segunda-feira, 7 de julho de 2008

Sônia Fleury: "É preciso colocar limites na lógica que privilegia apenas a acumulação capitalista"



Presidente do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), desde janeiro de 2006, e professora da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (EBAPE/FGV), entre muitas outras coisas, Sônia Maria Fleury Teixeira conversou com o Informe ENSP sobre o seminário 'Saúde e democracia: participação política e institucionalidade democrática', realizado pelo Cebes nos dias 26 e 27 de junho.

Na entrevista concedida, a militante do movimento de Reforma Sanitária, que deu origem ao SUS, aborda os principais pontos discutidos no evento e mostra a importância de se resgatar alguns dos ideais que orientaram a criação do sistema.

P: Por que a escolha do tema 'Saúde e democracia: participação política e institucionalidade democrática'?

Sônia Maria Fleury Teixeira: A história do Cebes está ligada a esse tema da Saúde e Democracia. Estamos celebrando, este ano, 30 anos de lançamento do documento 'A questão Democrática na Saúde', no qual foram definidos os princípios do SUS e a própria divisão da institucionalidade do SUS. Estamos retomando esse documento e perguntando: qual é a questão democrática na saúde hoje? Será que, depois de todo esse tempo, nós podemos dizer que os novos formatos de participação, criados por nós, realmente democratizaram o poder, ou será que eles só legitimam o poder? São questões desse tipo que queremos discutir.

P: A participação e o controle social estão entre as maiores inovações do projeto da Reforma Sanitária. O setor da Saúde apresenta hoje a estrutura de participação e controle social mais sólidos dentre todas as áreas de política social no Brasil, tendo sido modelo para diversas dessas áreas. Como você avalia essa questão?

Sônia Fleury: Achamos que a participação é um enorme avanço. Ela, no entanto, precisa ser repensada e recalibrada a cada momento. Temos que pensar se o Conselho, hoje, está discutindo as grandes estratégias políticas para o país e, dentre elas, a questão da saúde, ou se está discutindo as normas que o Ministério passa. Precisamos saber se nós, com esse mecanismo de controle, estamos conseguindo controlar a corrupção na área de saúde ou não. Se nós conseguimos controlar a discriminação e o mau uso dos serviços públicos pelos funcionários, esse controle deve ser radicalizado.

P: Na sua visão, as conferências de saúde têm cumprido seu objetivo?

Sônia Fleury: A Conferência é um grande exemplo democrático, mas deve ser também repensada para que siga o princípio de um espaço de diálogo e de formação de um consenso. O que não podemos admitir é que os mecanismos de democratização criados por nós se tornem apenas mecanismos de veto. Não dá para cada um chegar lá com a sua posição já tomada, apenas para vetar a posição do outro. É importante todos terem consciência que aquele é um espaço de diálogo e de comunicação. É essa a democracia que nós queremos.

P: Como aprofundar a participação em saúde e vinculá-la aos problemas da cidadania democrática?

Sônia Fleury: Temos que ampliar a agenda da saúde, começar a pensar a reforma tributária, a reforma política, a reforma fiscal. Nós fizemos um pacto social na Constituição para ter o direito à Saúde, mas não há um pacto fiscal que pague esse direito. Nós precisamos aprofundar essa democracia, os mecanismos de participação e ampliar a nossa agenda democrática, botando limites na lógica que privilegia apenas a acumulação capitalista. Acho que o social é prioritário, assim como o ambiental, para por limite a essa lógica e subordinar a acumulação e a economia aos princípios do direito social.

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