistán a Palestina y Sudáfrica, sugiere una respuesta: sanación revolucionaria.

Completado durante la pandemia con su consiguiente amplificación de la inequidad y el trauma para los empobrecidos, este libro es un producto del momento, y en 551 páginas, sin escatimar en su cobertura. Aunque está organizado en tres secciones, Fanonian Militants, Still Fanon y Fanonian Practices, la tipología no es rígida. Los sitios en los que Fanon sigue siendo relevante son geográficamente diversos, pero una de las características unificadoras es que no importa dónde se mire, el espacio fanoniano es uno de poder comunitario en desarrollo contra el Estado. Por esa razón, las comunidades también se cercan con frecuencia para contener la amenaza y luego se les llena de plomo para eliminarla.

Consideremos, en primer lugar, el cercado de la inteligencia. Wangui Kimari comienza su capítulo con las observaciones de Fanon sobre la geografía: “El mundo colonizado es un mundo dividido en dos. La línea divisoria, la frontera, está representada por los cuarteles y las comisarías”. El excelente capítulo de Toussaint Losier sobre la relevancia de Fanon en las prisiones de los Estados Unidos observa que no es la ocupación del espacio lo que es la revolución, sino la conciencia revolucionaria que emerge dialécticamente de la ocupación de ese espacio.

El pensamiento que surge de los proyectos revolucionarios fanonianos es contrahegemónico y, por lo tanto, una amenaza muy real para el poder estatal. Frantz Fanon diagnosticó el proyecto colonial francés en Argelia como un intento de “descerebrizar” al pueblo, como nos recuerda Gibson en su destacado capítulo. Cuando las comunidades se involucran en el análisis científico de sus circunstancias y responden con arte, radio y política, la gente rechaza el colonialismo. En Bairro Alto, Lisboa, la poesía lírica y las batallas de hip-hop están criminalizadas. En Los Ángeles, la policía estaba aterrorizada por la tregua negociada por las pandillas en Watts en 1992. Cuando las pandillas depusieron las armas, la policía llenó el vacío con sus propios disparos, una señal del pánico que el reconocimiento del poder comunitario generó en el Estado.

Para los lectores que esperan leer Fanon sobre la violencia, Fanon Today deja en claro que ha habido un cambio desde que Fanon publicó por primera vez los Condenados de la Tierra en 1961. En el siglo XXI, el proyecto de descolonización en curso se contrarresta con violencia, no con tropas coloniales. , sino por fuerzas internas, ya sean fuerzas del orden o milicias. La policía es una amenaza constante. Mientras apuntan con sus armas a los cuerpos de los militantes, el objetivo final es la capacidad de pensamiento, inteligencia e ingenio de las comunidades. Las fuerzas burguesas poscoloniales responden con políticas públicas precoloniales, ofreciendo sacrificios de sangre para salvar su cuerpo político.

Quienes luchan por la justicia han sido blanco sistemático de masacres policiales. Desde asentamientos de chabolas en Durban hasta guetos en Los Ángeles, la violencia policial se lleva a cabo como un ejercicio para enseñar a los empobrecidos que no pueden ni deben tratar de pensar por sí mismos. En Cova de Moura en Amadora, Portugal, un espacio ocupado por inmigrantes principalmente de Cabo Verde, los trabajadores traídos para construir un puente que el dictador António de Oliveira Salazar nombró por sí mismo fueron acorralados por alambradas y caminos, y la policía disparó 54 veces a un residente.


Trauma global

Pero no es necesario que las balas se disparen constantemente para que sean la fuente de un trauma permanente. La amenaza de la violencia estatal es tan real como la degradación crónica y las señales del encierro. Tanto Fanon el psiquiatra como Fanon el revolucionario interpretan y luego sanar de la violencia del colonialismo.

El capítulo de Samah Jabr y Elizabeth Berger es un himno a la deuda que los trabajadores de salud mental de todo el Sur Global tienen con Fanon cuando señaló el trauma colonial y sus complejos. Aquellos que sobreviven a la confrontación con el estado colonial a menudo se ven destrozados psicológicamente por un trauma que solo terminará con el fin de la ocupación. Este trauma es global y se agudiza por la experiencia de la negritud, pero la crítica del colorismo de Razan Ghazzawi complica la idea de que el blanco y el negro son categorías simples. Esto es especialmente cierto cuando las políticas de clase y de género influyen en la experiencia vivida de los militantes en el frente. Fanon habría tenido poco tiempo para la política de autenticidad.

Fanon, el médico, comprendió que la violencia de la lucha colonial se manifiesta de muchas formas diferentes. Las comunidades indígenas tienen más probabilidades de morir, y morir por diabetes, homicidio y suicidio, que los colonos en sus países. El capítulo de Léa Tosold, que ubica a Fanon en las luchas del pueblo munduruku en la Amazonía y que incluye un análisis de la praxis de la autodemarcación del territorio a pesar de la temible resistencia estatal, es particularmente bienvenido. Los lectores que deseen más información sobre Fanon y los estudios indígenas pueden dirigirse a Red Skin, White Masks de Glen Sean Coulthard.

El lenguaje de la lucha

La lucha indígena en todo el mundo implica siempre la defensa de formas de pensamiento bajo la ocupación. De diferentes maneras, Losier y Feargal Mac Ionnrachtaigh comparten cómo el encarcelamiento fue, para unos pocos, una escuela de lucha porque era una escuela de lenguaje. Hablar irlandés contra la hegemonía del inglés del ocupante fue, como dijo un ex preso republicano, “una parte crucial de nuestra lucha contra la criminalidad y ayudó a formar nuestra identidad. Tuvimos que luchar para aprender y hablarlo fue una forma de resistencia. Cada vez que hablábamos irlandés, le decíamos a nuestro enemigo que éramos republicanos irlandeses, protestando y luchando. No íbamos a dejar que nos silenciaran... Irish fue un arma que usamos contra los tornillos dejándolos totalmente frustrados y excluidos. Nuestra expresión de identidad los dejó sintiéndose totalmente impotentes.

Este idioma tiene verdadero poder curativo. En varios estudios , el uso de la lengua indígena protege a sus hablantes del tabaquismo, el abuso del alcohol y la diabetes, males que tienen como vector al colonialismo . Dichos lenguajes están siendo atacados por el capitalismo colonial, sobre todo por la gramática de la inteligencia y la reciprocidad socavada por el inglés colonial. Quizás lo más destacado del libro es la oportunidad de ver a Fanon trabajando en la rearticulación del lenguaje en un diálogo entre Gibson y una variedad de miembros de Abahlali base Mjondolo. En el diálogo, Fanon se discute como una forma de entrar en la política de construcción del movimiento, al igual que las mentiras de la “planificación de ciudades inteligentes”, los conflictos sobre el papel de la religión y las articulaciones de poder dentro del ANC (Congreso Nacional Africano, partido político de Sudáfrica).

Es un raro privilegio ver este tipo de transcripción de Fanon en acción, particularmente en una organización que incorpora muchas de las ideas del libro. El lenguaje del abahlalismo desafía al Estado: el gobierno consideraba que Abahlali vivía en “asentamientos informales” o “barrios marginales”. La propia Abahlali abrazó el lenguaje de las “chabolas”, orgullosa de ocupar y socializar la tierra y la vivienda, y afirmar su derecho a la ciudad. La insistencia de Abahlali en su capacidad para pensar independientemente del estado se encontró primero con acusaciones de una tercera fuerza, la incredulidad del estado y la burguesía de que las personas empobrecidas pudieran pensar y escribir por sí mismas. Y, a medida que la amenaza del activismo organizado e inteligente presionó contra el Estado, ha matado a docenas de personas en respuesta, todo lo cual ha dejado al movimiento traumatizado.

El camino hacia la curación será largo. Nadie pretende lo contrario. El mismo Fanon entendió la necesidad de descolonizar el proceso de curación. Después de hacer todo lo posible para transformar las instalaciones psiquiátricas en su práctica en el Centro Psiquiátrico Blida-Joinville, Fanon se fue para unirse a la lucha de liberación en serio. Murió a los 36 años de leucemia, no sin antes observar las barreras coloniales a su propia práctica: “Detrás de 'el médico que cura las heridas de la humanidad' aparece el hombre, miembro de una sociedad dominante y que goza en Argelia del beneficio de una incomparable nivel de vida superior al de su colega metropolitano. Además, en los centros de colonización, el médico es casi siempre también un terrateniente”.

Es completamente apropiado que en este excelente libro, aquellos comprometidos en la praxis radical de la curación sean movimientos que están subvirtiendo las instituciones de la propiedad privada como un camino hacia una sociedad emancipada. El legado de Fanon hoy se mantiene vivo en su lucha.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

A constante e conflitiva expansão da democracia para Jacques Rancière


Renato Janine Ribeiro
Boitempo

A democracia não é um Estado acabado, nem um estado acabado das coisas; ela vive constante e conflitiva expansão; não se reduz ao desenho das instituições, ou à governabilidade, ou ao jogo dos partidos, mas é algo que vem de baixo, desdenhado desde os gregos como o empenho insolente dos pobres em invadir o espaço que era de seus melhores, de seus superiores.

Nos últimos anos, o Brasil se tornou um exemplo de inclusão social, com dezenas de milhões de pessoas saindo da pobreza e da miséria para terem uma vida melhor. Em que pese a inclusão ter ocorrido sobretudo pelo consumo – mais que pela educação –, ela mudou o país. Hoje, ninguém disputa o Poder Executivo atacando os programas de inclusão social. Eles se tornaram um consenso junto à grande maioria dos eleitores.

Entretanto, um número expressivo de membros da classe média os desqualifica, alegando diversos pretextos. Para eles, o Brasil era bom quando pertencia a poucos. Assim, quando os polloi – a multidão – ocupam os espaços antes reservados às pessoas de “boa aparência”, uma gritaria se alastra em sinal de protesto.

O que é isso, senão o enorme mal-estar dos privilegiados quando se expande a democracia? Democracia é hoje um significante poderoso, palavra bem-vista e que agrega um número crescente de possibilidades, indo da eleição pelo povo até a igualdade entre os parceiros no amor. Mas essa expansão da democracia incomoda. Daí, um ódio que domina nossa política, tal como não se via desde as vésperas do golpe de 1964, condenando medidas que favorecem os mais pobres como populistas e demagógicas.

Por isso são relevantes ensaios sustentando que a democracia não é um Estado acabado, nem um estado acabado das coisas; que ela vive constante e conflitiva expansão; que não se reduz ao desenho das instituições, ou à governabilidade, ou ao jogo dos partidos, mas é algo que vem de baixo, desdenhado desde os gregos como o empenho insolente dos pobres em invadir o espaço que era de seus melhores, de seus superiores. Porque a ideia de separação social continua presente e forte.

Se as ditaduras deixaram, desde os anos 1980, de tutelar a maior parte da humanidade, se governos eleitos proliferam, se a orientação sexual dissidente é mais bem aceita hoje, isso não significa que se tenha completado a democratização das formas de convivência social. E é justamente essa recusa da hierarquia que tem a ganhar com a leitura de O ódio à democracia, de Jacques Rancière que, à luz dos clássicos como da experiência francesa e mundial, continua um trabalho sempre renovado, jamais concluso, de afiar o gume da democracia.

Neste breve e contundente ensaio, publicado em 2005 na França, Jacques Rancière, um dos mais importantes filósofos da atualidade, conduz o leitor por um passeio pela história da crítica à democracia para situá-la no cerne político do momento atual, procurando esclarecer o que há de novo e revelador no sentimento antidemocrático, uma manifestação tão antiga quanto a própria noção de democracia. Dessa forma, Rancière repensa o poder subversivo do ideal democrático e o que se entende por política, para assim encontrar o caráter incisivo de sua ideia.

A obra mostra-se atual também em relação ao debate que vem crescendo sobre participação e representação popular, democracia direta e o desejo de que a política signifique mais do que uma escolha entre oligarcas substituíveis. Com uma narrativa que prima pela erudição e absoluta ausência de afetação, Rancière faz uma análise oportuna sobre as contradições dos Estados democráticos e lança uma crítica ao sistema representativo vigente a partir de uma afirmação polêmica: “Não vivemos em democracias. Vivemos em Estados de direito oligárquicos, em um admirável sistema que dá à minoria mais forte o poder de governar sem distúrbios”.

Nesse contexto, o ódio à democracia se apresenta como o ódio ao povo e seus costumes – à sociedade que busca a igualdade, o respeito às diferenças e o direito das minorias –, e não às instituições que dizem encarnar o poder do povo. Os porta-vozes desse ódio, defensores da ordem legítima e do direito ao poder àqueles destinados por nascimento ou eleitos por suas competências, habitam todos os países que se declaram Estados democráticos. A disputa pelo consenso está, no entanto, em aberto. Para Rancière, começa pela compreensão de que a democracia não se fundamenta em nenhuma natureza das coisas e não é garantida por nenhuma forma institucional.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

Gramsci : un marxismo singular, una nueva concepción del mundo


Yohann Douet
Contretemps

Gramsci tiene el mérito de haber estudiado y puesto de relieve fenómenos sociales que en gran medida la tradición marxista había hecho pasar a un segundo plano.

El marxismo abierto de Gramsci: "una nueva concepción del mundo"

A Antonio Gramsci suele atribuírsele, no sin razón, el mérito de haber estudiado y puesto de relieve fenómenos sociales que en gran medida la tradición marxista había hecho pasar a un segundo plano. Particularmente a través de la noción de hegemonía, Gramsci habría subrayado la importancia del papel de los intelectuales, de la lucha cultural e incluso de la sociedad civil, además de elaborado análisis y reflexiones de gran profundidad sobre la religión, la literatura, el periodismo, el folclore y la lengua, si bien esos otros aspectos de su labor son menos conocidos. Sin embargo, aunque nada de ello se pueda disputar, sí ha dado lugar a interpretaciones divergentes. Por ejemplo, hay quienes han llegado a considerar a Gramsci un “teórico de las superestructuras“ que habría ampliado y enriquecido el marxismo clásico por medio del estudio de nuevos objetos, a la vez que han creído percibir en la particular atención que Gramsci presta a la cultura y a la sociedad civil un alejamiento del marxismo y un giro implícito hacia concepciones liberales.

El nombre de Gramsci aparece igualmente vinculado a novedosas concepciones políticas y estratégicas. En efecto, a ojos de Gramsci, la lucha de clases no se limita a una “guerra de movimientos” cuyo desenlace sería rápidamente zanjado, sino que también consiste en una encarnizada y compleja “guerra de posiciones”, que tiene lugar a largo plazo y conlleva la construcción de una hegemonía alternativa a la de la clase dominante. La guerra de posiciones está ligada al peso de las superestructuras, particularmente fuerte en las sociedades capitalistas más avanzadas.

Gramsci distingue esas sociedades —que denomina “Occidente”— de las sociedades de “Oriente”, donde la sociedad civil, por el contrario, está muy poco desarrollada, y cuyo paradigma es la Rusia anterior a 1917. De ahí que proponga una estrategia adaptada a coyunturas diferentes de aquellas en que los bolcheviques llevaron a cabo sus luchas. Sólo que esos análisis también podrían haberse interpretado en el sentido opuesto: como complemento del marxismo revolucionario o, por el contrario, como cuestionamiento de este último.

En realidad, la reflexión de Gramsci no implica un rechazo, ni siquiera tendencial, del marxismo de Marx, ni tampoco del marxismo de Lenin: más bien constituye un empeño por elaborar su verdadero sentido. Ahora bien, no se trata para Gramsci simplemente de complementar la tradición marxista anterior, por lo demás muy diversa, y cuyas muchas deformaciones somete a crítica. Sería, por tanto, más exacto decir que el pensamiento gramsciano constituye una renovación del marxismo, a la vez fiel y creadora.

Para hablar de lo que es realmente el marxismo, Gramsci utiliza la expresión “filosofía de la praxis” y afirma que se trata de “una nueva concepción del mundo”. A su juicio, esa concepción debe ser capaz de aprehender la historia de forma teórica y práctica, es decir, de hacerla inteligible y de producir en ella efectos decisivos. Esa nueva concepción del mundo es un pensamiento sobre las contradicciones sociales y políticas, elaborado desde la perspectiva de una de las fuerzas en lucha (las clases dominadas), y que se esfuerza por superar esas contradicciones.

En cuanto tal, esa concepción procura intensificar la actividad autónoma de los grupos subalternos y ofrecerles una mejor comprensión de sí mismos, lo que presupone que consiga hacerse “popular”, es decir, difundirse ampliamente entre las masas. Es cuando constituye de manera indisociable actividad consciente y concepción activa —es decir, en cuanto praxis— que logra una verdadera unidad entre la teoría y la práctica.

La singularidad de su concepción del marxismo debe aprehenderse a la luz de la trayectoria personal, intelectual y militante de Gramsci. Nacido en 1891 en Cerdeña, Gramsci creció en una región pobre, donde la miseria cotidiana y la ausencia de desarrollo económico desalentaban toda visión de la historia como triunfo del progreso. Su padre, quien trabajaba como controlador en la oficina del registro civil, sufrió cárcel durante cinco años por contratiempos judiciales, por lo que durante ese período la familia de Gramsci, aunque proveniente de la pequeña burguesía, se vio sumida en una gran pobreza. En 1911, Gramsci se trasladó a Turín para emprender estudios superiores, habiendo contemplado durante algún tiempo la posibilidad de consagrarse a las investigaciones lingüísticas, que sin embargo abandonará por la lucha política.

La tradición neohegeliana italiana, en particular el historicismo de Benedetto Croce (1866-1952) y el actualismo de Giovanni Gentile (1875-1944), quienes hacían hincapié en la libre actividad humana, tanto contra el oscurantismo católico como contra el determinismo materialista, fue una fuente de profunda inspiración para Gramsci. Este propondría más tarde una crítica radical de esos filósofos neo-idealistas, tanto por razones teóricas como políticas —Gentile se había convertido en el filósofo oficial del fascismo, mientras que Croce fue hasta su muerte el filósofo liberal más influyente de Italia—, sin que su pensamiento dejara de construirse en diálogo con ellos.

Desde sus primeros escritos, Gramsci rechazó cualquier actitud pasiva y fatalista ante el curso de la historia. Más concretamente, se enfrentó a las versiones positivistas y cientificistas del marxismo, dominantes en el seno de la II Internacional en su conjunto, pero todavía más en el Partido Socialista Italiano (PSI), en que militaba desde 1913. El reformismo, el gradualismo y, básicamente, la actitud de espera del fundador y dirigente del PSI, Filippo Turati (1857-1932), se basaban en la idea de que el triunfo del socialismo estaba científicamente determinado.

En el advenimiento de la revolución en Rusia, que iba en contra de las predicciones del llamado socialismo “científico”, Gramsci vio una refutación de este último, idea que expuso en el artículo “La revolución contra El capital” (24 de diciembre de 1917), al que se hace referencia varias veces en la presente obra. Pero, como muestra otro artículo de esa época, titulado “Nuestro Marx”, esa refutación es también el punto de partida de una nueva concepción del marxismo, que no reduce la historia a esquemas mecánicos y determinismos económicos y que deja a la actividad humana todo el lugar que le corresponde.

En los años siguientes, Gramsci, entonces jefe del periódico L’Ordine Nuovo —fundado el 1 de mayo de 1919— junto con sus camaradas Angelo Tasca, Umberto Terracini y Palmiro Togliatti, ejerció una profunda influencia en el movimiento de los consejos obreros de Turín durante el biennio rosso de 1919-1920. En conflicto con la dirección burocratizada y tácitamente reformista del PSI en el curso de ese movimiento, participó en la fundación, en el congreso de Livorno de enero de 1921, del Partido Comunista de Italia, cuya dirección asumió en 1924, tras desplazar a Amadeo Bordiga, cuya línea le parecía sectaria y cuyos análisis juzgaba dogmáticos y economicistas.

Diputado desde abril de 1924, fue sin embargo encarcelado por el régimen fascista el 8 de noviembre de 1926 y, a partir del 8 de febrero de 1929, comenzó a escribir sus Cuadernos de la cárcel. Su proyecto de juventud de un marxismo vivo, abierto y activo, aunque ampliamente elaborado y profundamente refundido, siguió siendo el hilo conductor de sus reflexiones hasta que sus problemas de salud le impidieron escribir entre 1935 y el momento de su muerte, ocurrida el 27 de abril de 1937.

Filosofía de la praxis y materialismo histórico

La “nueva concepción del mundo” elaborada en Cuadernos de la cárcel se opone en más de un respecto a una comprensión esquemática y economicista del marxismo: abandona la dicotomía entre estructura económica, por un lado, y superestructuras políticas e ideológicas, por otro; rechaza toda visión determinista del curso de la historia; rechaza toda concepción de los sujetos históricos — en este caso, las clases— como dotados de una identidad fija predeterminada por una esencia económica. Es bien sabido que Gramsci hace hincapié en la cuestión de la lucha por la hegemonía y, en particular, en el papel decisivo que en ella desempeñan los intelectuales.

Del mismo modo, habida cuenta de la masificación y la complejidad de las sociedades del siglo XX y de la importancia de la sociedad civil, plantea la necesidad de favorecer una estrategia política de “guerra de posiciones” más que de “guerra de movimientos”, que trate de obtener el consentimiento de las masas, en particular mediante la construcción de una cultura popular autónoma opuesta a la cultura de las clases dominantes. Lejos de hacer de la política o de la cultura la expresión pasiva de la economía, Gramsci considera que entre esos diferentes elementos de la realidad socio-histórica pueden establecerse relaciones de “traducibilidad [traducibilità] recíproca” -al igual que entre la teoría y la práctica y entre el pensamiento y la acción.

Por esas diferentes razones, la “filosofía de la praxis” elaborada por Gramsci parece alejarse progresivamente del “materialismo histórico” entendido de forma mecanicista. Es lo que sostienen, valiéndose del método diacrónico al que ya hemos hecho referencia, investigadores como Fabio Frosini y Giuseppe Vacca. Este último encuentra en el núcleo de la “filosofía de la praxis” la noción de traducibilidad y una teoría de la “constitución” política de los sujetos colectivos.

Tal como lo ve Gramsci, no se debe concebir a los sujetos colectivos como si estuviesen determinados sin más por su situación económica, sino en cambio como algo siempre por construir y por organizar, es decir, inmerso en un proceso de formación histórica. Ese proceso jamás llega a consumarse, pues debe reanudarse y llevarse adelante continuamente, y es de carácter relacional, en el sentido de que pone en juego relaciones sociales, y en particular relaciones de fuerza y luchas, con otros sujetos colectivos.

Sin embargo, a pesar de su anti-economicismo, Gramsci no llega al punto de promover ningún “politicismo”, ni a sostener la primacía de la política en detrimento de la economía. Pierre Musso y Domenico Losurdo ponen por tanto de relieve la importancia que tiene para Gramsci la reflexión sobre el americanismo y el fordismo y, en sentido más general, sobre la dinámica y las transformaciones del sistema económico capitalista. El reconocimiento del terreno económico es, en ese sentido, indispensable para cualquier concepción adecuada de las luchas sociales y de los actores políticos. Si la identidad de un actor sociopolítico colectivo (como en el caso de una clase) se forma históricamente y emerge en particular de sus relaciones con otros actores, depende no obstante de su anclaje en la situación socioeconómica.

Por otro lado, aunque junto con las clases pueden tomarse en consideración otras relaciones y grupos sociales, estos últimos son, a ojos de Gramsci, los actores colectivos que desempeñan el papel más importante dentro del proceso histórico. Por lo demás, la continua referencia de Gramsci (que Domenico Losurdo subraya) a la Revolución rusa — para él una verdadera ruptura existencial y política— y al bolchevismo, sugiere que, lejos de distanciarse de ella, buscaba profundizar en la política revolucionaria de clase de la que es indisociable el marxismo.

Es desde esa perspectiva que se puede comprender la noción de hegemonía. Así pues, la hegemonía de una clase dominante, es decir, su capacidad para suscitar y organizar un determinado nivel de consentimiento entre otros grupos sociales, no se puede reducir a la cultura. Por un lado, es siempre también, e indisociablemente, política. El terreno primordial para el ejercicio de la hegemonía es, sin duda, la “sociedad civil”, es decir, “el conjunto de los organismos vulgarmente llamados ‘privados'”, en la medida en que la mayoría de esas organizaciones (iglesias, escuelas, universidades, medios de comunicación, editoriales, asociaciones, grupos de interés, partidos, etc.) producen, de forma más o menos directa, la hegemonía de la clase dirigente.

Pero en ese terreno, también las clases subalternas disponen de suficiente margen de maniobra para organizarse (tienen sus sindicatos, asociaciones, partidos, etc.) y desafiar la hegemonía establecida: en la sociedad civil tiene lugar, por tanto, una lucha de clases y esa lucha es tanto política como cultural. Además, si bien a la hora de definir la sociedad civil Gramsci la distingue de la “sociedad política”, es decir, del Estado en sentido estricto —el Estado tal como comúnmente se entiende en la tradición marxista, como instancia coercitiva al servicio de la clase dominante—, la sociedad civil y la sociedad política están unidas dialécticamente en la realidad concreta y forman lo que Gramsci denomina el “Estado integral”.

De ese modo, puede definir el Estado, en esa acepción más amplia, como “el conjunto de actividades prácticas y teóricas mediante las cuales la clase dirigente no sólo justifica y mantiene su dominación, sino que logra obtener el consenso activo de los gobernados”. Por otra parte, la hegemonía político-cultural de una clase también necesariamente posee una dimensión económica. Es lo que demuestra una vez más la concepción gramsciana del americanismo, analizada por Pierre Musso, quien a ese respecto destaca, de manera original, cierto número de similitudes con el productivismo de Saint-Simon.

En la situación sociohistórica de Estados Unidos a principios del siglo XX, “la hegemonía nace de la fábrica y, para ejercerse, necesita sólo el concurso de un número limitado de intermediarios políticos e ideológicos profesionales”. Se basa menos en la mediación del Estado o de las organizaciones de la sociedad civil, o en ideologías y visiones del mundo construidas y difundidas por diferentes estratos de intelectuales, que en la eficiencia y el dinamismo de la producción (en particular la velocidad con que se introducen innovaciones técnicas) y el nivel relativamente alto de los salarios. Antes aún, Musso sostiene de manera convincente, en relación con el neoliberalismo pero basándose en los señalamientos de Gramsci, que los métodos utilizados en el proceso de producción y en la gestión de la mano de obra (en primer lugar, la gerencia) pueden secretar sus propios intelectuales e ideologías orgánicas, capaces de extenderse al resto de la sociedad y producir en ella efectos de hegemonía.

Estructura, acontecimiento e historicismo realista en Gramsci

La atención prestada por Gramsci al surgimiento de una nueva lógica capitalista (es decir, el fordismo en Estados Unidos) capaz de superar —hasta cierto punto y temporalmente— la crisis de la época anterior, no lo lleva, sin embargo, a pasar por alto las contradicciones sociales y los conflictos políticos. En términos más generales, Gramsci jamás abstrae los sistemas socioeconómicos de las actividades humanas de las que aquellos derivan su eficacia.

Del mismo modo, si bien pone de relieve fenómenos históricos masivos (el surgimiento de una nueva lógica económica, la instauración o el mantenimiento de una determinada hegemonía, etc.), los discierne en el marco de situaciones históricas singulares y los concibe como resultado de luchas sociopolíticas. El “historicismo realista” de Gramsci —es decir, el reconocimiento de la realidad histórica concreta— busca de esa manera superar dos escollos.

Por un lado, se rehúsa a adoptar una perspectiva subjetivista e idealista, como atestigua su crítica del “historicismo especulativo” del filósofo neohegeliano Benedetto Croce, quien, a juicio de Gramsci, sustancializa o incluso personaliza la historia bajo la apariencia de un Espíritu perpetuamente en acción y disuelve así lo que el proceso histórico tiene de consistente o estructurado.

Por otra parte, Gramsci se aparta de toda concepción objetivista y mecanicista, encarnada en particular por la presentación del materialismo histórico que hace por Bujarin en su Ensayo popular, cuyo determinismo, según Gramsci, le impide tener en cuenta la dimensión constitutiva de la historia en que consiste la actividad humana.

El marxismo estructuralista, aunque mucho más rico y articulado, no deja de ser igualmente una concepción objetivista del materialismo histórico. Francesca Izzo muestra la importancia de la relación crítica de Althusser con el historicismo y en particular con Gramsci, tanto para su propio pensamiento como para la historia del marxismo en general. Para Althusser, la ciencia de la historia que es el materialismo histórico debe forjar, de manera abstracta, la teoría de las estructuras sociohistóricas objetivas (como el modo de producción capitalista).

También debe protegerse del historicismo y del empirismo al que está vinculado, y ello como mínimo por dos razones. Por un lado, concordar [indexer] la teoría con las fluctuaciones históricas, y hacerla así depender de la coyuntura inmediata, conduciría al revisionismo y al oportunismo. Por otro, creer que se tiene acceso inmediato a la historia concreta —directamente a través de la experiencia y, por tanto, sin necesidad de los rodeos propios de la teoría— implica quedarse atrapado en categorías ideológicas (como la de sujeto) que nos condenan a malinterpretar la realidad social, al aprehenderla en particular a partir de las acciones libres y conscientes de los sujetos humanos y no a partir de estructuras inteligibles y determinantes.

Según Althusser, Gramsci habría estado expuesto a esos dos peligros. Las vías teóricas, y sobre todo epistemológicas, emprendidas por ambos autores divergen radicalmente, y no es posible evaluar aquí sus méritos respectivos. Sin embargo, cabe afirmar que algunas de las críticas hechas por Althusser no son pertinentes: el “historicismo realista” gramsciano está lejos de caer en el empirismo ingenuo que Althusser denuncia, pues Gramsci, por el contrario, se esfuerza por comprender los fenómenos históricos en gran escala y “estructurados”, y ello a partir de nociones generales (hegemonía, Estado integral, bloque histórico, y así sucesivamente); mientras que la “filosofía de la praxis”, sin dejar de hacer justicia a la actividad humana, no nos lleva a abstraer o absolutizar a los sujetos —ya sean individuales o colectivos—, sino, por el contrario, a concebirlos como necesariamente atrapados en relaciones sociales constrictivas y como definidos por esas relaciones.

Para Gramsci, pues, los fenómenos históricos ni están íntegramente determinados ni son completamente contingentes; si bien no son desarrollos perfectamente objetivos, tampoco son acontecimientos puros. Una crisis orgánica, por tanto, es un caso en que se manifiesta por excelencia la unidad dialéctica de continuidad y discontinuidad en la historia: tiene su origen en profundas contradicciones y prolonga —acentuándolas— tendencias fundamentales del proceso histórico, pero constituye un período en que la posibilidad de ruptura con el pasado es particularmente aguda, sin que por ello nada garantice su realización.

Así lo indica la famosa tesis de que “la crisis consiste precisamente en el hecho de que lo viejo muere y lo nuevo no acaba de nacer”, lo cual abre un “interregno” en que “pueden observarse los fenómenos morbosos más variados”, en la misma medida en que las contradicciones anteriores aún no han sido superadas.

Fabio Frosini muestra que la noción de crisis es decisiva en Cuadernos de la cárcel —donde incluso se moviliza como paradigma para tratar de comprender toda la época burguesa moderna en su conjunto — y sostiene que esa noción nos permite someter a crítica los escollos —y sortearlos— con que se han tropezado aquellos teóricos que, como Ernesto Laclau y Chantal Mouffe, erigen la noción de acontecimiento como categoría primaria de la comprensión histórica.

Desde su primera obra “posmarxista”, Hegemonía y estrategia socialista, publicada en 1985, estos autores —que se califican a sí mismos de gramscianos—, atacan el esencialismo y el economicismo que consideraban característicos del marxismo. A sus ojos, las subjetividades colectivas no están determinadas por su situación económica, sino que son fruto de una articulación política —perfectamente contingente— entre fuerzas aliadas, bajo la égida de una fuerza hegemónica, contra fuerzas antagónicas.

Por ejemplo, si el movimiento obrero pareció por tanto tiempo ser portador de la emancipación humana en su conjunto, ello no se debió — contrariamente a lo que, según Laclau y Mouffe, creían los teóricos marxistas— al hecho de que el proletariado fuera, por su posición económica en las relaciones de producción capitalistas, una clase universal por esencia, cuya liberación conllevaba el fin de toda dominación, sino a que las organizaciones comunistas y socialistas consiguieran, de manera contingente, amalgamar políticamente un conjunto de reivindicaciones emancipatorias heterogéneas (feministas, antiautoritarias, antiimperialistas, etc.) en torno a un proyecto anticapitalista, hegemónico en la medida en que representaba toda esa serie de reivindicaciones.

Nada garantizaba que esa articulación tuviera éxito, ni que se pudiera sostener; y, a la inversa, habrían sido posibles también otras articulaciones (en las que otras reivindicaciones, feministas o antiimperialistas, por ejemplo, hubieran desempeñado un papel hegemónico). La identidad de un actor colectivo como el movimiento obrero dependería así totalmente de las reivindicaciones que este asuma, de las modalidades según las cuales consiga articularlas y de los enemigos contra los que luche.

Como bien se sabe, sin embargo, Gramsci rechaza esa concepción unilateral de las subjetividades colectivas, que se centra sólo en su dimensión político-ideológica y oscurece su anclaje en determinadas situaciones socioeconómicas. La tarea de la filosofía de la praxis es precisamente pensar la dialéctica entre la acción humana y sus condiciones y —esta segunda pareja no se superpone a la primera— entre política y economía.

Fabio Frosini muestra, por añadidura, que las reflexiones de Cuadernos de la cárcel se oponen a la visión del tiempo histórico propuesta por Laclau. Para este último, en la medida en que cada configuración sociohistórica no se define sino por una articulación política contingente, la realidad social deberá concebirse como susceptible de ser, en cualquier momento, alterada por un acontecimiento puro que no esté determinado por la configuración precedente.

Es cierto, como señala Fabio Frosini, que Gramsci no concibe la historia como el continuo despliegue de un principio dado desde el primer momento, ya sea el despliegue de la Razón tal como es posible concebir desde una perspectiva hegeliana, o la maduración gradual de las contradicciones del capitalismo tal como aparecen en el gran relato de las versiones esencialistas del marxismo. Pero tampoco ve discontinuidades absolutas, ni momentos de pura indeterminación.

Aunque es evidente que, para Gramsci, acontecimientos como la Revolución de Octubre revisten una importancia decisiva, no los discierne de forma aislada y, en cambio, trata siempre de dar cuenta de las tendencias históricas en cuya estela se producen, así como de la situación sociohistórica específica de su advenimiento, que en el caso de una revolución corresponde precisamente a una crisis. A juicio de Gramsci, la historia es el lugar, siempre “saturado”, de conflictos entre fuerzas diferentes: una crisis de hegemonía no es un vacío de hegemonía, sino la vacilación del sistema hegemónico de que se trate ante el empuje que otra clase imprima al advenimiento de una nueva hegemonía.