quinta-feira, 22 de maio de 2025

A nova Idade das Trevas começa em Israel

Chris Hedges
Socialismo y Democracia

Na retomada da ofensiva contra Gaza, cem mortos por dia e um rastro de barbárie: o Ocidente regride no tempo, rumo a origens que nunca o deixaram, mas foram mascaradas por promessas vazias de democracia, justiça e direitos humanos.

Daqui do Cairo até o posto fronteiriço de Rafah, em Gaza, são 320 quilômetros. No deserto árido do norte do Sinai, no Egito, dois mil caminhões estão estacionados — abarrotados de sacos de farinha, reservatórios de água, alimentos enlatados, suprimentos médicos, lonas e combustível. Eles permanecem parados sob um sol implacável, com temperaturas que ultrapassam os 37ºC.

A poucos quilômetros dali, em Gaza, dezenas de homens, mulheres e crianças – sobrevivendo em barracas precárias ou entre os escombros de prédios destruídos – são massacrados diariamente por balas, bombas, mísseis, disparos de tanques, doenças infecciosas e pela arma mais antiga da guerra de cerco: a fome. Uma em cada cinco pessoas enfrenta inanição após quase três meses de bloqueio israelense a alimentos e ajuda humanitária.

 O primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, que lançou uma nova ofensiva e já provoca mais de 100 mortes diárias, declarou que nada impedirá este ataque final, batizado de “Operação Carruagens de Gideon.”

 Ele declarou que “não há chance” de Israel parar a guerra, mesmo que os reféns israelenses restantes sejam libertados. “Estamos destruindo cada vez mais casas em Gaza”, afirmou. “Os palestinos não têm para onde voltar.” E acrescentou a parlamentares, numa fala que vazou de um encontro a portas fechadas: “Nosso maior problema é encontrar países que aceitem recebê-los.”

A fronteira de 14 quilômetros entre o Egito e Gaza tornou-se a linha divisória entre o Sul Global e o Norte Global – a demarcação entre um mundo de violência industrial selvagem e a luta desesperada daqueles abandonados pelas nações mais ricas. Ela simboliza o fim de um mundo onde o direito humanitário, as convenções que protegem civis ou os direitos mais básicos e fundamentais importavam.

Anuncia-se um pesadelo hobbesiano onde os fortes crucificam os fracos, onde nenhuma atrocidade – incluindo o genocídio – é impedida, onde a raça branca do Norte Global retorna à selvageria e dominação atávicas e desenfreadas que definem o colonialismo e sua longa história de pilhagem e exploração. O Ocidente está regredindo no tempo, rumo a suas origens – que nunca o deixaram, mas que foram mascaradas por promessas vazias de democracia, justiça e direitos humanos.

Os nazistas tornaram-se os bodes expiatórios convenientes para o legado europeu e norte-americano de massacres em massa – como se os genocídios que estes países perpetraram nas Américas, na África e na Índia nunca tivessem acontecido, meras notas de rodapé insignificantes em sua história coletiva. Na verdade, o genocídio é a moeda corrente na história da dominação ocidental.

Entre 1490 e 1890, a colonização europeia – incluindo atos de genocídio – foi responsável pela morte de até 100 milhões de indígenas, segundo o historiador David E. Stannard. Desde 1950, ocorreram quase duas dezenas de genocídios, incluindo os de Bangladesh, Camboja e Ruanda.

O genocídio em Gaza faz parte de um padrão. É o prenúncio dos genocídios que estão por vir, especialmente com o colapso climático, quando centenas de milhões serão forçados a fugir de secas, incêndios florestais, enchentes, colheitas escassas, Estados falidos e mortes em massa. É uma mensagem ensanguentada que se envia ao resto do mundo: “Nós temos tudo e, se tentarem tirar de nós, nós os mataremos.”


Gaza desmascara a mentira do progresso humano – o mito de que evoluímos moralmente. Apenas as ferramentas mudam. Se antes espancávamos as vítimas até a morte ou as esfacelávamos com espadas largas, hoje lançamos bombas de 900 quilos sobre campos de refugiados, metralhamos famílias com drones militarizados ou as pulverizamos com disparos de tanques, artilharia pesada e mísseis.

Louis-Auguste Blanqui, um socialista do século XIX, rejeitava — ao contrário de quase todos os seus contemporâneos, inclusive Friedrich Hegel e Karl Max, a crença de que a história humana é uma progressão linear rumo à igualdade e a uma moralidade superior. Ele alertava que essa visão positivista absurda é cultivada pelos opressores para enfraquecer os oprimidos.

“Todas as atrocidades dos vencedores, sua longa série de ataques, são friamente transformadas em uma evolução constante e inevitável, como a da natureza… Mas a sequência dos atos humanos não é inevitável como a do universo. Pode ser mudada a qualquer momento”, Blanqui alertou. E prosseguiu: “O avanço científico e tecnológico, longe de ser um exemplo de progresso, pode transformar-se numa arma terrível nas mãos do Capital contra o Trabalho e o Pensamento.”

 “Pois a humanidade”, escrevia Blanqui, “nunca é estacionária. Ou avança ou retrocede. Sua marcha progressiva conduz à igualdade. Seu marcha regressiva passa por todos os estágios de privilégio até desembocar na escravidão humana – a palavra final do direito à propriedade.” Ele acrescentava: “Não estou entre os que afirmam que o progresso é inevitável, que a humanidade não pode retroceder.”

A história humana é marcada por longos períodos de esterilidade cultural e repressão brutal. A queda do Império Romano levou à miséria e à opressão na Europa durante a Idade das Trevas, aproximadamente do século VI ao XIII. Houve perda de conhecimentos técnicos, inclusive sobre como construir e manter aquedutos. O empobrecimento cultural e intelectual gerou uma amnésia coletiva. As ideias de estudiosos e artistas da Antiguidade foram apagadas. Não houve recuperação até o século XIV, com o Renascimento – um desenvolvimento possibilitado em grande parte pelo florescimento cultural do Islã, que, ao traduzir Aristóteles para o árabe e por meio de outras conquistas intelectuais, evitou o desaparecimento da sabedoria do passado.

Blanqui conhecia bem os trágicos refluxos da história. Participou de uma série de revoltas francesas, incluindo a tentativa de insurreição armada de maio de 1839, a revolução de 1848 e a Comuna de Paris, o levante socialista que controlou a capital francesa de 18 de março a 28 de maio de 1871. Operários em cidades como Marselha e Lyon tentaram, sem sucesso, organizar comunas similares antes que Paris fosse esmagada militarmente.

Estamos entrando numa nova era das trevas. Esta versão moderna vale-se de ferramentas como vigilância em massa, reconhecimento facial, inteligência artificial, drones, polícia militarizada, a revogação do devido processo legal e das liberdades civis. Faz tudo isso para impor um regime arbitrário, guerras incessantes, insegurança, anarquia e terror – os mesmos denominadores comuns da Idade das Trevas.

Confiar no conto de fadas do progresso humano para nos salvar é rendermo-nos passivamente ao poder despótico. Só a resistência – articulada na mobilização das massas e na ruptura do exercício do poder, especialmente contra genocídios – pode nos salvar.


Campanhas de extermínio em massa liberam os instintos selvagens que permanecem latentes em todos os seres humanos. A sociedade organizada, com suas leis, etiqueta, polícia, prisões e regulamentos – todas as formas de coerção – mantém esses instintos sob controle. Remova esses freios e os seres humanos se transformam, como vemos com os israelenses em Gaza, em animais predadores e assassinos, que se inebriam com a destruição – inclusive de mulheres e crianças. Eu gostaria que isso fosse apenas uma suposição. Não é. É o que testemunhei em todas as guerras que cobri. Quase ninguém está imune.

No final do século XIX, o rei belga Leopoldo ocupou o Congo em nome da civilização ocidental e do combate à escravidão, mas saqueou o país, causando a morte — por doenças, fome e assassinatos — de cerca de 10 milhões de congoleses. Joseph Conrad retratou essa dicotomia entre quem somos e quem afirmamos ser em seu romance Coração das Trevas e no conto Um Posto Avançado do Progresso.

Em Um Posto Avançado do Progresso, Conrad narra a história de dois comerciantes europeus, Carlier e Kayerts, enviados ao Congo. Eles alegam estar na África para implantar a civilização europeia. O tédio, a rotina opressiva e, sobretudo, a ausência de quaisquer freios externos transformam os dois homens em feras. Traficam escravos em troca de marfim. Brigam por comida e suprimentos cada vez mais escassos. Por fim, Kayerts assassina seu companheiro desarmado, Carlier.

“Eram dois indivíduos perfeitamente insignificantes e incapazes”, escreveu Conrad sobre Kayerts e Carlier, “cuja existência só se torna possível por meio da alta organização das multidões civilizadas. Poucos homens percebem que sua vida, a própria essência de seu caráter, suas capacidades e audácias, são apenas a expressão de sua crença na segurança de seu entorno. A coragem, a compostura, a confiança; as emoções e os princípios; cada pensamento grandioso ou insignificante pertence não ao indivíduo, mas à multidão: à multidão que crê cegamente na força irresistível de suas instituições e moralidade, no poder de sua polícia e de sua opinião.

Mas o contato com a selvageria pura e absoluta, com a natureza primitiva e o homem primitivo, traz subitamente um turbilhão profundo ao coração. Ao sentimento de estar isolado entre os seus, à clara percepção da solidão dos próprios pensamentos, das próprias sensações — à negação do habitual, que é seguro – soma-se a afirmação do incomum, que é perigoso; uma sugestão de coisas vagas, incontroláveis e repulsivas, cuja intrusão perturbadora excita a imaginação e testa os nervos civilizados tanto dos tolos quanto dos sábios.

O genocídio em Gaza implodiu os subterfúgios que o Ocidente usa para enganar a si mesmo e tentar enganar os outros. Ele escarnece de todas as virtudes que a civilização eurocêntrica alega defender, inclusive o direito à liberdade de expressão. É um testemunho de sua hipocrisia, crueldade e racismo.

Os ocidentais não podem mais — depois de fornecer bilhões em armas e perseguir quem denuncia o genocídio — fazer reivindicações morais a ser levadas a sério. Sua linguagem, de agora em diante, será a linguagem da violência, a linguagem do genocídio, o uivo monstruoso da nova era das trevas, onde poder absoluto, ganância desenfreada e selvageria incontida assombram o mundo.

quarta-feira, 21 de maio de 2025

Por que legado de Malcolm X permanece atual

Suzanne Cords
Deutsche Welle

Ativista ainda é inspiração contra opressão dos negros, 100 anos após seu nascimento. Em meio aos esforços de Trump de branquear história dos EUA, palavras de Malcolm X estão mais relevantes do que nunca.

"O que você acha que faria depois de 400 anos de escravidão, Jim Crow e linchamentos? Você acha que responderia de forma não violenta?" Essas foram algumas das principais perguntas que Malcolm X fez à sociedade americana.

Embora a escravidão tenha sido abolida nos Estados Unidos em 1865, as chamadas leis Jim Crow continuaram a consolidar a discriminação cotidiana contra os negros até 1964. Eles não tinham permissão para votar ou sentar-se ao lado de brancos em ônibus ou restaurantes. Viviam em guetos e tinham empregos precários.

"Malcolm X abordou exatamente as questões que estavam fervilhando na mente dos afro-americanos oprimidos", disse Britta Waldschmidt-Nelson, autora da biografía Malcolm X: The Black Revolutionary. Sua mensagem para os afro-americanos foi clara: tenham autoconfiança! Lutem por seus direitos da forma que for necessária – até mesmo com violência, se preciso.

Na biografía de Malcolm X escrita pelo jornalista americano e ganhador do Prêmio Pulitzer Les Payne (1941-2018), ele relembrou como um discurso do ativista em 1963 o libertou, como um "golpe de espada", do "sentimento condicionado de inferioridade como homem negro" profundamente enraizado em sua psique. Esse era exatamente o objetivo declarado de Malcolm X.

Infância marcada pelo racismo

Nascido em 19 de maio de 1925, em Omaha, Nebraska, com o nome de Malcolm Little, o ativista passou a infância perto de Detroit, em meio à pobreza e violência. Ele tinha seis anos de idade quando seu pai foi encontrado morto, assassinado por supremacistas brancos, segundo relatos. Completamente sobrecarregada, com sete filhos e pouco dinheiro, a mãe de Malcolm enfrentou problemas de saúde mental. Malcolm foi, então, submetido a várias famílias adotivas e instituições. Mais tarde, em sua autobiografia, ele falou sobre o "terror dos assistentes sociais muito brancos".

Apesar de início de vida difícil, ele era um bom aluno, o único negro de sua classe. Uma experiência em particular teve um impacto profundo sobre ele: seu professor favorito lhe perguntou o que ele queria ser quando crescesse. Malcolm respondeu que gostaria de estudar direito. Mas o professor, dirigindo-se a ele com um insulto racista, disse que essa não era uma meta realista para um garoto como ele. Depois desse episódio, suas notas caíram drasticamente. Aos 15 anos, Malcolm X se mudou para Boston para morar com sua meia-irmã Ella Collins e, mais tarde, para Nova York. Ele se sustentava fazendo bicos, até passar a cometer pequenos crimes. Aos 20 e poucos anos, foi preso por vários roubos.

"Aqui está um homem negro enjaulado atrás das grades, provavelmente por anos, colocado lá pelo homem branco", escreveu mais tarde em sua autobiografia. "Você permite que esse homem negro enjaulado comece a perceber, como eu fiz, que desde o primeiro desembarque desse primeiro navio negreiro, os milhões de homens negros na América têm sido como ovelhas em um covil de lobos. É por isso que os prisioneiros negros se tornam muçulmanos tão rapidamente quando os ensinamentos de Elijah Muhammad entram em suas jaulas por meio de outros condenados muçulmanos." O mentor a que Malcolm X se refere, Elijah Muhammad, era um separatista negro e líder da Nação do Islã, uma organização político-religiosa de afro-americanos fora da ortodoxia islâmica.


Luta contra os "demônios brancos"

A Nação do Islã "afirma que todos os negros são inerentemente filhos de Deus e bons, e todos os brancos são inerentemente maus e filhos do demônio", explica a biógrafa Waldschmidt-Nelson. "O que tornou isso muito atraente para Malcolm e muitos outros presos, é claro, é que alguém viria e diria: 'Vocês não são culpados por sua miséria; foram os demônios de olhos azuis que os fizeram se desviar'."

Depois de entrar para a organização, ele começou a se chamar Malcolm X, porque os sobrenomes dos afro-americanos eram historicamente atribuídos por seus proprietários de escravos. Portanto, os membros da Nação do Islã rejeitavam seus nomes de escravos e se chamavam simplesmente de "X". Durante os sete anos em que passou na prisão, ele buscou mais conhecimento e permaneceu como membro da Nação do Islã por 14 anos. O líder Elijah Muhammed apreciava a perspicácia intelectual e as habilidades oratórias do jovem e o tornou o porta-voz da organização.

Em seus discursos, Malcolm X denunciou várias vezes os "demônios brancos". Embora vivesse nos estados do norte dos EUA – espécie de "terra prometida" para os negros dos estados do sul, ainda mais restritivos –, ele também não depositava mais nenhuma esperança nos "liberais" brancos de lá. Afinal de contas, ele havia experimentado pessoalmente como os negros eram tratados como cidadãos de segunda classe em todos os Estados Unidos.

Malcolm X há muito tempo desdenhava do movimento pelos direitos civis de Martin Luther King Jr. Ele criticou o famoso discurso de King na Marcha sobre Washington, em 1963, que falava de uma América livre e unida, que ultrapassasse todas as barreiras raciais, por considerá-lo irrealista. "Não, eu não sou americano. Sou um dos 22 milhões de negros que são vítimas do americanismo. [...] E vejo os Estados Unidos com os olhos da vítima. Não vejo nenhum sonho americano; vejo um pesadelo americano."

Peregrinação á Meca e mudança de atitude

Depois de ficar desiludido com o líder da organização, Malcolm X rompeu com a Nação do Islã em março de 1964. Naquele mesmo ano, ele fez uma peregrinação a Meca, e sua impressão a respeito dos "demônios brancos" começou a mudar. "Ele ficou profundamente impressionado com a hospitalidade e a cordialidade com que foi recebido, até mesmo por muçulmanos brancos na Arábia Saudita", escreve Britta Waldschmidt-Nelson em sua biografia. "E então, no último ano de sua vida, ele se afastou dessa doutrina racista".

Ele se lançou a um novo propósito: "Malcolm X queria criar uma aliança de todas as pessoas de cor oprimidas contra a opressão colonial branca", diz a biógrafa. Em uma viagem à África, os governos elogiaram sua intenção, mas ele não podia contar com o apoio deles: "É claro que todos eles dependiam da ajuda ao desenvolvimento dos EUA, e a maioria dos governos africanos não teria agido abertamente contra os EUA naquela época."

Em vez disso, Malcolm X tornou-se o foco da CIA, o serviço de inteligência americano. A Nação do Islã também estava em seu encalço. "Ele sabia que seria assassinado, e foi uma decisão consciente de sua parte enfrentá-la", diz Waldschmidt-Nelson. "Ele provavelmente disse a si mesmo: 'Não posso desistir agora'. Depois de sua experiência em Meca, Malcolm embarcou em um caminho completamente novo, aberto a colaborar com o movimento de direitos civis de King e, se necessário, também com os brancos." Mas isso nunca aconteceu. Em 21 de fevereiro de 1965, ele foi morto a tiros durante uma palestra, por membros da Nação do Islã. Ele tinha apenas 39 anos de idade.

Legado atual

Na década de 1980, artistas de hip-hop celebraram o legado de Malcolm X citando trechos de seus discursos em suas músicas: "Tudo isso teve muita ressonância", disse Michael E. Sawyer, professor de literatura e cultura afro-americana na Universidade de Pittsburgh. "Foi uma maneira de criar esse tipo de ressurgimento da identidade negra como também uma identidade política." As músicas serviam como declarações políticas de guerra contra o racismo branco, a brutalidade policial e o empobrecimento dos negros marginalizados.

Em 1992, Spike Lee adaptou a autobiografía de Malcolm X em um filme estrelado por Denzel Washington, o que também contribuiu para transformar a figura revolucionária num ícone que forjou a identidade cultural de muitos negros.

Hoje, como o esforço do atual governo dos EUA em branquear a história e subestimar as consequências do racismo na formação do país, e com o movimento Make America Great Again (MAGA) se opondo a qualquer crítica à suposta glória passada dos Estados Unidos, as palavras de Malcolm X estão mais relevantes do que nunca: "Você não deve ficar tão cego de patriotismo que não consiga encarar a realidade. O errado é errado, não importa quem o faça ou o diga."

quarta-feira, 14 de maio de 2025

Murió José "Pepe" Mujica, un líder histórico recordado por la magia de las palabras

Mercedes López
Página 12

La vida del exmandatario uruguayo transcurrió como en escenas de película. Empezó a militar en la adolescencia y se sumó al Movimiento de Liberación Nacional-Tupamaros. Preso durante la dictadura, llegó luego a la presidencia con el Frente Amplio.

Pepe, como lo llamaban todos en Uruguay, será recordado por sus múltiples aristas, pero hay una sobresaliente: la sabiduría de sus palabras. José “Pepe” Mujica nació el 20 de mayo de 1935 y murió este martes, a los 89 años, haciendo historia: un exguerrillero tupamaro que el 1 de marzo de 2010 llegó a la presidencia de su paisito, como le decía.

A principios de 2025 Pepe Mujica se despidió de la vida pública y pidió que lo dejaran descansar en la intimidad de su chacra, ya con un cáncer de esófago muy avanzado. "Lo que pido es que me dejen tranquilo. Que no me pidan más entrevistas ni nada más. Ya terminó mi ciclo. Sinceramente, me estoy muriendo. El guerrero tiene derecho a su descanso", expresó al semanario Búsqueda.

El pasado domingo, su ausencia en las elecciones municipales dio cuenta del cuadro de su salud. La histórica compañera del Pepe, Lucía Topolansky, confirmó que recibía cuidados paliativos. Faltaban días para que cumpliera los 90 años. Y su delfín político, el actual presidente Yamandú Orsi, declaró que Mujica estaba grave. El mandatario este martes informó de su muerte en la red X y lo despidió afectuosamente: "Te vamos a extrañar mucho, Viejo querido. Gracias por todo lo que nos diste y tu profundo amor por tu pueblo".

El pueblo podrá darle su último adiós a partir de este miércoles, hasta pasado el mediodía del jueves, inclusive. Un cortejo fúnebre partirá por la mañana desde la Torre Ejecutiva (sede del gobierno), recorriendo varios puntos de Montevideo, como postas de su historia de vida, entre ellos la sede del Frente Amplio y la del partido Movimiento de Participación Popular (MPP) hasta terminar en el Palacio Legislativo.

Porque la vida del Pepe transcurrió como en escenas de una película. Una de ellas sucedió cuando le dijo a una multitud: “No me voy, estoy llegando”, en el último acto como mandatario en vísperas de entregarle la banda presidencial a su correligionario Tabaré Vázquez, el 28 de febrero de 2015. “Me iré con el último aliento y donde esté, estaré por ti, contigo, porque es la forma superior de estar con la vida. Gracias, querido pueblo”.

En aquella emotiva despedida en la que a sus 80 años dejaba la presidencia, quedaba claro que seguiría haciendo política. Mujica había sido electo presidente el 29 de noviembre de 2009 cuando ya era un histórico referente del Movimiento de Participación Popular dentro de la coalición de izquierda Frente Amplio (FA). Y cuando sentía el aprecio de la gente en las calles y él se mostraba accesible. Le tocaban el hombro y lo abrazaban, como a un padre.

Durante su gobierno se aprobaron leyes de vanguardia en la región como la liberación de la producción y comercialización del cannabis, la legalización del aborto y el matrimonio igualitario. Como una reparación histórica más que simbólica, el extupamaro Mujica fue quien en nombre del Estado uruguayo pidió disculpas en un acto público por la desaparición de María Claudia Iruretagoyena, nuera del poeta Juan Gelman. Lo hizo en marzo de 2012 cumpliendo con un fallo de la Corte Interamericana de Derechos Humanos en el caso Gelman.

El capítulo memoria, verdad y justicia tuvo sus claroscuros en el gobierno de Mujica, con serias dificultades para dejar sin efecto la Ley de Caducidad que daba impunidad a militares y policías acusados por delitos de lesa humanidad. Y también por el nombramiento de Guido Manini Ríos al frente del Ejército. Manini Ríos, el jerarca militar, se convertiría en un político de extrema derecha y aliado del ex gobierno de Luis Lacalle Pou.

Vida de militante

Pepe Mujica donó casi el 90 % de su sueldo como presidente para caridad y siguió viviendo en su chacra en Rincón del Cerro, a las afueras de Montevideo junto a Lucía Topolansky, entonces senadora. Una partecita de ese mundo de la pareja, que no tuvo hijos, con un estilo de vida sencillo, el amor por el tango y el cultivo de flores y vegetales, fue contada por el cineasta Emir Kusturica en el documental "El Pepe, una vida suprema".

Cerca de Rincón del Cerro, en Paso de la Arena, creció Mujica: una zona ubicada al oeste de Montevideo, de clase obrera que luego sería bastión de la resistencia a la última dictadura (1973-1985). Aprovechando la hectárea de campo que tenía la familia ahí, Pepe plantaba verduras y flores codo a codo con su madre, Lucy Cordano. Y empezó a vender flores tras la muerte de su padre, Demetrio Mujica.


Mujica militó desde adolescente. "Tenía 14 cuando empecé en una agrupación anarca", le contó a María Ester Gilio en el libro Pepe Mujica, de tupamaro a presidente. De joven fue relacionándose cada vez más con partidos de izquierda y haciéndose marxista. Un marxismo difícil de encuadrar dentro de las visiones de los socialistas y comunistas de la época. La de un cuestionador y ávido lector.

En esa búsqueda se incorporó a la lucha armada con el Movimiento de Liberación Nacional-Tupamaros, una guerilla urbana inspirada en la revolución cubana. Cayó preso por primera vez en 1964 por el intento de asalto a una sucursal de la empresa Sudamtex y en 1969 pasó a la clandestinidad porque la policía descubrió armas y municiones que la guerrilla le había dado a él en custodia.

Mujica participó en la toma de la ciudad de Pando (en Canelones, a pocos kilómetros de Montevideo, el 8 de octubre de 1969, cuando decenas de guerrilleros mantuvieron el control de la comisaría, el cuartel de bomberos, y otros asaltaban la central telefónica y sucursales de bancos. Fue un operativo que duró media hora, y así de rápida fue la huída con enfrentamiento con la policía, causando la muerte de tres tupamaros, un policía y un civil. Una escena en blanco y negro que hilvana parte de su vida.

En otro momento una patrulla lo baleó seis veces en el suelo. Fue varias veces detenido. En 1971 protagonizó otro momento cinematográfico: la fuga a través de un túnel de 111 presos (106 guerrilleros) de la cárcel de Punta Carretas, una de las mayores fugas carcelarias de la historia.

Tras el golpe de Estado de 1973, Mujica se convirtió en rehén de la dictadura. En el libro Memorias del calabozo, Fernández Huidobro dialogó con Mauricio Rosencof sobre la dolorosa experiencia que vivieron junto a Raúl Sendic, Jorge Manera, Henry Engler, Adolfo Wasem, Jorge Zabalza y Julio Marenales, a quienes tuvieron rotando entre cuarteles. “Una noche de septiembre de 1973 nueve militantes del Movimiento de Liberación Nacional-Tupamaros fuimos sacados, por sorpresa, de cada una de nuestras celdas en el Penal de Libertad... Ese largo viaje de nueve rehenes de la tiranía duró, exactamente, once años, seis meses y siete días”.

Mujica empezó a hablar con las hormigas, entre muchos delirios, y terminó en el Hospital Militar a principios de los '80. Una psiquiatra recomendó que lo dejaran leer y escribir. Sobre ese momento Pepe contó: "Yo agarraba las pastillas que me daba y las tiraba en el baño. Hubo algo, sin embargo, en lo que esa mujer me sirvió. Me consiguió permisos para leer libros de ciencia... me autorizaron también a escribir y el ejercicio de escribir disciplinó mi cerebro", dijo en Pepe Mujica, de tupamaro a presidente.

Su madre Lucy, en una de las tantas visitas que hizo para llevarle libros, vaticinó que la carrera de su hijo recién empezaba. “Va a llegar a presidente gracias a su piquito de oro”, le dijo por entonces a un vecino. Pepe Mujica recuperó la libertad con una amnistía en 1985 y una década después fue electo diputado, luego senador, y en 2005 fue ministro de Ganadería y Agricultura del primer gobierno del Frente Amplio encabezado por Tabaré Vázquez.

En campaña

Su militancia frenteamplista y sus reflexiones sobre Uruguay y América latina siempre buscaron despertar conciencias. Mujica asistió el pasado agosto a un acto político del FA horas después de recibir el alta del hospital donde había sido internado por una descompensación relacionada con su tratamiento contra el cáncer de esófago, diagnosticado en mayo de 2024. "Hoy ha sido un día pesado. Ando remontando mis huesos como puedo, pero tenía que estar", dijo Pepe tras ingresar en silla de ruedas a la sede central la principal fuerza opositora del país que logró regresar al poder en las elecciones del 27 de octubre.

En una reciente entrevista que le hizo The New York Times, el influyente diario estadounidense lo presenta como un "filósofo sin pelos en la lengua". "La vida es hermosa. Con todas sus peripecias, amo la vida. Y la estoy perdiendo porque estoy en el tiempo de irme", dijo Mujica. Preguntado sobre cómo le gustaría ser recordado, fue enfático: "Como lo que soy: un viejo loco que tiene la magia de la palabra".

Una de las obsesiones del veterano político fue el barrio, Sudamérica. “No veo la integración para mañana. Estoy pensando en 25, 30 años. Tenemos que aprender a soportarnos, de izquierda y de derecha”, dijo Mujica a esta cronista en su último viaje a Buenos Aires sobre la anhelada integración regional. Él, que protagonizó junto a Lula, Chávez, Cristina Kirchner, Rafael Correa y Evo Morales un tiempo en el que ese anhelo parecía posible y se mejoraban las condiciones de vida de los sectores más postergados.

domingo, 11 de maio de 2025

El fantasma del fascismo acecha a Europa

Enzo Traverso
Socialismo y Democracia

Hace ochenta años, Europa celebraba la derrota del fascismo tras una lucha titánica. Sin embargo, como señala el historiador Enzo Traverso, el último aniversario del Día de la Victoria llega en un momento en el que la extrema derecha es más fuerte que en cualquier otro momento desde 1945.

Las conmemoraciones son interesantes espejos de las narrativas hegemónicas del pasado, que no siempre se corresponden con la conciencia histórica popular. Esto es especialmente cierto en el caso de aniversarios mundiales como el 8 de mayo de 1945.

Durante décadas, Occidente celebró el Día de la Victoria en Europa (VE) para mostrar su poder y afirmar sus valores. En esta mentalidad, Occidente no solo era poderoso, sino también virtuoso. Esta liturgia de la democracia liberal funcionaba sin problemas y de forma consensuada, con todos los participantes reunidos en torno a recuerdos, símbolos y valores que forjaron su alianza.

En 1985, cuarenta años después del fin del conflicto, la República Federal de Alemania (RFA) se sumó a estas conmemoraciones. En un famoso discurso ante el Bundestag, el presidente de la RFA, Richard von Weizsäcker, afirmó solemnemente que Alemania no debía considerar esta fecha como un día de derrota sino como uno de liberación.

Tras el fin de la Guerra Fría, el Día de la Victoria en Europa significó el triunfo de Occidente: el capitalismo, la fuerza militar, las instituciones sólidas, la prosperidad económica y un estilo de vida agradable. Algunos estudiosos hablaron de una especie de fin de la historia hegeliano, mientras que otros evocaron un final feliz al estilo de Hollywood.

Hitos inestables

Hoy en día, este cómodo ritual parece anacrónico, evocador de una época pasada. Ochenta años después de la caída del Tercer Reich, el fascismo está regresando a Europa. Seis países de la UE —Italia, Finlandia, Eslovaquia, Hungría, Croacia y la República Checa— tienen partidos de extrema derecha en el Gobierno. Partidos similares se convirtieron en actores importantes en toda la Unión Europea, desde Alemania hasta Francia y desde Polonia hasta España.

En este contexto, podría parecer mejor evitar las conmemoraciones internacionales. Al fin y al cabo, J. D. Vance, el omnipresente vicepresidente de los Estados Unidos, los liberadores de 1945, podría celebrar la libertad elogiando a la Alternative für Deutschland o el igualmente omnipresente Elon Musk podría hacerlo haciendo el saludo nazi.

En el lado oriental del continente, Vladimir Putin conmemorará el sacrificio del pueblo soviético en la lucha contra el fascismo —veinte millones de muertos— alabando el heroísmo del ejército ruso que invadió lo que él llama la Ucrania «nazi» hace tres años. Nuestros hitos históricos están en entredicho; la memoria convencional no encaja con el terrible caos de nuestro presente.

A pesar de su carácter oficial, el Día de la Victoria en Europa fue también un hito conmemorativo para la izquierda. Como subrayó Eric Hobsbawm, representó una victoria de la Ilustración contra la barbarie. Una coalición de liberalismo y comunismo, los herederos antagónicos del legado de la Ilustración, había derrotado al Tercer Reich. Esta visión era hegemónica en la cultura de la Resistencia, según la cual el antifascismo luchaba contra los enemigos de la civilización. Aunque cierta en muchos aspectos, esta perspectiva era, sin embargo, demasiado simplista.

Quizás, en lugar de participar en una forma ritualista y cooptada de conmemoración, este aniversario debería inspirarnos a llevar a cabo una reevaluación crítica. El Día de la Victoria en Europa celebra la victoria de una alianza militar en una guerra mundial que tuvo muchas dimensiones, incluido el establecimiento de un nuevo orden mundial en el que esta coalición «ilustrada» no pudo sobrevivir.

En Occidente, Estados Unidos se convirtió en la superpotencia dominante; en el bloque soviético, la guerra de autodefensa de la URSS contra la agresión nazi se convirtió en una ocupación militar y una nueva forma de colonialismo en Europa del Este. Las ideas del liberalismo y el comunismo se habían institucionalizado en forma de imperialismo y estalinismo.

Para la izquierda, el fin de la Segunda Guerra Mundial fue una victoria de los movimientos de resistencia, que otorgó legitimidad democrática a los nuevos regímenes nacidos del colapso del Tercer Reich. En la mayoría de los países de Europa occidental, la democracia no fue impuesta por los vencedores sino conquistada por la resistencia.

Sin embargo, como señaló Claudio Pavone, el concepto de resistencia tenía también varias dimensiones. Al mismo tiempo, abarcaba la totalidad de los movimientos de liberación nacional contra la ocupación alemana, una guerra civil entre las fuerzas antifascistas y muchos regímenes que colaboraron con los ocupantes nazis, y una guerra de clases que buscaba cambiar la sociedad, ya que las élites gobernantes y la mayoría de los componentes del capitalismo europeo habían estado implicados en el fascismo y la colaboración.

Esta guerra de clases ganó en Yugoslavia, que se convirtió en un país socialista, y creó las premisas para una izquierda poderosa en muchos otros países, desde Italia hasta Francia. También reforzó la resistencia contra el franquismo en España y el salazarismo en Portugal.

Ambigüedades de la liberación

Sin embargo, si miramos más allá de las fronteras europeas, el panorama parece mucho más diverso. Como aniversario mundial, el 8 de mayo de 1945 tiene diferentes significados. Mientras que el Día de la Victoria en Europa se celebró y mitificó como símbolo de la liberación en Occidente, no ocurrió lo mismo en otros lugares.

En Europa Central y Oriental, este momento de liberación resultó efímero, ya que el dominio nazi dio paso rápidamente a un bloque de regímenes autoritarios instalados por la URSS. En muchos países, esto significó la rusificación y la opresión nacional.

El Día de la Victoria en Europa tampoco es un hito conmemorativo de la liberación en África y Asia. En Argelia, esa misma fecha es el aniversario de las masacres coloniales de Sétif y Guelma, cuando el ejército francés aplastó violentamente las primeras manifestaciones por la independencia nacional. Fue el comienzo de una ola de violencia imperial que se extendió por toda el África francesa y alcanzó su punto álgido dos años más tarde en Madagascar.

El responsable de este estallido de violencia colonial fue un gobierno de coalición en París formado por partidos de la resistencia, entre los que se encontraban los principales partidos de izquierda, los socialistas y los comunistas. Los recuerdos antifascistas y anticolonialistas no siempre son armoniosos y fraternos. El aniversario del fin de la Segunda Guerra Mundial merece un recuerdo crítico, más que celebraciones apologéticas.

domingo, 27 de abril de 2025

La raíz de la crueldad

Álvaro García Linera
Página 12

¿Por qué la crueldad represiva ejercida contra unos jubilados que demandan derechos no solo es tolerada sino también celebrada por una parte importante de la población? ¿Por qué la masacre de indígenas aymaras durante el golpe de Estado del 2019 en Bolivia es olvidada por los intelectuales criollos y, al contrario, el acceso violento al gobierno es rememorado como un momento épico de la lucha contra la “tiranía” socialista? ¿Por qué la denuncia y persecución de migrantes de piel morena se ha convertido en un deporte estadounidense acreditado por la mitad de sus habitantes, en tanto que, en Europa, la idea de bunkerizar su territorio forma parte de un nuevo sentido común?

¿Qué ha llevado a que estas abominaciones humanas tengan hoy carta de ciudadanía e incluso justificación moral entre las elites empresariales y segmentos de las clases medias de los países del mundo?

La respuesta de que es un resultado de maliciosos algoritmos que refuerzan las emociones bajas de los incautos ciudadanos que acceden a las redes digitales o, que las grandes plataformas tecnológicas han fusionado su ideología a la de la de gobernantes fascistizados, son incompletas pues olvidan que para que estos microclimas tiktokeros sean eficaces tiene que haber previamente una inclinación al odio vengativo de parte de una población que no consume boba y sumisamente lo que ve en la pantalla y que, siempre tiene al alcance, el ejercicio de su libertad electiva de levantar la cabeza por encima del celular y ver una realidad ampliada.

La explicación que señala Slobodian respecto a la propensión de las elites neoliberales a rememorar antiguos “peligros” igualitarios que amenazan la cohesión social y ante los cuales hay que actuar de manera decidida y brutal, no toma en cuenta que lo que importa de las paranoicas invenciones de enemigos artificiales es la connotación social que ellas adquieren, es decir, la adhesión fervorosa que tales enunciados provocan en un momento histórico preciso y no en otro.

Siempre han de existir cenáculos marginales capaces de producir narrativas de orden, desde las mas racionalistas y fundamentadas, hasta las mas disparatadas y falaces. Y por lo general, su irradiación queda restringida a círculos discretos. Pero, solo en determinadas circunstancias, estos relatos se vuelven socialmente verosímiles, dando lugar a movimientos políticos expansivos. Ninguna narrativa tiene fuerza social por su sola construcción gramatical. Su fuerza viene de la capacidad de unificar pulsiones colectivas previamente disponibles. La pregunta es entonces, ¿por qué ahora los discursos antiigualitarios, racistas, misóginos y autoritarios tienen tantos seguidores en el mundo?

En tiempos de estabilidad económica y crecimiento, claramente los discursos de “centro”, esto es, que eluden rupturas o variaciones sustanciales del orden social, logran las mayores adhesiones. No hay incentivos para optar por propuestas que deserten de lo ya establecido o que impugnen el dominante horizonte predictivo imaginado de los individuos y las sociedades.

Pero cuando surgen desajustes al orden regular de los ingresos económicos o de las jerarquías sociales, el sistema político y de creencias legítimas se desorganiza, dando paso al protagonismo de lo que hasta antes eran los “extremos” marginales. Estas crisis, que envejecen rápidamente la cohesión social y sus consensos prevalecientes, pueden ser económicas, al contraerse las remuneraciones de la mayoría de los habitantes de un país; o de estatus y poder de una parte de esa sociedad; o, incluso, de la jerarquía de una sociedad entera respecto a otras sociedades en el mundo.

El caso de EE.UU. es paradigmático. Según J. Francis, en su estudio del Otoño del patriarca blanco, entre 1970 y 2021, los hombres blancos norteamericanos han visto reducir su participación en el ingreso nacional del 70 % 41%. En tanto que las mujeres blancas y los “otros” hombres y mujeres han pasado del 30 % al 59 %. Es posible que los ingresos brutos semanales de la mayoría de los hombres blancos hayan crecido, o incluso estancado, pero en relación a las mujeres, negros y latinos, ha caído a casi la mitad. Claramente hay una mayor igualdad en la distribución étnica y genérica de los ingresos, pero, simultáneamente, una crisis de las viejas jerarquías económicas por genero y “raza”.

Esto ayuda a dar lugar a una crisis de sentido de orden de la sociedad norteamericana y, con ello, a una predisposición a revocar creencias. Que esa batalla por instaurar la nueva narrativa explicativa la estén ganando los que culpan de su destino a la migración latina o al empoderamiento de las mujeres; desplazando a los que reivindican la igualdad y la necesidad de avanzar sobre las groseras fortunas de las oligarquías tecnológicas y financieras, no es algo inevitable. Es un tema de correlación de fuerzas políticas. Pero claro, si lo que se le opone al discurso de una “batalla final” de revanchas redimidoras es solo mantener el viejo orden globalista decrépito y austero, entonces no resulta difícil entender porque gana Trump y los suyos.

En el caso de Bolivia, el ascenso social indígena y el desmantelamiento de las jerarquías raciales en el acceso al poder estatal, tuvieron como reacción una oleada anti igualitaria de las antiguas clases medias. Entre 2006 al 2019, el 30 % de la población, mayoritariamente indígena salió de la pobreza y entro al segmento de ingresos medios. El salario mínimo, de obreros e informales, subió 400 %, en tanto que el salario de las profesiones liberales un 50%. Junto con ello, los mecanismos de acceso a cargos públicos y reconocimientos oficiales, estuvieron regulados por la pertenencia o cercanía a las identidades indígenas. Se trata de hechos prácticos de democratización material. Pero, el pavor moral que esta igualación social desencadenó entre las clases medias criollas fue de tal magnitud que no dudaron en abrazar discursos raciales darwinistas, proclamando, sino el exterminio purificador de los bárbaros indígenas a manos de militares “decentes y católicos”, al menos su animalización y subordinación profiláctica por razones de salud pública.

Como lo ha mostrado Marco Porto para el caso de Brasil, reacciones parecidas se han vivido con lo que él denomina “ansiedad de estatus” de las clases medias ante el ascenso social, en el período de los dos gobiernos de Lula, de sectores negros e indígenas que logran acceden a las universidades (plan de cuotas raciales) y de las empleadas del hogar, con la legislación de sus derechos laborales. De esta manera, espacios de consumo anteriormente reservados para sectores medios que validaban no solo su capacidad de gasto sino, ante todo, de distinción y jerarquía frente a las clases pobres, ahora se veían ‘invadidos” por una sucia plebe que, desfachatadamente, abolía un exclusivo prestigio social considerado como parte “sagrada” de cualquier orden civilizado.

De igual manera en Argentina, cuando uno ve el cuadro recientemente publicado por Agendata respecto a la participación de los asalariados en el Producto Interno Bruto (PIB), se aprecia cómo es que las grandes oleadas autoritarias de odio restaurador de viejas jerarquías sociales y raciales, como el aramburato, vienen precedidas de grandes avances en la igualdad material. En el caso del mileismo, a los años de la democratización económica kirchnerista, debe añadirse la frustración redistributiva, vía inflación, del gobierno progresista que antecedió al triunfo de Milei.

Para Europa, no es pertinente fijarse en el deterioro de las condiciones de vida de amplios sectores populares. La transferencia de valor del sur al norte global (EE.UU., Europa), vía intercambio desigual, deuda pública y cadenas de ensamblaje, ha permitido sustraer, según HIckel-Lemus y Barbour, el equivalente a 16, 9 billones de dólares entre 1995-2021, logrando la estabilidad del “modo de vida imperial” (Brand), y de parte del Estado de bienestar que aun disfrutan sus sociedades.

Sin embargo, la desigualdad se ha incrementado en ese mismo periodo. El 10 % de las personas con ingresos más altos y que en 1980 acaparaba el 27 % de la renta nacional, en 2019 lo hacía con el 36 % (Piketty, 2019). Pero lo que hoy más está conmocionando a esta región es el desequilibrio del estatus social interno y externo. Según el informe Wid World Inequality Database, mientras los sectores con mayores ingresos se alejan de los que tienen ingresos medios, los que tienen ingresos más bajos se acercan a los que tienen ingresos medios, devaluando su estatus.

Y, lo más devastador es el desmoronamiento de la secular manera de ubicarse en el mundo. Como lo muestra Milanovic, (What comes after globalization?) las clases medias “occidentales” han visto retroceder su ubicación en la distribución de la riqueza global. Mientras que en los años 90s, las clases bajas y medias europeas ocupaban los deciles superiores al 70, ahora ocupan el decil 55, superados por las clases medias y altas asiáticas en sistemático ascenso global. Y claro, después de siglos de supremacía europea, la obligación de ahora tener que conversar como iguales con naciones que hasta hace poco eran colonias, les resulta aterrador.

En resumen, la expansión social de las ideologías requiere de un soporte material que las faculte. Las grandes crisis desplazan los viejos sistemas de legitimación política y habilitan las condiciones de posibilidad de nuevas creencias sustitutas. Si son crisis económicas generales, éstas tienden a promover coaliciones socio-políticas igualitarias encabezadas por gobiernos de izquierda o progresistas. Si la crisis la promovió, o no la resolvió el gobierno progresista, le sucederá una coalición de derecha extrema. A su vez, las crisis de estatus, tienden a promover pasiones anti igualitarias que encumbran a gobiernos ultra reaccionarios, autoritarios y cargados de odios viscerales hacia lo plebeyo. En todos los casos, son cambios materiales en las condiciones de vida económicas, de poder o reconocimiento, los que gatillan, en múltiples direcciones políticas, recambios ideológicos y emocionales de las sociedades. Es la cualidad del tiempo liminal.

La lección de los últimos años es que la manera de enfrentar los resentimientos anti igualitarios, no es retrocediendo o paralizándose en las políticas de igualdad material. Eso es lo peor, pues ni favorece a los de abajo, que se sentirán traicionados, ni contenta a los de arriba, que siempre han considerado a los progresistas como unos detestables y temporales advenedizos a un poder político que creen les pertenece por patrimonio familiar.

Y, lo peor, la decepción de los de abajo fácilmente los podrá empujar a abrazar los resentimientos, no contra los poderosos, sino contra los más débiles de las clases menesterosas. En tiempos de crisis, no hay mayor impulso al conservadurismo autoritario que un gobierno progresista que renuncia a la audacia de los cambios. La crisis es, por excelencia, el privilegiado escenario de disputa de las esperanzas colectivas, de los horizontes predictivos. No solo de los recuerdos.

Por ello, la única opción ante los arrebatos contra-igualitarios, es con más igualdad, con nuevas expectativas convincentes de mejores condiciones de vida en común, radicalizando las políticas de distribución de la riqueza. Y que, para ser duraderas en el tiempo, tendrá que afectar a las oligarquías rentistas, además de expandir un nuevo tipo de productivismo sustentable.

terça-feira, 22 de abril de 2025

Francisco, el papa latinoamericano para el mundo

Washington Uranga
Página 12

Murió a los 88 años. Se proyectó como estadista y líder mundial. Nunca perdió su sencillez, predicó a favor de los pobres y descartados, promovió el diálogo y criticó el modelo económico depredador y excluyente. Los cambios que hizo en la Iglesia y lo que dejó pendiente.

Francisco, el papa latinoamericano que “los cardenales fueron a buscar al fin del mundo” como él mismo lo afirmó, entra en la historia de la Iglesia Católica y de la humanidad como aquella persona que, ejerciendo un liderazgo firme, dentro y fuera de las fronteras institucionales, supo entender los desafíos de la sociedad, desde su lugar ensayó las respuestas a su alcance y, sobre todo, tuvo la capacidad de interpelar a propios y extraños con su mensaje profundamente humano.

De esta manera Jorge Bergoglio logró dejar huella en la vida de muchas personas, también en gran parte de quienes no lo reconocieron como su líder espiritual o religioso. En el escenario de un mundo contemporáneo atravesado por los conflictos y las guerras y, al mismo tiempo, carente de voces y de referentes que iluminen los senderos de la fraternidad entre las personas y los pueblos, Francisco marcó presencia.

Como componente esencial de su misión el Papa predicó y puso en práctica lo que él mismo denominó “la cultura del encuentro”. Porque, como lo escribió en su autobiografía recientemente publicada bajo el título Esperanza, “solo quien levanta puentes sabrá avanzar; el que levanta muros acabará apresado por los muros que él mismo ha construido. Ante todo quedará atrapado su corazón”.

Francisco: el hombre común

Se proyectó como estadista y líder mundial, sin perder la sencillez característica de la historia personal de este porteño (“dentro de mi alma me considero un hombre de ciudad”), el mayor de cinco hermanos nacidos todos en el barrio de Floresta en Buenos Aires, y que aún en el Vaticano siguió reconociéndose como “cuervo” por su afición a San Lorenzo. Sin embargo, cuando le anunciaron que en su regreso a la avenida La Plata el nuevo estadio podría llamarse “Papa Francisco” dijo claramente que “la idea no me entusiasma”.

La elección como Papa le cambió la vida a Jorge Bergoglio. Pero una vez convertido en Francisco hizo lo posible por mantener los rasgos de humanidad y de hombre común que hacían que en Buenos Aires, y ya siendo cardenal, siguiera viajando en subte para ir a su despacho en la curia porteña. “Me gusta caminar por la ciudad, en la calle aprendo” decía. Su nueva condición lo obligó a muchas restricciones, pero en lugar de habitar un palacio vaticano eligió vivir en la residencia Santa Marta, una especie de hotel religioso que recibe a obispos y sacerdotes que viajan a Roma por motivos eclesiásticos.

Allí trasladó incluso muchas de sus audiencias, sobre todo cuando se encontraba con la gente más cercana por motivos personales o pastorales. Santa Marta fue su casa. Hasta allí le alcanzaron los zapatos “gomicuer” que pidió a sus amigos que le llevaran desde Buenos Aires tras descartar el calzado rojo que usaba su antecesor Benedicto XVI. También desde allí, o desde cualquier lugar del mundo donde estuviera de visita, cada domingo por la noche Francisco cumplía en llamar por teléfono a Buenos Aires a su hermana María Elena, la única sobreviviente de su familia. Ha dicho que no ver a su hermana es de los desprendimientos que más le costó.

Se reconocía como amante de la música y del tango. “La melancolía ha sido una compañera de vida, aunque de manera no constante (…) ha formado parte de mi alma y es un sentimiento que me ha acompañado y que he aprendido a reconocer”. Desde 1990, a raíz de una promesa religiosa, no volvió a mirar televisión y se mantenía informado por otros medios.

Plan de gobierno

La elección de Bergoglio como papa Francisco, que cambió la vida de la Iglesia Católica, también modificó profundamente la manera de relacionarse del catolicismo con la sociedad, en el mundo y en cada país y región.

Ni siquiera los más cercanos, aquellas y aquellos que conocían sus pensamientos y que habían seguido su trayectoria, habrían podido imaginar aquel 13 de marzo de 2013 el "plan de gobierno" que Jorge Bergoglio tenía en su mente cuando fue ungido como máxima autoridad de la Iglesia Católica. Quizás tampoco había pasado por su cabeza esa posibilidad a pesar de la experiencia acumulada en sus años como superior provincial de los jesuitas en Argentina (1973-1979), en plena dictadura militar, o en su tarea como obispo auxiliar (1992-1998) y luego como arzobispo de Buenos Aires (1998-2013).

No pocos sostienen que la vida de Bergoglio tuvo un vuelco fundamental por su participación en la Conferencia General del Episcopado Latinoamericano (Aparecida, Brasil, 2007) en la que el entonces arzobispo porteño recibió un baño de ”latinoamericaneidad” en su contacto con sus colegas obispos de la región y, en particular, con los de Brasil. Esto es lo que lo llevó a escribir en sus memorias que “mis raíces son también italianas, pero soy argentino y latinoamericano. En el gran cuerpo de la iglesia universal, donde todos los carismas ‘son una maravillosa riqueza de gracia’, esa iglesia continental tiene unas características de vivacidad especiales, unas notas, colores, matices que también constituyen una riqueza y que los documentos de las grandes asambleas de los episcopados latinoamericanos han manifestado”.

Hasta entonces el “porteño” Bergoglio, como buena parte de los argentinos, se había mantenido distante de América Latina. También en términos eclesiásticos por su cercanía a la “teología de la cultura” que aprendió de su maestro Juan Carlos Scanonne y más alejado de los teólogos de liberación como el peruano Gustavo Gutiérrez o el brasileño Leonardo Boff. Con ambos se encontró y se abrazó después una vez que estuvo en el Vaticano. Bergoglio se hizo latinoamericano en Aparecida. Y con ese bagaje llegó al consistorio que lo eligió Papa.

Pocos días antes de su muerte, la teóloga argentina Emilce Cuda, a quien el Papa llevó a Roma como una de sus más estrechas colaboradoras, fue enfática al señalar que la teología de Franscisco ha sido “la teología” a secas, rescatando las raíces del pensamiento cristiano a lo largo de la historia para ponerla a dialogar con los desafíos de la actualidad de la Iglesia y del mundo.


Referente mundial

El tiempo y sobre todo los gestos de Francisco fueron dejando en claro la propuesta y las huellas que el primer papa latinoamericano deseaba establecer como impronta a su gestión. Fue así que su primer viaje político-pastoral lo llevó hasta Lampedusa, para encontrarse con los inmigrantes ilegales expulsados de su territorio que huyen desesperados en busca de la vida. A ellos y al mundo les reafirmó con un gesto de cercanía y solidaridad su prédica en favor de los pobres, los descartados y de sus derechos.

Desde allí, sin abandonar su impronta religiosa, el Papa comenzó a construir su condición de referente mundial más allá de las fronteras de la Iglesia Católica convirtiéndose en interlocutor de jefes de estado, de dirigentes sociales, políticos y culturales. En un mundo con liderazgos en crisis y enfrentando los desafíos de la realidad Francisco eligió el camino del diálogo y del encuentro con los diferentes, desde la realidad de los pobres y reclamando por sus derechos.

Sus ideas quedaron plasmadas en muchos de sus documentos y alocuciones públicas pero sobre todo en las encíclicas Laudato Si (2015), sobre “la casa común”, el cambio climático y el cuidado de los recursos naturales, y Fratelli Tutti (2020) acerca de la amistad y la fraternidad social.

Pero Francisco fue, de muchas maneras, un líder incómodo, para los gobernantes y los poderosos del mundo. En particular por sus llamadas a atender los problemas de sobre explotación de los recursos naturales en desmedro del cuidado de la naturaleza, las críticas de un modelo económico depredador y excluyente y las advertencias sobre el “descarte” que se evidencia en las migraciones masivas, las guerras y la pobreza creciente.

Los pobres y la guerra

En su transitar Francisco se convirtió en vocero de los descartados y los pobres, pero también en aliado de quienes salieron en defensa de los derechos de estas personas y comunidades. Puede decirse que el discurso pronunciado el 9 de julio de 2015 por el Papa ante el auditorio plural de los movimientos sociales reunidos en Cochabamba (Bolivia), cuyo eje fue su proclama de "las tres T" (tierra, techo, trabajo), constituye una suerte de síntesis doctrinal que, en otro tono y con distinto despliegue, Francisco había expresado de manera sistemática y con base teológica en Laudato Sí. Una gran suma que, a contracorriente de las fuerzas del capitalismo mundial, se alzó en favor de los pobres y sus organizaciones, criticó a los poderes hegemónicos y lanzó un llamado a la paz. Una militancia pacifista que Bergoglio apoyó con sus acciones y las del Vaticano en cada lugar de conflicto en cualquier rincón de la tierra. En esta tarea los movimientos sociales fueron elegidos permanentemente como aliados e interlocutores, convocados y sentados a la mesa de las conversaciones con el Papa.

A través de sus acciones Francisco también consolidó su idea de que a las grandes religiones monoteístas del mundo y a sus dirigentes le cabe la responsabilidad de encontrar salidas a la guerra mundial traducida en multitud de conflictos acotados o guerras regionales por disputas territoriales, cuestiones de soberanía, enfrentamientos políticos, étnicos o raciales. “No existe la guerra inteligente; la guerra solo sabe causar miseria; las armas, únicamente muerte” afirmó.

En octubre de 2022 organizó en Roma un gran encuentro de líderes religiosos mundiales por la paz. Pero antes y después se reunió en Irak, con el Gran Ayatolá Sayyid Ali Al-Husayni Al-Sistani, líder de la comunidad chií del país, en Ulaanbaatar con once líderes de diferentes confesiones y, más recientemente, en Indonesia junto al iman Nasaruddin Umar visitó el 'túnel de la Amistad' que conecta la mezquita Istiqlal con la catedral de Nuestra Señora de la Asunción.

En la propia Iglesia

Hacia el interior de la misma Iglesia Católica el papa Francisco impulsó muchas líneas que conectan directamente con iniciativas inauguradas en el Concilio Vaticano II (1962-1965), impulsadas por el papa Juan XXIII (1958-1963 ) y continuadas por Paulo VI (1963-1978), pero que tuvieron frenos y retrocesos con Juan Pablo II (1978-2005) y Benedicto XVI ( 2005-2013).

De esta manera Bergoglio insistió en la idea de “una iglesia de puertas abiertas” con capacidad de acogida para todas y todos, sin ningún tipo de restricciones, en diálogo con la sociedad y enfrentando los problemas comunes. Esto implicó también reformas profundas en las estructuras eclesiásticas, con más espacios para los laicos y en particular para las mujeres, pero también desde una perspectiva eclesiológica que buscó protagonizar el “sacerdocio común de los fieles” incluso antes que el sacerdocio ministerial.

Con esa intención Francisco propició, a través de los sínodos (universal y regionales) una Iglesia más participativa que puso en crisis el modelo estrictamente jerárquico, piramidal y romano céntrico. Ello trajo aparejado también la decisión de enfrentar los problemas de abusos, la pederastia y la corrupción dentro de la estructura eclesiástica.

Bergoglio acompañó este proceso con reformas de la curia vaticana, recambio de los responsables y nuevos nombramientos para rodearse de figuras de su confianza. También hubo cambios mediante la designación de obispos más jóvenes y cercanos a la perspectiva eclesiológica de Francisco.

Nada de esto ocurrió sin resistencias y enfrentamientos. En el mundo, pero también en la Argentina donde paradójicamente los sectores católicos más conservadores, empresarios y representantes del poder que vieron en Francisco la continuidad de un cardenal Bergoglio, que en su momento y sin considerarlo como del propio palo, nunca les resultó incómodo. Rápidamente se sintieron defraudados por las iniciativas y las propuestas del Papa que acentuó los rasgos más latinoamericanistas del entonces cardenal de Buenos Aires y radicalizó su perspectiva en favor de los pobres, de los excluidos y de sus derechos.

El poder se disgustó con Francisco y no lo disimuló. También los sectores conservadores de Iglesia incluidos algunos obispos se sintieron molestos con Bergoglio, aunque estos últimos se mantuvieron dentro de los márgenes de discreción que impone la propia Iglesia.

A nivel mundial también las intrigas y las conspiraciones fueron en aumento. Integrantes del colegio cardenalicio que habían ido a buscar a un papa latinoamericano y seleccionaron a un argentino porque siendo tal era el "más parecido" a los europeos se sintieron frustrados en sus expectativas.

En más de una oportunidad los sectores más conservadores se rasgaron las vestiduras ante lo que consideraron excesivas concesiones de Bergoglio, tanto en sus mensajes como en su estilo pastoral. Francisco no se inquietó demasiado por ello. Siguió tomando decisiones con conciencia de los problemas que enfrentaba e incluso utilizó la energía y el respaldo que le llegaba desde afuera para dar batallas en el seno de la propia Iglesia.

Siempre apareció convencido de la tarea que debía enfrentar: avanzar y profundizar la reforma de la Iglesia hacia una forma de gobierno y de participación más sinodal, más horizontal y plural que renueve la vida del catolicismo.

Si bien se dieron pasos sustanciales en ese sentido, quizás sea esta la tarea inconclusa que deja Francisco y que quedará en manos quien lo suceda en el pontificado. Una designación que dependerá de una elección incierta y sin candidatos a la vista, aun teniendo en cuenta la profunda renovación que Bergoglio hizo en el colegio cardenalicio que escogerá al nuevo papa.

quarta-feira, 16 de abril de 2025

Frantz Fanon, en su centenario

Manuel Desviat
Viento Sur

Se cumplen cien años del nacimiento de Frantz Fanon (1925-1961), autor de culto de la descolonización, cuya obra formó parte de la mochila de los revolucionarios de los años sesenta, como Ernesto Che Guevara, Patrice Lumumba o Nelson Mandela, y contribuyó a forjar la ideología de la resistencia y luchas revolucionarias del Sur Global.

Nacido en Martinica cuando la isla aún era una colonia francesa Fanon reúne una triple condición: ser negro, psiquiatra y militante del Frente de Liberación Nacional (FLN) durante la guerra de independencia de Argelia. Aún adolescente, se adhiere al movimiento cultural y político de la Negritud, que promovieron Aimé Césaire -compatriota que fue su maestro de literatura-, Leopoldo Sédar Senghor y Léon-Gontran Damas.

Césaire, gran poeta, político, comunista, va a influir profundamente en Fanon, en especial en su primer libro Piel negra, máscaras blancas, donde trata de la alienación del negro en la sociedad blanca a través de observaciones clínicas, diagnosticando los síntomas patológicos del racismo en la vida cotidiana. Analiza las relaciones neuróticas donde el concepto de raza se reproduce y se naturaliza. Su análisis desentraña una civilización en la que el sujeto dominado debe plegarse a las máscaras blancas del colonizador, adoptar sus significados (la blanquitud) y renunciar a los propios (la negritud). En este proceso de alienación todos se apresuran a parecerse al blanco, sumidos en una angustia identitaria. Es en la reivindicación de la negritud donde Fanon se diferencia de sus maestros, los ideólogos de la nación negra, porque a su antirracismo antepone la revolución social, la lucha por otra sociedad sin opresores ni oprimidos, donde no cuente el color de la piel, donde se acepte la diferencia.

Fanon estudia medicina en Lyon con una beca por haber combatido con las fuerzas aliadas contra los nazis. Especializado en psiquiatría, irá a trabajar, tras un par de años en Francia con Francesc Tosquelles –psiquiatra catalán exiliado a tras la Guerra Civil, cofundador del POUM y precursor de la psicoterapia institucional– a Argelia como director médico del hospital psiquiátrico de Blida-Joinville, con más de dos mil pacientes en condiciones inhumanas y un escaso personal sanitario.

Fanon llega a Argelia en los prolegómenos de la guerra de independencia, donde su pronta afiliación al FLN le obligará compaginar su labor de terapeuta con la militancia clandestina, utilizando el hospital como refugio y clínica de asistencia a los insurgentes. En su consulta atiende a víctimas y victimarios de la colonización, casos clínicos de sujetos afectados por la guerra, colonos y colonizados, torturadores y torturados. Torturadores que van a su consulta a la salida de las sesiones de tortura, quejándose de diversos malestares que no vinculan con su actividad, digamos, laboral.

Como psiquiatra, Fanon va más allá de lo aprendido en Saint Alban, adelantándose a Franco Basaglia –quien recurriría al ejemplo de Blida en su negación de la institución psiquiátrica-- al plantear que el microcosmos social de la psicoterapia institucional cronifica al internado, que el encierro limita siempre el valor desalienante de la terapia y que el auténtico medio socioterapéutico es la sociedad. Lo que le lleva a procurar el tratamiento fuera del manicomio, promoviendo una terapia que confronte al sujeto con el conflicto que le provocó la crisis, con la toxicidad de la realidad. Esa misma realidad que, militante clandestino, lo obliga a exiliarse a Túnez, donde funda el primer hospital psiquiátrico de día en África y actúa como estratega y teórico de la revolución, portavoz en todo el África negra del Gobierno Provisional de la República de Argelia. Una revolución que Fanon aspira a que se convierta en la vanguardia de la revolución de toda África.

Será su último libro, Los condenados de la tierra (cuyo título nos remite a la primera estrofa de la Internacional), escrito ya enfermo de leucemia –morirá a los 36 años en 1961–, por el que será mundialmente reconocido. En él nos hace ver que la violencia de la barbarie colonial no solo se manifiesta en las masacres genocidas, sino, sobre todo, en la imposición a los pueblos y razas colonizados de una dependencia servil, degradante y que, por eso mismo, porque la carencia y la sumisión se reviste de humillación, la respuesta liberadora, la emancipación, siempre tendrá que ser una insurgencia violenta.

Más de seis décadas nos separan de la muerte de Fanon, la brecha entre la riqueza y la pobreza en el mundo se ha reconfigurado, como lo ha hecho el colonialismo, perdurando en formas de racismo, xenofobia y explotación, salvo en Palestina, donde se mantiene de hecho la ocupación. Una ocupación genocida que el gobierno de Israel defiende como un derecho de salvaguarda de la civilización occidental, partiendo de la asentada creencia de que este derecho prevalece sobre el de otros pueblos a los que se puede arrasar. Mientras que Europa le pide “contención en las masacres” y le mantiene como socio comercial, incluyendo las armas.

Hoy muchos y muchas estaríamos con Fanon cuando reniega de Europa, de una Europa tramposa con sus valores, aquellos que él fue a defender en las trincheras siendo adolescente, y cuya verdadera cara se extiende por el mundo occidental.

Hace dos siglos –escribe en la que quizás fue su última carta, que cierra como conclusión Los Condenados de la Tierra y que nos parece premonitoria– una antigua colonia europea decidió imitar a Europa. Lo logró hasta tal punto que los Estados Unidos de América se han convertido en un monstruo donde las taras, las enfermedades y la inhumanidad de Europa han alcanzado terribles dimensiones.

El caso es que, con las imágenes de Gaza naturalizando la inhumanidad día tras día, las banderas patrias cerrando fronteras y aupando a una extrema derecha claramente fascista, al releer a Fanon cuando dice: “El colonialismo no se comprende sin la posibilidad de torturar, de violar o de matar” (Por la revolución africana), uno no puede dejar de pensar que tampoco se pueden entender las democracias liberales en las que habitamos, y que mantenemos, sin la explotación, la alienación social y la guerra inherentes al capitalismo que las constituye. La habitabilidad social de este planeta solo será posible con la subversión del orden existente y esto requiere una toma de conciencia colectiva.

terça-feira, 15 de abril de 2025

Mario Vargas Llosa, el último intelectual ante las guerras del fin del mundo

Jorge Volpi
Socialismo y Democracia

En el gozne entre dos siglos, el Boom fue la más eficaz arma de combate con que contó América Latina: una portentosa ficción que transformó drásticamente la realidad del continente. Sus cuatro miembros oficiales, Carlos Fuentes, Mario Vargas Llosa, Gabriel García Márquez y Julio Cortázar, provenían de las élites de sus respectivos países y muy pronto hicieron suya la tentación revolucionaria que dominaba el pensamiento de su época.

Desde el principio, no solo buscaban escribir, sino transformar a sus respectivas sociedades mediante la escritura. Antes de establecer la alianza que habría de unirlos, cada uno se enfrentó al conservadurismo de su entorno y en particular a los toscos nacionalismos que imperaban por doquier. Para lograrlo, se valieron de su formación francófila, que lo mismo los llevó al existencialismo que al marxismo, y les permitió asumir esa otra desaforada ficción que situaba al escritor de ficciones como portavoz y vanguardia de su tiempo.

Una vez que Fuentes urdió el artificio, el Boom se convirtió en una eficaz máquina de poder/saber, en el sentido de Foucault: una inagotable fuente de ficciones —algunas literarias, otras políticas—, que buscaba tener efectos sobre el mundo. A la distancia, el éxito de su empeño resulta obvio, pero en su momento se enfrentaron a incontables obstáculos: nada indicaba que cuatro escritores de países periféricos podrían trastocar para siempre la imaginación global.

Ya desde La región más transparente (1958) y La ciudad y los perros (1962), su doble objetivo, criticar el poder a través de la literatura y usar la literatura para llegar al poder, se mostraba con nitidez. No sería, sin embargo, hasta que García Márquez publicara Cien años de soledad (1967), uno de esos raros virus que de pronto contaminan millones de mentes, que el éxito de la misión estuvo por fin a su alcance.


Pocas veces una ficción se convierte, de la noche a la mañana, en un clásico: un caballo de Troya capaz de doblegar a todos sus rivales. Fuentes y Vargas Llosa —Cortázar era un caso aparte— a la vez se aprovecharon de este cisne negro y empezaron a sentirse incómodos ante la desmesura de su influencia. Respondieron con sus novelas más ambiciosas: Terra Nostra (1976) y La guerra del fin del mundo (1981), pero el éxito sin precedentes del realismo mágico, que ninguno de los dos practicaba, al cabo precipitó la ruptura entre García Márquez y Vargas Llosa.

Más allá de las razones ideológicas o personales que puedan explicarla, el peruano necesitaba urdir un camino radicalmente distinto al de su antiguo amigo: su reverso. Mientras Fuentes optaba por una prudente equidistancia, Vargas Llosa mantuvo su fe revolucionaria, solo que la trasladó al polo opuesto, del marxismo militante a un feroz liberalismo que poco a poco se acercó a la derecha más reaccionaria: mientras García Márquez se mantuvo siempre fiel a Castro, Vargas Llosa llamaba a votar por la hija del dictador que le arrebató la presidencia del Perú. Para entonces, el Boom ya había pasado a encarnar ese poder omnímodo que las nuevas generaciones, siguiendo su ejemplo, ahora buscaban asediar o minar.

La muerte de Vargas Llosa cierra irremediablemente el ciclo: hoy los intelectuales públicos se han vuelto prácticamente irrelevantes, sustituidos por efímeros influencers; la literatura ha dejado de hallarse en el centro de la imaginación del planeta, sustituida por el dominio del audiovisual; América Latina vuelve a ser percibida como una región periférica en medio del descontrol geopolítico precipitado por Trump; y la autoridad de los hombres blancos heterosexuales se desvanece día a día.

Su asalto al poder desde el saber llega naturalmente a su fin. Quedan sus ficciones que, desprovistas de la obsesión política de sus autores, serán releídas, reinterpretadas y revaloradas por jóvenes a quienes ya poco interesan sus querellas. El coronel no tiene quien le escriba, Aura o La fiesta del chivo, entre tantas otras, permanecerán como rescoldos de esa inconcebible ficción —el Boom— que, por más de un siglo, convirtió a cuatro ambiciosos escritores en sinónimos de América Latina.

domingo, 13 de abril de 2025

El hombre que amaba a los gatos


Mariana Enriquez
Página12

Antes de la Primera Guerra Mundial existe un breve período de la historia de Inglaterra, de 1901 a 1910, que se llama “época eduardiana”. Cubre el reinado de Eduardo VII. Su fin suele estar marcado simbólicamente por el hundimiento del Titanic: fueron breves años de ostentación –de los ricos-- y auge del ocio y el deporte, los años donde sobre el Imperio no se ponía el Sol, la fiesta antes del derrumbe.

En esa época surgió un ilustrador popular, Louis Wain, que no era exactamente un hombre de su era, aunque la retrató como pocos, y a través de un personaje particular: el gato. Sus felinos ilustrados llegaron a ser tan populares que se les atribuye haber convertido al gato, en el Reino Unido, Estados Unidos y ciertas partes de Europa, en una mascota tan digna de serlo como los perros. Una mascota simpática y con cierto misterio. De los dibujos de Wain a los videos cortos que vemos en redes sociales, con michis haciendo sus gracias, no hay tanta distancia.

El hombre no era un eduardiano frívolo y altivo. Wain nació en 1860, el varón entre cinco hermanas, hijo de una diseñadora textil y un padre desheredado por su familia por convertirse al catolicismo, que murió cuando Louis era adolescente. Louis, destinado a ser el proveedor de la gran familia, era raro desde chico, excéntrico le decían por entonces, una manera de esconder o no comprender la enfermedad mental.

Quiso ser músico, deportista, y dio miles de vueltas hasta que estudió arte en la West London School of Arts. Ahí conoció a William Ingram, dueño de una revista pionera en periodismo ilustrado, cuando aún la fotografía no era lo suficientemente rápida para cubrir la imagen impresa. Louis Wain se unió al staff de la Illustrated London News y, en 1884, se casó con la institutriz de sus hermanas, Emily Richardson, que le llevaba veinte años.

La felicidad conyugal no duró mucho, porque ella se enfermó de cáncer de mama. Para divertirla, porque pronto estuvo postrada, Louis le dibujaba gatos, especialmente sketches de Peter, la mascota de la pareja. Se los mostró a su jefe, que al principio los rechazó porque los gatos no eran populares, pero lo derivó a una editorial donde ilustró un libro infantil. Le fue tan bien que sus gatos fueron aceptados en la revista. Emily, la esposa, murió en 1887.

En la película biográfica La vida electrizante de Louis Wain (2021), con Benedict Cumberbatch y Claire Foy, el matrimonio está romantizado al punto de que, según se narra, todo el éxito y la desdicha de Wain tienen esa marca de origen, ese amor. Pero la realidad y los testimonios son menos tiernos. Amó a su mujer, y seguro la extrañó, pero era muy joven y su vida siguió adelante. No hay testimonios de un dolor fundante. Eso sí: la vida siguió con grandes descalabros.

Wain se hizo muy exitoso, masivo, después de años de retratar a la sociedad con sus gatos pícaros y caóticos, multicolores, en caricaturas de todo tipo: políticas, judiciales, profesores, deportivas, de ocio, de moda, gatos con monóculos y bastones, en fiestas, con vestidos y tocados, al natural. En su momento más productivo, dibujaba unas 600 ilustraciones por año y las publicaba en anuarios de 1901 a 1921.


Era la edad dorada de las postales, así que sus gatos celebraban Navidad, casamientos, amistades, vacaciones, Año Nuevo. Se llegaron a hacer más de mil por año. No se hizo rico, sin embargo. A Louis le costaba manejar su éxito, o no entendía cómo. Le pagaban muy poco por los dibujos y él no se quedaba con el copyright –de hecho sus ilustraciones siguen siendo libres de derechos--. También dibujaba gratis por encargo y las editoriales o pequeñas industrias las usaban para todo: calendarios, libros, packaging, papel de regalo, latas de galletitas, vajillas.

Era el ilustrador más famoso del Imperio, y de Estados Unidos, y no tenía dinero. Lo poco que ingresaba estaba destinado a sus hermanas. Ingram, que lo explotaba y lo ayudaba, le alquiló una casa para toda la familia. Ahí, en relativa comodidad, empezó a expresar sus ideas raras, especialmente respecto de los gatos, aunque no solamente. Decía que los gatos tenían una tendencia a viajar al Norte por una reacción eléctrica de su pelaje.

Se interesó en el espiritismo. Quería tener una granja de gatos pero no encontraba cómo. Ingresó a la Sociedad Protectora de Gatos, a la sociedad Anti-Vivisección y fue presidente Club Nacional de Gatos, pero todo esto era ad honorem y le quitaba tiempo de un trabajo, ¡que tampoco cobraba! Angustiado, se fue a Estados Unidos a ilustrar para William Randolph Hearst: nadie quería sus ilustraciones porque había saturado el mercado al regalarlas y malvenderlas.

Volvió a Inglaterra con la idea de hacer esculturas de gatos. Se conservan casi todas, gatos de cerámica futuristas notables, muy peculiares, que delatan su singular talento. Por supuesto, no se hizo rico con las cerámicas. Él hablaba de participar en exhibiciones que no existían. Sostenía que en su casa se reunían grupos de espíritus que proyectaban corrientes eléctricas perturbadoras. Como creía también que sus hermanas le robaban, se encerró en su habitación a escribir sobre espiritismo y electricidad. Cuando las hermanas quisieron sacarlo de ahí se puso violento, así que se vieron obligadas a internarlo. El diagnóstico fue que estaba loco: hoy diríamos que tenía esquizofrenia.

Era 1924. Entreguerras. Hacía diez años que Wain no producía. Extrañamente, el hombre de los gatos que había sido tan famoso no fue olvidado del todo, pero si quedó bajo radar. Lo internaron en el Hospital Springfield, una institución para desposeídos, y pasó un año entero solo ahí. Nadie se preguntaba por él y sus jefes, los editores, los que usaban sus dibujos, ni lo ayudaban ni se interesaban por su salud. En 1925 Dan Rider, un librero, lo encontró en el Hospital porque, de visita, vio sus dibujos. Logró que lo trasladaran a un mejor lugar, el Napsbury Hospital, en el campo. H.G. Wells, el autor de La máquina del tiempo, fue uno de los que juntó dinero desde un programa de radio para su mantenimiento internado en Napsbury, y el cuidado de sus hermanas. “Louis Wain inventó un estilo de gato, una sociedad de gatos, un mundo de gatos”, dijo. 

Wain siguió dibujando en el nuevo hospital y su producción fue muy, muy distinta. Los gatos son multicolores, psicodélicos antes de la psicodelia, abstractos, luminosos, llenos de esa electricidad que él les atribuía. Los hacía en estilo turco, en estilo griego, con mosaicos, con flores en los ojos. En el hospital Wain no hablaba mucho, pero participaba de la vida común pintando gatos para ocasiones especiales, sobre todo para Navidad, cuando cubría las paredes con los animalitos. Era tan productivo como antes, y quizá mejor artista, una vez que no tenía la obligación de representar nada más que sus fantasías.

Murió en 1939 de complicaciones de una falla renal: había estallado la guerra, y otra vez se lo olvidó. Pero no para siempre. En los ‘60, sus curiosos gatos psicodélicos llamaron la atención, por puro espíritu de época, y se publicó una biografía ilustrada. Ahí los dibujos aparecían con sus locos títulos originales: “Una impresión momentánea atrapada a la velocidad de la luz” o “Cuando más los querés quietos, más se mueven”.

Su redescubrimiento sigue hasta hoy, con montones de libros, una película, y artistas como Nick Cave como fan y coleccionista. Louis Wain, que era alto, delgado y guapo a su manera, murió a los 80 después de quince años en el neuropsiquiátrico y está enterrado en el hermoso cementerio de Kensal Green, en Londres. Su lápida está torcida, no tiene ningún homenaje ni flores, y no hay peregrinos que le dejen gatos de cerámica.