quinta-feira, 18 de março de 2021

A cartilha de um genocida


Ruth de Aquino
O Globo


Chamar Bolsonaro de genocida parece provocação. Genocídio é o extermínio deliberado de uma coletividade indefesa, por diferenças étnicas, nacionais, religiosas ou sociopolíticas. O massacre de milhões de judeus por Hitler cunhou a expressão. Esse crime contra a humanidade é julgado em tribunais internacionais, com pena de até 30 anos de prisão. Não prescreve. Raramente os crimes de gestão pública chegam a Haia, na Holanda.

Por que então esse aprendiz de ditador que bajula as Forças Armadas, ameaça poderes, despreza minorias e persegue a imprensa é acusado de genocida? Em julho de 2020, quando os mortos por Covid eram 85 mil no Brasil, já havia em Haia três denúncias contra Bolsonaro por incitar mortes, asfixiar indígenas e propagar o vírus. No Supremo Tribunal Federal, há na pauta uma notícia-crime de genocídio. Um líder pode construir ou destruir consciência cívica. No início da pandemia, a população era mais comedida. Depois, imitou os negacionistas.

Como Bolsonaro boicotou as vacinas e nos aproximamos de 300 mil mortos, sua rejeição aumentou. Não importa quem é o ministro da Saúde (aliás, não importa quem é ministro de pasta nenhuma). É Bolsonaro quem manda. As pesquisas mostram. É Bolsonaro o culpado. É Bolsonaro o incapaz de governar. É Bolsonaro o autor do colapso do Brasil. 

Fiz uma cartilha com sete fatos. Um bê-a-bá de como se tornar ou se reconhecer um potencial genocida. Não listei características pessoais. A frieza, por exemplo. Só um genocida não se emociona com a morte de milhares de pessoas – especialmente idosos, vulneráveis, ou não produtivos. Que tomem tubaína. O deboche diante do luto nacional pode ser traço de um genocida. As ações são ainda mais gritantes e perniciosas. Aí vão elas:

1 – Negar a pandemia. É uma gripezinha. Nada vai acontecer se você tiver histórico de atleta. Todos vamos morrer um dia. Não podemos ser maricas e ficar em casa. Isolamento social não adianta nada. 

2 – Não usar máscara e promover aglomerações em bares, ruas, praias, contrariando os especialistas. Propagar o vírus. Apertar a mão, abraçar, beijar, tirar selfie, repreender ministros com máscara, vetar máscaras em presídios.

3 – Demitir um médico, Mandetta, como ministro da Saúde, por suas entrevistas diárias, explicando à luz da Ciência como reduzir contágio e mortes. Emparedar outro ministro da Saúde, também médico, por condenar a cloroquina. Gastar R$ 90 milhões em remédios ineficazes e fazer propaganda, tentar impor aos médicos. Efetivar na Saúde um general boneco de ventríloquo e incompetente. 

4 – Vetar divulgação de mortos e contaminados, optando por revelar apenas quem se curou. A censura foi contornada com o consórcio inédito de jornais e TV Globo. 

5 – Criar conflitos com o Supremo e a Câmara, incitando extremistas de direita a atacar essas instituições, nas redes sociais e fisicamente. Ameaçar ruptura institucional. Só mudar de atitude depois que a família começou a ser investigada por corrupção, rachadinhas e ligação com milícias. Trocar cargos e verbas por apoio no Congresso.

6 – Rachar com governadores e prefeitos, relegando a eles a condução da pandemia. Inventar que o Supremo Tribunal Federal tirou sua autonomia como presidente. Estrangular estados com a falta de liderança federal e de cilindros de oxigênio. Chantagear quem impõe lockdown ou restrições de circulação. 

7 – Boicotar as vacinas. Rejeitar a Coronavac, por ser chinesa e “do Doria”. Recusar vacinação obrigatória. Desencorajar. Não se vacinar. Não comprar milhões de doses da Pfizer que estariam aqui em dezembro. Proibir negociações com os laboratórios. Barganhar o preço até obrigar estados a suspender a vacinação. Solapar o SUS, a Fiocruz, o Butantan e todos os que poderiam já estar produzindo e imunizando em massa. Talvez estejam no seu colo 100 mil cadáveres. 

Como você chamaria quem age assim? 

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